Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

segunda-feira, agosto 25, 2008

O tesão gustativo e a corrida de 10km

Nas últimas semanas algumas pessoas me perguntaram, com um espanto tão sincero que chegou a ser comovente, por que eu resolvi me matricular numa academia durante minhas férias. Ora, a resposta é simples: justamente porque estou de férias! Eu sei que isso pode parecer um pouco doentio, mas atividade física é endorfina, e endorfina vicia, então, se eu não precisasse trabalhar (e se meus pés ficassem numa boa), acho que voltaria a praticar algum tipo de atividade física 5 horas por dia.

Mas abundância de endorfina não é a única resposta. Na verdade, eu preciso malhar porque tenho muita fome. Comer é uma das razões pelas quais existo, e eu gosto muuuuuuito de comer. Não tenho nada contra saladas, acho muito importante representar todos os grupos alimentares numa mesma refeição, mas salada pra mim é carícia preliminar. Eu nunca conseguiria ter uma vida de preliminares que nunca chegam à lasagna ou aos pratos pesadamente gratinados. E por isso eu corro. Corro porque como muito, e como ainda mais porque corro. Correr dá fome, e tudo que dá fome é bom.

Ontem jantei com a Sam, Ken e Sima num tailandês baratinho do Village. Eu comi a minha comida e os restos de todo mundo. Minha desculpa pra agir tão mal (não foi assim que mammã me criou) foi que eu queria provar de tudo um pouco, e enquanto eu ia me explicando e lambendo os beiços, falei pra minha irmã que o que eu sinto é mais do que fome, é quase como um tesão gustativo, que eu sou capaz de ter um orgasmo comendo, e ela foi dizendo que sente a mesma coisa, então ficamos felizes que essa doença corre na famiglia e não estamos sozinhas no mundo por isso.

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Há meses eu estou falando com o Ken da Nike Human Race, uma corrida de 10km que vai rolar em 25 cidades em todo o planeta às 8h do dia 31 de agosto de 2008. Eu me inscrevi na Human Race daqui de Nova York, mas somente na semana passada consegui detalhes sobre a roubada em que eu tinha me inscrito. Sabia que era uma corrida de 10 km, mas ouvi um vago boato de que os participantes teriam de completar o percurso em 1h30min. Primeiro eu fiquei um pouco chocada com essa tirania de forçar o contribuinte a correr acima de uma velocidade-moleza, mas depois eu pensei: "ah, se eu não conseguir correr 10km em 90 minutos, eu realmente não mereço viver". Às vezes eu sou radical assim, e às vezes é só uma forma delicada de dizer. Eu sou um radical livre. Meu maior inimigo é a vitamina C.

Na semana passada, descobri que o buraco dessa corrida é mais embaixo: pra ganhar a medalha de participante, eu preciso completar 10km em até 1h15min. Pô, no Brasil qualquer gordinho que completa esse percurso em 6 horas ganha a medalha, a gente tem mais espírito esportivo que esses branquelos de perna fina daqui. Aqui, o buraco realmente é mais embaixo. Pra quem está voltando a correr depois de um longo e tenebroso inverno de fascites plantares e outras dores misteriosas, 10km em 1h15min me pareceu coisa demais, mas como eu não sei fazer essa conta, deixei pra lá.

Desisti de fazer as contas da conversão milha-quilômetro. Pra essa corrida, tudo que preciso saber é que 10km = 6.2 milhas, e isso eu já decorei porque está no site da Nike). Não fiz (porque não sei) a matemática de quantos quilômetros por hora eu tenho que correr. Tudo isto posto, e porque eu sou uma pessoa rústica que não sabe calcular, mas sabe correr um pouquinho, achei mais prático correr 10km hoje na esteira pra ver se eu conseguia chegar lá nesse tempo. Cheguei em 1h12min, mas achei puxadinho. Fiz o teste hoje porque se eu me machucasse tentando, teria ainda 6 dias completos antes da corrida para usar todo o gelo e todos os tipos de Tylenol do mundo para me recuperar. Todo esse comportamento compulsivo me fez pensar o seguinte: não basta ganhar a camiseta de corrida que qualquer inscrito ganha; não basta participar; não basta ir ao show do All American Rejects depois da corrida; o que eu quero é a medalha que eu não ganhei na meia maratona que eu não consegui correr porque não tinha pés. Neste momento em que eu voltei a ter pés, a coisa mais importante do mundo -- depois de comida -- é completar essas 6.2 miles em 1h15min.

Depois eu vou ver o show do Lulu na festa do Little Brazil. O show do Lulu e do Jorge Benjor será como sobremesa: sobremesa é bom, mas a gente não vive para a sobremesa, e sim pro prato pesadamente gratinado que vem antes dela e depois da salada. Torçam por mim. E façam as contas por mim, mas só me contem depois, que eu tenho muito medo dos números.