Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

quarta-feira, janeiro 12, 2011

Há algo de podre no Reino da Dinamarca

Meu dia não começou nada bem: verificando minhas mensagens pela manhã, descobri que minha conta do Facebook (cujo filme vi e o livro estou lendo - duas linhas por dia, mas acho que até 2016 eu termino) teve a senha trocada. O pior de tudo: não foi trocada por mim! Fiquei tão p*ta da vida que recuperei a maldita (o FB tem seus recursos) e aí, só de ódio, eliminei definitivamente minha conta FB, tal qual fiz com aquela besteira do iogurte (duas vezes!). Os meus amigos de verdade - TODOS ELES - sabem meu e-mail e meu telefone, muito embora eu troque de número a cada 18 meses (só para manter contato com as pessoas que interessam de fato). Na verdade, ninguém precisa de rede social pra manter contato com suas pessoas queridas. A dura realidade - e aí eu peço perdão de antemão pelo duplo sentido - é que rede social de cu é rola. E tenho dito! Só me manterei no twitter por causa da lei seca, e pronto. 

Um dia, quem sabe, quando e se eu tiver filhos e quiser mostrar pros meus amigos como os putinhos são e estão cada vez mais bonitos, espertos e inteligentes, juro que criarei uma nova conta numa rede social qualquer sob um codinome indecifrável para compartilhar fotos e vídeos acima de 10 MB só com as minhas 20 pessoas favoritas na vida. Ou 19, já contabilizando a minha mãe (que, aliás, tirou nota máxima na prova de seleção do mestrado na PUC: mil vivas pra ela!). Mas voltando à vaca fria: vaffanculo, seu ladrãozinho pervertido de merda. Se você se interessou por meu perfil do FB, talvez esteja aqui, lendo este post. Então, criatura, escute meu recadinho do coração: get a life! Não adianta ter minha senha: pra ser eu (ou pra me ter), você primeiro precisaria ser uma pessoa, e não um verme.

Transtornada de ódio por causa da verminose social, a caminho do trabalho, eu tive o inenarrável desprazer de passar lentamente, a menos de 5km/h, por um motoqueiro partido em dois pedaços na entrada do Santa Bárbara. O trânsito sempre fica lento nos sítios das tragédias porque uma quantidade impressionante de pessoas se alimenta disso. Parece que elas precisam ver sangue e vísceras para alimentar sua alma medonha de devoradores de sofrimentos. Eu tenho horror a essa gente que freia pra ver um morto ou ferido no asfalto. Você é médico socorrista, cidadão? Vai resolver a cagada? Ah, não vai?!? Então vaza, mané! Mas esses idiotas querem ver tudo, frear para fotografar no melhor ângulo e depois acelerar como quem dá descarga, banalizando a dor e a morte como se a vida não tivesse qualquer significado. Completamente impotente diante da fila de curiosos estacionados diante de mim, vi de relance aquela imagem que provavelmente jamais esquecerei em vida. Foi difícil dirigir de olhos bem fechados, ainda que por uns segundos, porque minha reação instintiva foi simplesmente espremer as pálpebras com toda a força no intuito de extirpar de meu cérebro a cena de terror. Psicopatas à parte, deve ser realmente impossível esquecer o retrato de uma pessoa - ainda viva - partida em duas partes. Pra me livrar do horror, comecei a entoar mentalmente um  mantra que fez minha frequência cardíaca quase voltar ao normal: eles vão juntar os pedaços, eles vão juntar os pedaços, eles vão juntar os pedaços. Então de repente, não mais que de repente, eu chorei pensando: e se eles não conseguirem juntar os pedaços?

Este episódio trágico me passou do modo ódio-verminal pro modo niilista. Qual o sentido da vida, afinal? Nenhum? Algum? Então a gente se parte em mil pedaços, mas e depois? Quem junta tudo isso? Quem põe tudo em seu devido lugar? Quantas vezes a gente consegue se remendar? Quantas vezes a gente consegue sobreviver a todas as dores da vida?

Mais adiante em meu rio de lágrimas, na bocarra de Mango Tree Town, dois caveirões do BOPE decoravam a entrada do hospital veterinário onde trabalho, e se não fosse por meu incorrigível atrasismo crônico terminal, eu teria passado (questão de parcos minutos, me disseram) no meio dum fogarel cruzado, por uma larga rota de balas potencialmente perdidas. Fingi animação (oba, estou atrasada mas, em compensação, estou vivinha da silva!), mas passei o resto do dia semi-morta, semi-certa de que viver é uma questão de sorte, ao passo que morrer, desconfio, seja a conquista definitiva da paz.

Fiquei niilista assim. Ainda bem que eu tenho cachorro, porque cachorro faz a gente esquecer tudo que não seja lambida, amasso de orelha e bolinhas.

Apesar do dia triste, queria dizer que nem tudo é assim tão podre nesta vida: este ano, em vez das flores à Yemanjá, dos 7 pulinhos de onda e dos 7 caroços roídos de romã (cada qual pra um pedido esotérico de realização improvável), decidi virar gente grande e fiz uma planilha de excel com metas, estratégias e prazos a cumprir, como se eu fosse minha própria chefe-carrascuda (aliás, sou super boa nisto) e estivesse em estágio probatório, dependendo de resultados para não ser demitida de minha própria existência. Coloquei 10 itens em minha planilha, e tudo que posso adiantar é que 9 deles já estão em andamento. O décimo depende apenas d'eu ser mais cautelosa com os seres humanos - que são bem menos altruístas e leais que o resto dos animais - e gostar de mim mesma acima de todas as coisas. Apesar do décimo segundo dia horrível, este promete ser o melhor ano da minha vida.

Acho que ainda está em tempo de desejar um feliz e próspero 2011 a todos!