O Porteiro Noturno, por Lau
Quem quiser ler os demais contos - eu ainda não li porque precisei vir aqui correndo postar isto -, todos selecionados no mesmo concurso, clique aqui.
Lauzinho, fiquei emocionada com a homenagem. Eu adoro você, criatura! Parabéns pelo texto e pelo reconhecimento!
Porteiro Noturno
de Waldir Lau
para Van (que fofo!)
Porra, não há o que faça essa velha calar a boca. É um assunto emendado no outro. Sei que não deveria falar assim da mãe. É ela que dá o quarto, o almoço, cuida das roupas. Nunca vi, aqui na Santa Efigênia, camisa tão branca e bem passada. Não fossem os dentes e essas gengivas inflamadas, não faria má figura: sapato sempre bem engraxado, calça de prega. O corpo não mudou muito desde que parei. Ainda tenho roupa boa.
Preguiça de sair da cama. Trabalhar à noite mata o dia. Claro que durmo um bocado depois que o barbudo do 1802 chega, cada dia pendurado numa vagabunda diferente. Ficar fazendo o que a noite inteira? Se a bicha do síndico me pega vou pro olho da rua. Já saquei que ele sabe que eu bebo. E daí, perder esse salário de merda? No restaurante ganhava a mesma mixaria, mas dava pra roubar um pouquinho. O dono queria mesmo era beber uísque e dar em cima das freguesas.
48 anos, porteiro noturno. Gosto da noite. A gente sempre pode pensar que amanhã vai aparecer um troço pra consertar a vida.
Profissional quatro anos e sete meses. Cinco meses de titular. Olhar pra trás tira a coragem de pensar pra frente.
Quando tem freguês novo o Bira gosta de falar “cadê aquela foto sua com o Reinaldo?” e de lembrar que o “próprio Nelinho falou que o Atlético teve poucos laterais que nem o Libinha”. Libinha de Ataliba. Quando nego nasce pra ser fodido, já começa pelo nome. Que ponta-direita – na minha época não tinha esse negócio de ala – vai respeitar um lateral com esse nome? Até pra locutor de rádio é ruim falar “Libinha alivia de qualquer maneira!”. Nome na defesa conta mais que no ataque. Pega a seleção: Bellini, Carlos Alberto (parece nome de príncipe), Nilton Santos, Roberto Carlos. O Garrincha, se fosse beque central, estava até hoje jogando pelada em Pau Grande.
Dez e meia. Hora de levantar e ir pro Bira, tomar umas pra aperitivar o almoço.
Grande Bira! Nunca forrou gaiola de passarinho com página esportiva:
“Canário meu só caga na cara de deputado pra cima.”
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