Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

quarta-feira, agosto 12, 2009

Peludos que entram e saem

Bradock gosta muito de correr. Dia desses, correndo atrás de um pombo numa rua tranquila do Grajaú, esbarrou num carro sem querer. Chegou na clínica com a maior cara de quem fez uma arte danada (uma fratura de fêmur danada), mas quem fez arte mesmo foi o dono que, acreditando na tranquilidade das ruas do Grajaú, deixou seu hiperativo cão passear sem guia. "Você pelo menos tomou um sustinho?", perguntei. "Tomei, doutora. Tomei o maior sustão, sim senhora." Então eu prescrevi uma cirurgia pro Bradock e uma dose de juízo pro seu dono. Devia ter prescrito duas.

Nina não está comendo nada. Só um pouquinho de queijo, mas tem que insistir muito. E maçã ou banana, mas só se for em rodelinhas super finas. E ontem, quando tudo parecia estar perdido, Nina fez um esforço danado pra comer meio copinho (bem pequenininho) de Häagen Dazs de doce de leite. Aí, não se sabe bem porquê, o cocô ficou mole. Mole, mas mole-mole mesmo. Tenho vontade de rir do início ao fim da consulta, mas não posso: afinal, Nina está muito doente. Estou frouxa de rir por dentro, mas tenho de ficar dura-durinha pra dizer, com a maior cara-de-pau, que sorvete - ai, ai, ai! - não é comida pra cachorro. E que toda vez que o cachorro comer sorvete, ele vai fazer um cocô mole daquele jeito. Aí eu vejo pelos olhos arregalados da dona da Nina que aquela informação era realmente inédita pra ela. Aliás, tudo sobre cachorro era completamente inédito pra ela. Foi a primeira vez que alguém lhe tocou a maior real de todos os tempos: a Nina é um cachorro. Por mais incrível que pareça, tem muita gente boa que não percebe a diferença entre um peludo e uma criança de 3 anos. Pensando bem, a diferença mais marcante é que algumas crianças de 3 anos falam.

A Shaiene achou muito engraçado o meu estetoscópio. Primeiro achou seu cheiro de mil cachorros e gatos meio esquisito e quis mordiscá-lo de leve, depois ficou dando ré na mesa pra tentar encontrá-lo em seu peito. Para fazê-la parar quieta, eu passei o braço ao redor de seu corpitcho gorducho e fechei seu focinho com o polegar e o indicador para lhe auscultar o coração. Ela sentiu uma ternura tão grande com o abraço que ficou se contorcendo pra lamber meu nariz com a pontinha da língua. Enquanto ficamos assim, abraçadas de olhos fechados, nariz com nariz, o coração dela me disse um sem número de coisas lindas que não têm tradução na língua das pessoas.