Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

segunda-feira, janeiro 16, 2006

O Mito do Eterno Retorno pela mulher de 33


Neste fim de semana, eu fui novamente vítima do eterno retorno. Não sou coisa alguma pra falar de filosofia, mas o Eterno Retorno é uma teoria fantasmagórica descrita por Nietzsche em "Assim falou Zarathustra", pela qual tudo se repete da mesma forma tal qual um dia a eperimentamos, e que a própria repetição repete-se ad nauseum, o que faz muita gente boa - eu, por exemplo - pensar "QUE MERDA ESTOU FAZENDO AQUI ENTÃO, PÔ?!. O Eterno Retorno, mesmo assim, de raspão, é uma coisa angustiante. Segundo o próprio Nietzsche, é o mais pesado dos fardos. Tão pesado, que Milan Kundera brincou de peso e leveza com isso, mas isto já é assunto pra outro post.

Pois o Sol se põe todos os dias. E raia todos os dias. Pessoas nascem todos os dias. E morrem todos os dias. Bolhas de vapor surgem na superfície da água fervente da chaleira e somem, sendo logo substituídas por outras - e no geral, ninguém repara a diferença. Com as pessoas seria assim: você chega na recepção de uma firma e vê que a mocinha do atendimento não é mais aquelazinha loura, o que houve com ela?, morreu, ah bem, o Dr. Fulano se encontra? E a vida segue igualzinha, a despeito da morte da mocinha do tailler marinho e maquiagem azulmente cafona ora utilizados pela morena que lhe tomou o lugar.

Só o amor nos tornaria únicos. Mas como, se - não obstante a etnia, classe social ou econômica - somos todos iguais no jeito de amar? Todos temos medo da entrega, da queda, da falta, do excesso, da perda do passado, da perda da promessa... medo, medo, medo, desamparo e medo. Os medos são tão parecidos que me fazem odiar Nietzsche por pensar que ele talvez possa ter acertado quando disse que tudo na vida se repete. Que graça há nisso?

Pois seguindo essa premissa hedionda, eis que eu, pela enésima vez na vida, conheci O Cara. É, o Cara. Sem entrar em minuciosos detalhes, ele tinha tudo que eu acho importante num par perfeito. E o mais importante, por mais que eu nunca tenha listado ou definido bem o que é importante num par, é que ele me fazia rir, cantar, suar e suspirar.

Contudo, quando a esmola é gorda demais, o santo desconfia. Investiga daqui, observa pupila dilatando dali (é incrível como elas dilatam quando a gente mente!), surge a revelação de que O Cara tinha namorada. Pior: uma ex-namorada, o que é ainda mais difícil de contornar que a viuvez: a ex-namorada sempre dá um jeito de ressurgir das cinzas, como um Phoenix indolente. E não deu outra. Eterno retorno. É a nona vez que isso me acontece. Se eu não fosse uma pessoa realmente cabeça dura, obstinada e otimista, eu já teria feito uma histerectomia e uma pulsectomia (com o perdão do neologismo médico) pra tentar controlar minha histeria pós-traumática. Gente: nove vezes! Talvez eu deva tatuar na testa: "SE VOCÊ TEM UMA EX-NAMORADA MAL RESOLVIDA, MANTENHA DISTÂNCIA!" Eu sou uma pessoa super temente a Deus e à lei dos homens, mas juro que o décimo caso vai ser crime passional. O Eterno Retorno ainda vai me levar à primeira página, algemada e com cara de "fiz e faria de novo".

Tudo bem que eu tenho ficado cada vez menos histérica quando isso (de o Cara voltar pra ex-namorada) acontece. "Não era pra ser.", diz a moça da peça "Os homens são de Marte e é pra lá que eu vou". Esse mantra me consola. Eu até choro, mas choro bem pouco. Pelo menos na frente do cara. É no carro, indo embora rumo ao desconhecido, ouvindo o Moska cantar o hino do Eterno Retorno ("Tudo novo de novo"), que eu desabo, tenho febre, perco a voz e a vontade de comer. 24 horas de sofrimento intenso terminal. Até que no dia seguinte tudo volta ao normal: ufa, o eterno retorno! Me arranco da cama pra ir ao barzinho do Arpoador às 16h, onde ameaço um garçom pra ele conseguir uma mesa grande no calçadão pros meus amigos, e fico ali, cercada deles, como se fosse eu uma ilha de felicidade, até o sol se pôr atrás dos Dois Irmãos.

Por tudo de bom que se repete; por tudo de bom que não volta jamais; por tudo de ruim que se repete e me faz valorizar os eventos bons que infelizmente se provam únicos: obrigada, Eterno Retorno. Estou começando a te entender: é importante praticar, né? Tô começando a sacar esse puto do Nietzsche.