Módis operandis
Você sabe que está ficando velho quando ouve adolescentes falando animadamente no elevador sobre coisas que você jamais conseguiria falar em público, exceto em casos extremos de embriaguez. Na minha época, isso era chamado de tabu. Hoje em dia, vai lá no Houaiss pra ver: o verbete nem existe mais.
Eu sei que não é de hoje, mas quer ver um assunto que era nojento antigamente e hoje parece ser normal? Prisão de ventre. Ou seja: cocô encravado. Basta ligar a TV no comercial entre os blocos do jornal da manhã -- geralmente quando a gente está tomando café da manhã -- para ouvir depoimentos emocionantes de mulheres que ficaram mais leves, magras e bonitas depois que um determinado iogurte milagroso as ajudou a evacuar. Sinceramente, eu teria vergonha de falar disso na TV, mesmo se fosse atriz e bem paga por essa ingrata tarefa, e olha que eu sou descarada!
Mas o que me fez corar recentemente foi o assunto "menstruação" no elevador. Duas meninas do meu prédio, que até ontem limpavam meleca na manga do uniforme da escola, discutiam animadamente sobre suas regras e seus absorventes preferidos. Eu moro no décimo segundo, e no meu condomínio é necessário pegar dois elevadores até chegar à rua, de forma que eu acompanhei o papo por cerca de cinco minutos.
- Ah, aquele verde que eu peguei na sua bolsa outro dia é um lixo! Dá a sensação de que a gente botou um ovo.
- Verde, na minha bolsa?!? Ai, viajou!... Eu só uso o nãnãnã, que é rosinha, e às vezes, no desespero, eu uso o tãtãtã, que também é rosa, só que mais fino e longo. E mesmo assim eu o-d-e-i-o esse longo, porque às vezes dobra nas pontas e gruda nos pentelhos.
Pentelhos, eu pensei. Puxa vida. Eu teria vergonha de falar dos meus pentelhos no elevador. Devo estar muito velha.
- Sua louca, era verde, sim! E eu te provo: naquele dia que a gente foi ver (um filme tipo Velozes e Furiosos XII), a gente passou na farmácia e só tinha esse, e você comprou porque era o único slim com abas. Era esse ou tatatax, e você disse na hora que tatatax não usa porque sempre fica saindo na portinha.
Ó, céus, pensei. O tatatax ficou mal parado no meio do caminho, isso é horrível.
- Aaaaaaaiiiiii, lembrei! Ih, é. Esse verde aí deve ter apodrecido na minha bolsa, porque eu o-d-e-i-o. Parece de plástico, deixa a gente suada, assada e fedida. Um lixo.
Não sei explicar bem o porquê, mas dei um passinho em direção à porta do elevador de tão nervosa que eu estava por estar presa num elevador com duas adolescentes ansiosas por falar sobre coisas que, na minha época, eu só tratava por metáforas e eufemismos (como: "Vê se aconteceu um desastre ecológico?", quando eu pedia pra uma de minhas amigas olhar -- discretamente -- pra minha bunda para ver se eu tinha um borrão de menstruação entre as coxas ou se era só suor.) Aguardei, como quem espera tomar uma pedrada, a retomada do assunto "dificuldade de aplicação de absorventes internos", porque isto sim me tornaria 50 anos mais velha do que realmente sou, mas elas divagaram para dois outros assuntos que eu também jamais discutiria no elevador: menarca -- um verbete que, inexplicavelmente, ainda está no Houaiss -- e, obviamente, sexo.
- Nesse assunto, eu posso te dizer, sou mais experiente: fiquei menstruada pela primeira vez quatro meses e oito dias antes de você!
- Ai, sua ridícula, e nem assim você sabe enfiar um tampax direito no lugar.
- Mas eu sou virgem, minha filha, e você já d...
Silêncio do outro lado. As duas olharam discretamente pra mim, mas eu estava tão velha, mas tão velha, que tinha praticamente encolhido ao ápice de minha obsolescência. A não virgem, que eu juro que não identifiquei visualmente pra não fazer julgamentos morais típicos de gente velha, aproveitando que estava sozinha com sua amiga no elevador, arrematou:
- E você não sabe o que está perdendo, mané, porque sexo é bom demais!
A porta abriu e, quando eu saí, lívida, uma supresa: tinha acabado de desembarcar no século XXI, mas com roupinha de XX. Eu devia me enxergar.
