O pior cego
Estive recentemente no meu oftalmologista. Visita de rotina, só pra sair da rotina das conjuntivites semi-letais e do olho seco terminal. O que vou dizer agora pode parecer meio louco, mas -- porque os olhos são a janela da alma e o oftalmologista é o médico que cuida dos olhos, -- eu sempre encontrei no consultório do meu oftalmo algumas das melhores metáforas da vida. Da minha vida. Episódio metafórico de hoje...
O pior cego
Reclamei com o Evandro, meu médico de olhos, das dores de cabeça que vinha sentindo sempre que insistia em usar os óculos. Ele me sentou naquela cadeira estranha, deixou o consultório na penumbra e colocou todas as letras na parede. De acerto em acerto, fui ficando surpresa - e até sem graça! - com minha extraordinária acuidade visual. Percebendo o clima de "a taça do mundo é minha", despistei:
- Ah, o K também é moleza. Ninguém consegue confundir o K com o M, por exemplo. Difícil mesmo é diferenciar o D do O na última linha.
- Morena, seu grau diminuiu.
- Sério?!? Tem certeza? Será que não é só um artefato cerebral momentâneo?
- Não, não é. E é por isso que você tem sentido dores de cabeça.
Hesitei por alguns instantes, pensei nos prós e contras do pedido, mas acabei mandando:
- Vamos fazer o exame de novo, só pra ter certeza?
- Não, morena. Você vai é fazer novas lentes.
- Ai, caceta.... Essa indecisão dos meus olhos vai acabar me levando à falência!
- Ué, achei que você fosse ficar feliz por estar enxergando melhor.
- Pois é. Talvez eu não queira enxergar tão bem.
Foi aí que eu enxerguei, no semblante do meu metaforista de plantão, um sorriso que queria dizer exatamente isso: o pior cego é aquele que perde tempo temendo enxergar. Enquanto ele anotava em um cartão minha nova prescrição, eu tive uma epifania: daquele dia em diante, eu me esforçaria para enxergar pelo menos dois palmos a frente de meu nariz. Não da janela da alma pra fora, mas da janela da alma pra dentro. De par de palmo em par de palmo se vai ao longe, e de par em par não se chega a sete.
O pior cego
Reclamei com o Evandro, meu médico de olhos, das dores de cabeça que vinha sentindo sempre que insistia em usar os óculos. Ele me sentou naquela cadeira estranha, deixou o consultório na penumbra e colocou todas as letras na parede. De acerto em acerto, fui ficando surpresa - e até sem graça! - com minha extraordinária acuidade visual. Percebendo o clima de "a taça do mundo é minha", despistei:
- Ah, o K também é moleza. Ninguém consegue confundir o K com o M, por exemplo. Difícil mesmo é diferenciar o D do O na última linha.
- Morena, seu grau diminuiu.
- Sério?!? Tem certeza? Será que não é só um artefato cerebral momentâneo?
- Não, não é. E é por isso que você tem sentido dores de cabeça.
Hesitei por alguns instantes, pensei nos prós e contras do pedido, mas acabei mandando:
- Vamos fazer o exame de novo, só pra ter certeza?
- Não, morena. Você vai é fazer novas lentes.
- Ai, caceta.... Essa indecisão dos meus olhos vai acabar me levando à falência!
- Ué, achei que você fosse ficar feliz por estar enxergando melhor.
- Pois é. Talvez eu não queira enxergar tão bem.
Foi aí que eu enxerguei, no semblante do meu metaforista de plantão, um sorriso que queria dizer exatamente isso: o pior cego é aquele que perde tempo temendo enxergar. Enquanto ele anotava em um cartão minha nova prescrição, eu tive uma epifania: daquele dia em diante, eu me esforçaria para enxergar pelo menos dois palmos a frente de meu nariz. Não da janela da alma pra fora, mas da janela da alma pra dentro. De par de palmo em par de palmo se vai ao longe, e de par em par não se chega a sete.
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