Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

domingo, novembro 20, 2005

Nas asas do blecaute

Eu fiquei às escuras ontem: blecaute em Botafogo. Nos primeiros minutos, foi uma delícia: nenhum barulhinho, só aquelezinho bom das perecas no bosque. Ah, coisa boa blecaute! Vou relaxar...

Depois de uma hora, foi brotando uma angústia: essa joça não volta nunca, pô?

Depois de uma hora e meia, entrei em crise: como é que essa porcaria da Light espera que eu me arrume (às escuras!) pra ir ao show do Asa de Águia? E nada na minha casa funciona sem energia elétrica: telefone, relógio, nada. E o no-break apitando a ponto de me enlouquecer. Fui ao fogão acender uma vela, mas o fogão também não funciona sem luz (dã!). Encontrei a caixinha de fósforos que eu peguei (por sugestão da Cora) no CasaCor. Tomei banho à luz de velas e tateei uma roupa no armário (não posso levar velas pra muito perto das minhas roupas, porque elas não amassam -- eu odeio passar roupa --, ou seja, meu guarda-roupa é todo híbrido de materiais inflamáveis). Eu não sei como, mas eu consegui escolher uma roupa fofíssima pra ir a um... restaurante fino! Saia de seda, blusa de babadinhos, sandália de salto alto... Chegando à Fundição Progresso, me senti uma velha no meio dos jeans, tops e barriguinhas de fora. Mas tudo bem, eu sou maior que um outfit equivocado, vou me divertir à vera, vocês vão ver.

Suvaco do Cristo: beleza, estou sambando, me divertindo à beça. Mas minha turma estava deslocada: eles foram ver Asa de Águia (e existe uma incompatibilidade conceitual entre samba e axé). Fomos circular. As pessoas ainda estão vestidas, ninguém está com calor, suado, nada disso, ufa, ainda bem.

Vai dar a hora do Asa: voltamos pro palco. Já está quente e a banda nem começou a tocar. Durval entra em cena, que loucura, como as pessoas gostam dele! o Asa arrêia, gente! É uma pulação geral, eu me equilibro sobre as sandálias, mas adoto postura de segurança: observando tudo em volta, sem descruzar os braços, pronta pro pior. Mas o pior não vem. Os rapazes começam a tirar a camisa, é muito torso desnudo e sarado passeando pra lá e pra cá. Não posso deixar de reparar que a maioria dos saradões tem peito (ok, peitoral) maior que o meu, o que não chega a ser nenhuma vantagem. E têm mamilos provocantes, que qué isso! Mas eu lá, braços cruzados, controle total, não agarro ninguém. Enquanto o Asa... arrêia.

Estou transpirando horrores, e olha que eu não me movimentei ainda. Um cara na minha frente dança uma espécie de frevo, e quando ele corre de um lado pro outro, sopra uma brisa agradável. Eu seria capaz de beijá-lo por isso, mas ele... putz, ele tem menos de 18 anos! Lembro que estou uniformizada de velha freqüentadora de restaurante caro e tenho vontade de rir quando penso que o menino-brisa e sua turma devem achar que estou ali acompanhando minha filha (mães super-protetoras, sabe como é...). Menino-brisa agora dança com uma menina linda que tem molas nos pés e sabe pular na vertical como se o chão fosse uma cama elástica. E o Asa...o asarrêia. Durval manda e todos obedecem (menos eu e os seguranças): sai do chão, sai do chão. Olho no relógio: não tem 20 minutos de show. Vou prestar atenção na música, então.

Primeira lição da noite: Durval é guitarrista. Segunda lição da noite: não é bom guitarrista, mas troca de guitarra como quem troca de música. A cozinha da banda é igual de cabo a rabo. Chega a ser humanamente impossível saber se ele mudou de música ou não, pois todas começam e terminam em "O Asarrêia, arrêia, arrêia, arrêia, arrêia!". Reconheci algumas faixas que eu já tinha ouvido em rádio ou no carnaval de 2001 em Salvador. Não chego a ficar feliz quando reconheço alguma música, pois todas elas integram meu rol de canções que exigem a ação imediata do dial ou o botão "off" do meu rádio. Mas as pessoas todas estão felizes, e é muuuuito bom ver gente feliz e animada!

O menino-brisa pára de ventar na minha horta: está agora atracado com a menina-mola. Parece um beijo, mas na dúvida eu troco olhares com um segurança pra ele verificar se o menino não está sufocando a pobre da menina.

E o asarrêia, arrêia, arrêia... Olho no relógio de novo, cacetada! Não tem nem uma hora de show. Mas eu vou ficar até o fim, só de reiva! As sandálias de salto alto começam a me torturar. Idéia de jerico ir pra um show popular de salto! Well, popular em termos: paguei 70 paus pra estar ali. A ESTE PREÇO, PITOMBAS, EU TENHO OBRIGAÇÃO DE ME DIVERTIR!!! Faço um esforço sobre-humano pra dar uma mexidinha, mas a banda... a banda... me arria! Meu amigo, um super gentleman, percebe meu desespero e se oferece pra me trazer algo alcoólico que possa anestesiar meu sofrimento. Valente, eu peço pra ele me trazer água mineral. Quero ficar sóbria até o fim! Quero ficar ali até o fim! Só de reiva.

Olho as horas pela enésima vez. Eu odeio axé music, acho que é genético. Meu cérebro não foi geneticamente programado pra curtir Durval. Lanço um olhar de socorro pro meu gentleman e ele entende que não vamos ficar para o bis. Descemos para a pista e lá rola salsa eletrônica, uma experiência musical incomum. São 3h30 e eu ainda não me diverti. Acaba o show do Asa e a Fundição fica vazia. O DJ não faz questão de ter ninguém na pista. Meus pés ardem e eu acho que estou irreversivelmente surda. Não me diverti, mas vi muito projeto de homem bonito, sarado, sensualmente suado. Provavelmente, todos gays ou futuros gays, comparando seus mamilos provocantes sem dar muito na pinta (mas eu pesco tudo, não adianta!).

Aliás, acho que Durval é gay. E esse seria o único lado bom dele.