Parábola Natalina do Desapego
Papai Noel, Rita (minha chefe nota mil, que Deus é pai, não é padrasto), Joaquim e Laura, num momento explícito de desapego natalino.A Rita, que ao contrário da música, devolveu meu sorriso (e meu amor pelo trabalho), me contou uma história sensacional de sua filha Loló, de dois anos. Aproveitando o ensejo do Natal, há uns dois meses ela vinha negociando com sua filha a troca da chupeta, a droga mais pesada dos pequeninos, por um presente do Papai Noel. Houve todo um processo, muito papo cabeça e muita argumentação neoliberal. Afinal, Papai Noel tem mais o que fazer do que sair por aí de trenó e gola de pele, nesse calor infernal, dando presentes para crianças desconhecidas sem receber em troca algo bem mais valioso. E olha que há muitas crianças no mundo dispostas a abrir mão da própria chupeta pra não ficar chupando o dedo no Natal!
E assim, comendo pelas beiradas e dobrando a ferinha no gogó, mamãe Rita finalmente sentou com sua filha para escrever uma carta seriíssima pra esse tal de Papai Noel, nos seguintes termos:
"Querido Papai Noel,
Eu sou a Laura, tenho dois anos, sou filha da Rita e do Joaquim, moro no lugar tal e estudo no lugar xis. Se eu tivesse CPF, IPTU, Renavam e ID, seria mais fácil pro senhor me localizar, mas conto com sua astúcia e a de seus subalternos pra não ser confundida com uma Laura de dois anos qualquer. Até porque eu tenho uma proposta irrecusável pra te fazer: em troca de uma reles caixa de bombons, prometo que lhe darei minhas chupetas, que são deliciosas, não deformam, têm formato anatômico e sem as quais eu não durmo. É pegar ou largar, bom velhinho. Pense bem. Terei aula de natação no dia tal, no lugar xis. Se o senhor por acaso aparecer por lá, leve uma caixa de bombons. Eu levarei minhas chupetas.
Beijo grande,
Laura"
Pois não é que no dia tal, no lugar xis, o tal do Papai Noel apareceu, de fato, na Natação da Loló?! Por sorte, ele tinha tido tempo de ler a carta da menina e levou, conforme combinado, uma caixa da Kopenhagen cheia de bombons. E a mãe da menina, claro, não esqueceu de levar todas as chupetas embrulhadas pra presente. Foi um bom negócio para ambas as partes. Feita a troca, tiradas as fotos do momento histórico, sairam -- menina e Papai Noel --, felizes da vida com seus presentes trocados.
À noite caiu e a pequena Laura, subitamente, começou a soluçar e chorar baixinho, com a pança cheia de bombom. "O que foi, filha?", perguntou a mamãe, já sabendo da resposta. "Eu... que...ro... a mi...nha... pe(soluço sofrido)...peta".
Quando a Rita chegou nesse ponto da história, eu me levantei da cadeira, coloquei as mãozinhas na cintura, me fazendo de capitalista selvagem, e perguntei: "Ué, depois de comer todo o bombom, ela ainda queria ter de volta as chupetas?!? Fala sério!". E a Rita, que me conhece há pouco tempo, mas bem o bastante pra saber que desapego é minha meta espiritual, mas não exatamente meu forte, mandou à queima-roupa: "Olha quem fala!". E fez-se um silêncio sepulcral enquanto eu sorvia a moral da história: não há desapego sem dor, mas chega sempre o momento de se encarar esse monstro de frente e derrotá-lo com garra e algumas lágrimas.
Este ano, acho que vou escrever pro Bom Velhote propondo que ele me dê uns abadás pro carnaval em Salvador em troca de uns vícios inúteis que tenho. É pegar ou largar! Só espero que o correio na Bahia seja rápido o bastante pra carta chegar ao destinatário antes de domingo.
Na semana que vem, quero marcar um bota-fora com a galera. Aceito sugestões de locais, datas e horários e, com isso, farei aqui uma enquete. Afinal, este blog nada sério é um quartinho de bagunça, mas extremamente democrático.
"Beijo gande",
VanOr




<< Home