Eu sei que não é de hoje, mas quer ver um assunto que era nojento antigamente e hoje parece ser normal? Prisão de ventre. Ou seja: cocô encravado. Basta ligar a TV no comercial entre os blocos do jornal da manhã -- geralmente quando a gente está tomando café da manhã -- para ouvir depoimentos emocionantes de mulheres que ficaram mais leves, magras e bonitas depois que um determinado iogurte milagroso as ajudou a evacuar. Sinceramente, eu teria vergonha de falar disso na TV, mesmo se fosse atriz e bem paga por essa ingrata tarefa, e olha que eu sou descarada!
Mas o que me fez corar recentemente foi o assunto "menstruação" no elevador. Duas meninas do meu prédio, que até ontem limpavam meleca na manga do uniforme da escola, discutiam animadamente sobre suas regras e seus absorventes preferidos. Eu moro no décimo segundo, e no meu condomínio é necessário pegar dois elevadores até chegar à rua, de forma que eu acompanhei o papo por cerca de cinco minutos.
- Ah, aquele verde que eu peguei na sua bolsa outro dia é um lixo! Dá a sensação de que a gente botou um ovo.
- Verde, na minha bolsa?!? Ai, viajou!... Eu só uso o nãnãnã, que é rosinha, e às vezes, no desespero, eu uso o tãtãtã, que também é rosa, só que mais fino e longo. E mesmo assim eu o-d-e-i-o esse longo, porque às vezes dobra nas pontas e gruda nos pentelhos.
Pentelhos, eu pensei. Puxa vida. Eu teria vergonha de falar dos meus pentelhos no elevador. Devo estar muito velha.
- Sua louca, era verde, sim! E eu te provo: naquele dia que a gente foi ver (um filme tipo Velozes e Furiosos XII), a gente passou na farmácia e só tinha esse, e você comprou porque era o único slim com abas. Era esse ou tatatax, e você disse na hora que tatatax não usa porque sempre fica saindo na portinha.
Ó, céus, pensei. O tatatax ficou mal parado no meio do caminho, isso é horrível.
- Aaaaaaaiiiiii, lembrei! Ih, é. Esse verde aí deve ter apodrecido na minha bolsa, porque eu o-d-e-i-o. Parece de plástico, deixa a gente suada, assada e fedida. Um lixo.
Não sei explicar bem o porquê, mas dei um passinho em direção à porta do elevador de tão nervosa que eu estava por estar presa num elevador com duas adolescentes ansiosas por falar sobre coisas que, na minha época, eu só tratava por metáforas e eufemismos (como: "Vê se aconteceu um desastre ecológico?", quando eu pedia pra uma de minhas amigas olhar -- discretamente -- pra minha bunda para ver se eu tinha um borrão de menstruação entre as coxas ou se era só suor.) Aguardei, como quem espera tomar uma pedrada, a retomada do assunto "dificuldade de aplicação de absorventes internos", porque isto sim me tornaria 50 anos mais velha do que realmente sou, mas elas divagaram para dois outros assuntos que eu também jamais discutiria no elevador: menarca -- um verbete que, inexplicavelmente, ainda está no Houaiss -- e, obviamente, sexo.
- Nesse assunto, eu posso te dizer, sou mais experiente: fiquei menstruada pela primeira vez quatro meses e oito dias antes de você!
- Ai, sua ridícula, e nem assim você sabe enfiar um tampax direito no lugar.
- Mas eu sou virgem, minha filha, e você já d...
Silêncio do outro lado. As duas olharam discretamente pra mim, mas eu estava tão velha, mas tão velha, que tinha praticamente encolhido ao ápice de minha obsolescência. A não virgem, que eu juro que não identifiquei visualmente pra não fazer julgamentos morais típicos de gente velha, aproveitando que estava sozinha com sua amiga no elevador, arrematou:
- E você não sabe o que está perdendo, mané, porque sexo é bom demais!
A porta abriu e, quando eu saí, lívida, uma supresa: tinha acabado de desembarcar no século XXI, mas com roupinha de XX. Eu devia me enxergar.
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UPDATE IMPORTANTÃO: O Tom esclareceu o mistério do tabu, graças ao pai sagrado! O verbete ainda existe no Houaiss, mas está encravado, o que me leva a outro tópico relevante: para facilitar a vida da geral que não domina o português, coloquei um link aqui, na coluna da direita, para a tradução automática deste blog pro inglês. Tive o carinho de apelidar a página de VanOr for dummies, minha modesta homenagem anglo-protestante à língua de Shakespeare que eu tanto prezo, e o Google nheca. Desde que fiz essa caridade, tenho me divertido horrores lendo as traduções malucas daquele que tudo sabe e tudo vê, mas que, como tradutor, daria um ótimo poodle de madame. Tomem por exemplo esta pérola, que mataria Henry Miller de inveja: "I know that is not today, but want to see something that was nojento past and today seems to be normal? Prison for belly. In other words: cocô stuck." Lindo de viver!
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