Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

sábado, junho 03, 2006

O Porteiro Noturno, por Lau

Estou dando pulinhos de felicidade: o Lau, figura querida que eu tive a sorte de conhecer, publicou HOJE um conto sobre futebol no Estadão, que eu ora publico para facilitar a vida de vocês. O texto traduz, na medida certa do cotidiano, a alma dos homens que amam futebol.
Quem quiser ler os demais contos - eu ainda não li porque precisei vir aqui correndo postar isto -, todos selecionados no mesmo concurso, clique aqui.

Lauzinho, fiquei emocionada com a homenagem. Eu adoro você, criatura! Parabéns pelo texto e pelo reconhecimento!

Porteiro Noturno
de Waldir Lau
para Van (que fofo!)


Porra, não há o que faça essa velha calar a boca. É um assunto emendado no outro. Sei que não deveria falar assim da mãe. É ela que dá o quarto, o almoço, cuida das roupas. Nunca vi, aqui na Santa Efigênia, camisa tão branca e bem passada. Não fossem os dentes e essas gengivas inflamadas, não faria má figura: sapato sempre bem engraxado, calça de prega. O corpo não mudou muito desde que parei. Ainda tenho roupa boa.

Preguiça de sair da cama. Trabalhar à noite mata o dia. Claro que durmo um bocado depois que o barbudo do 1802 chega, cada dia pendurado numa vagabunda diferente. Ficar fazendo o que a noite inteira? Se a bicha do síndico me pega vou pro olho da rua. Já saquei que ele sabe que eu bebo. E daí, perder esse salário de merda? No restaurante ganhava a mesma mixaria, mas dava pra roubar um pouquinho. O dono queria mesmo era beber uísque e dar em cima das freguesas.

48 anos, porteiro noturno. Gosto da noite. A gente sempre pode pensar que amanhã vai aparecer um troço pra consertar a vida.

Profissional quatro anos e sete meses. Cinco meses de titular. Olhar pra trás tira a coragem de pensar pra frente.

Quando tem freguês novo o Bira gosta de falar “cadê aquela foto sua com o Reinaldo?” e de lembrar que o “próprio Nelinho falou que o Atlético teve poucos laterais que nem o Libinha”. Libinha de Ataliba. Quando nego nasce pra ser fodido, já começa pelo nome. Que ponta-direita – na minha época não tinha esse negócio de ala – vai respeitar um lateral com esse nome? Até pra locutor de rádio é ruim falar “Libinha alivia de qualquer maneira!”. Nome na defesa conta mais que no ataque. Pega a seleção: Bellini, Carlos Alberto (parece nome de príncipe), Nilton Santos, Roberto Carlos. O Garrincha, se fosse beque central, estava até hoje jogando pelada em Pau Grande.

Dez e meia. Hora de levantar e ir pro Bira, tomar umas pra aperitivar o almoço.

Grande Bira! Nunca forrou gaiola de passarinho com página esportiva:

“Canário meu só caga na cara de deputado pra cima.”