Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

quarta-feira, agosto 16, 2006

Toda caridade será castigada


Estamira




Todo mundo tem uma história pra contar sobre os efeitos paradoxais da solidariedade, que obviamente são fatos isolados que não devem desanimar os que querem mudar o mundo, mas essa aqui foi demais. Aconteceu com a mãe (W.) de minha fiel escudeira (V.), uma mulher que tem tanta pena de bichinho e gente de rua que vive com o porta-malas do carro cheio de comida e remédio para atender a quem precisa.

Numa gélida manhã da semana passada, Super W. viu-se desprevenida para ajudar o próximo, sendo o próximo uma sem-teto octogenária que tremilicava de frio na praça pública, só em mangas de camisa. Rápida como um raio, Super W. deu meia volta com seu automóvel humanitário, fez um pit stop em casa e pegou um agasalho para dar pra senhorinha. Saiu do carro, aproximou-se com ternura e estendeu-lhe o casaco, dizendo: "Tome esse casaquinho, vovozinha, que é pra senhora não ficar mais com frio." Ela só não esperava que a velhota debilitada saltasse como se tivesse mola nas canelas, lhe apontasse um dedo enorme, com unhas negras que quase lhe navalharam a face benfeitora, e começasse a gritar a plenos pulmões, batendo com as palmas no ar de quando em vez: SUA PIRAAAAAAAAAANHA!!! SAI DAQUIIIIIIIII!!! EU VOU TE MATAR, SUA PIRAAAAAAANHA!


Não havia viv'alma na praça segundos antes, mas foi só a mendiga começar a gritar que logo pintou a galera dos direitos humanos dos outros, fechando o cerco em torno da assustada Super W., aos gritos de "O que foi que você fez com a velhinha?!?", o que fez com que nossa heroína entrasse em seu Batmóvel e batesse em retirada cantando pneu pra escapar do linchamento.


Agora, muito cá entre nós: meu pai é ou não é um gênio por ter previsto que caridade de cu é rola? Mais curso de pescaria e menos peixe filetado, esse é meu lema do dia. Tô de saco cheio desse governo do bolsa-tudo e do tudo a um real, dos sanguessugas milionários que declaram morar no quarto e sala da diarista num bairro proletário e dessa meteção de mão no meu bolso. LARGA MEU BOLSO, QUE EU NÃO SUPORTO MAIS!


By the way, leiam a carta do Fred d'Orey no blog da Cora. Tem tudo a ver com essa indignação que tá pintando na geral. Sinto cheiro de mudança no ar.