Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

segunda-feira, julho 10, 2006

A primípara - capítulo 1

Encontrou a vizinha grávida no elevador. Ficou impressionada com o tamanho da barriga - parição marcada pra semana -, mas ficou ainda mais impressionada com a constatação de que todo mundo estava tendo filhos, menos ela. A vizinha, 10 anos mais nova, prestes a ser mãe; ela, namorando há 4 anos, nunca nem passou pelo susto da menstruação atrasada ou qualquer outro indício precoce de gravidez. Das duas uma: ou seu método anticoncepcional era infalível, ou ela era estéril. O namorado não, que ele já tinha engravidado um sem número de mulheres - e pago o aborto de todas. Quando chegou no ponto o ônibus que a levaria ao trabalho, mudou de planos e pegou um táxi pro seu ginecologista. Ligou no caminho dizendo que era questão de vida ou morte. Sentada diante do médico, perguntou: Me diz a verdade, eu sou estéril? Ele jurou que não, mostrou no computador todos os exames que ela tinha feito nos últimos anos, mas ela queria que ele a olhasse no olho, e não praquela tela fria, e lhe dissesse a verdade: Você põe sua mão no fogo por minha fertilidade? Saiu do consultório com uma requisição pra mais de 30 exames e ligou pro trabalho dizendo que precisaria se ausentar por uns dias, durantes os quais fez todas as ultras, tomos, bioquímicas e sorologias que a medicina moderna conhece. Estava convencida de que era infértil, seca por dentro, oca, embora nunca tivesse tentando engravidar na vida.

Na semana seguinte, com todos os resultados em mãos - resultados esses que ela não teve coragem de espiar antes do médico porque não queria, ela, tomar ciência de notícia ruim sem apoio profissional -, voltou ao seu ginecologista. "Você é perfeitamente normal e saudável. Nada a impedirá de ser mãe se você quiser isso um dia."

E naquele dia mesmo ela decidiu tirar o DIU. Se o namorado lhe propusesse aborto, ela o mataria com as próprias mãos. Não deixaria ninguém, nem mesmo o genitor, ameaçar a vida de seu filho.