Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

quinta-feira, novembro 06, 2008

Black nunca foi tão beautiful (e eu nunca gostei tanto de F1).

O mundo entrou em clima de Oba-Obama desde que foi anunciada a chegada do primeiro negro à presidência da maior potência mundial. E o Obama chegou lá pouco tempo depois de o Hamilton ter conquistado o título mundial de F1, entrando para a História como o primeiro negro a ser campeão mundial nesse esporte.

Mas, peralá, moçada: o Obama ainda passa, mas dizer que o Hamilton é negro é forçar uma barra, não é não? Aqui no Brasil ele seria no máximo um moreno médio sob o sol de verão. Agora todo mundo quer ser negão, pô! Eu, que sempre lutei para ser reconhecida como mulher, negra e favelada, pressinto que haverá muito negro saindo do armário nos próximos meses. Aquele seu amigo mulato, que antes de definia como moreno em sites de relacionamento (com endosso da certidão de nascimento, onde se lê "pardo"), passará a se intular "negro, com muito orgulho", do dia pra noite. Black nunca foi tão beautiful.


Hamilton: negro?!? Só porque ele é gato pacas?


Aliás, no Brasil nenhuma criança nasce negra: nasce parda. Pelo menos era assim na década de 1970. Eu lembro um dia na escola em que todos tivemos de levar nossa certidão de nascimento para a sala de aula; acho que estávamos na quinta ou sexta série, eu tinha 10 ou 11 anos. Olha daqui, olha dali, e eu percebi que numa turma de 30 alunos, com 20% de negros, não havia nenhuma certidão de criança negra com a cor da pele registrada corretamente. Na época, pensei que talvez existisse alguma lei absurda que proibisse a palavra "negra" em certidões de nascimento. Imaginei que talvez fosse uma manobra militar para tornar nossa população mais branca, ou talvez ignorância dos escrivães de achar que "negro" é ofensa e "pardo" é eufemismo ou, ainda, talvez medo dos escrivães de tomarem uns cascudos de pais ignorantes, caso estes considerassem ofensivo, de alguma forma, ter um filho registrado como negro. De qualquer forma, eu nunca soube explicar o fenômeno da pardalização da população brasileira, mas acho que isso pode ter nos trazido a vantagem de não dar importância para o rótulo que se dê à pele ou etnia. Ah, qual é minha cor? Sei lá, põe aí: amarelo, pardo ou todas as anteriores. Qualquer coisa serve pra gente. Brasileiro, de forma geral, não liga pra isso. (PS: meus amigos me conveceram e eu retiro o que disse: brasileiros ligam, sim, pra isso. Eu é que fui distraída.)

Para os norte-americanos, saber a cor e a raça é super importante: sem ter uma opinião formada sobre o assunto, você mal consegue se matricular numa academia de ginástica! Isso, pra mim, torna a vitória do Obama ainda mais especial: com sua chegada à presidência, o tabu da hegemonia racial parece ter se tornado uma piada politicamente incorreta super sem graça, que aos poucos deixará de ser contada até que ninguém mais se lembre dela.

Espero que nossos dias de gatos pardos estejam contados. Aliás, espero sinceramente que nossos dias de julgar um ser humano por seu kipá, burka, turbante ou cor de pele - e não por sua essência - estejam contados. Ser gente nunca foi tão bonito, e é por isso que eu agradeço enormemente ao Felipe Massa, de coração, pelas lágrimas derramadas no domingo, pois elas não nos deixaram esquecer daquilo que somos, de fato: gente. De carne e osso mas, sobretudo, de fibra, garra e coração.




Felipe Massa: coração.