Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

domingo, setembro 12, 2010

Estranha no ninho

Tinha tanto tempo que eu não entrava no blogger pra postar que cheguei a esquecer de alguns detalhes fundamentais ao exercício pleno da blogotarefa, como a senha de acesso. Sorte que eu anoto tudo em um caderninho que me salva a vida quando os becapes não bastam. Cheguei a cogitar minha entrada definitiva no mundo digital e ter todas as minhas senhas compiladas num arquivo criptografado espalhado pelos 4 cantos do mundo, mas nada substitui a emoção de esquecer a senha de vez em quando. E agora que eu tenho um cachorro que come tudo, até caderninhos de senha, esta emoção é ainda mais tocante.

Mas não foi só a senha que eu perdi:  perdi também a espontaneidade. Antes eu entrava aqui, escrevia e saía rapidinho, assim como quem vai à casa de banho, faz seu número um e dois, limpa as coisas, lava as mãos e sai de alma leve. Escrever não é mais tão fácil quanto já foi um dia, e prova disso foi minha incapacidade de concluir um reles parecer técnico sobre a inequívoca contraindicação de uma determinada vacina veterinária - cujo nome não posso citar sob a pena ter minha cabeça decepada por Forças Censoras do Mal - para uso em felinos. Era pra ser um texto simples, inteligível pelo mais débil mental dos veterinários ou burocratas (ou ambos, ou todas as anteriores, o que é muito comum quando se trata de aprovar o improvável), mas não saiu. Muito embora os textos simples sejam justamente os mais difíceis de redigir, prefiro dizer - em minha defesa-  que não consegui escrever o tal parecer técnico porque me pesaram sobre as mãos, a ponto d'eu ver minhas falanges esmigalhadas sobre o teclado, os três grossos volumes de Oncologia de Pequenos Animais que eu usei como referência bibliográfica inicial para começar a redigir tal documento. Também poderia dizer que fui assolada pelo peso das centenas de cadáveres que esse bioterápico promete produzir nos meses vindouros, mas a verdade é que eu simplesmente perdi a verve, a intimidade com a palavra, a capacidade de produzir aforismos, a simplicidade para traduzir o que está na cara.

Sorte que eu ainda posso ser veterinária, redigir receitas, prescrever antipulgas e vermífugos, e, nas horas vagas, me deleitar com histórias de pessoas que gostam de animais, fingem que gostam de animais ou nem se dão ao trabalho de disfarçar o nojo que sentem de animais.

Eu tenho uma confissão a fazer: tenho nojo de quem não gosta de bicho. Antes eu até tolerava essa gentalha, assim como eu sempre fui capaz de passar ao lado de um balonê ou duma saruel e me controlar para não rasgar a peça com minhas unhas de animal primitivo; mas agora, que eu tenho o prazer diário de levar meu cão às ruas, preciso ter um nausedron sempre à mão para não vomitar em cima das pessoas incapazes de retribuir o sorriso do meu Bichon da Patagônia de pelo semi-arame. Se eu sinto isso por pessoas que podem simplesmente estar distraídas, imaginem o que eu não sinto por veterinários que banalizam a morte dos animais que eles teoricamente deveriam proteger.

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Quanto às Forças Censoras do Mal, espero que um dia elas passem por este quartinho e deixem um comentário assinado e com e-mail. Eu gosto de conhecer meus inimigos, de saber onde eles moram e onde eles comem, just in case.