Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

quarta-feira, maio 09, 2007

Pra não dizer que não falei de papas.

Um primo meu, quando pequeno, numa época em que ainda não havia TV a cabo, viu seus desenhos e programas infantis serem substituídos, sistematicamente, pela massacrante cobertura televisiva à visita do Papa João Paulo II ao Brasil. Pouco tempo depois, JPII tomou uns tecos dum, como se dizia naquele tempo?, atirador. Ninguém entendeu nada quando, durante o noticiário que exibia imagens do atentado, meu primote gritou pra TV, como se o Papa pudesse ouvi-lo: "BEM FEITO, SEU FILHO DA PUTA!". Avós e tias carolas, que tanto tinham se dedicado à educação cristã daquele esp'ritinho de porco de cinco anos, rezaram várias novenas pela alma do menino. Só depois é que elas rezaram pela recuperação do Papa. À famiglia tudo, ao Papa, o que sobrar.

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Fui à Roma uma única vez, no verão de 2003. Fiquei num apartamento em frente à entrada do museu do Vaticano e fiz todos os tours que podem ser feitos ali. Porém, todavia, contudo, no domingo, que é dia da plebe receber a benção do Papa, eu queria mais era dormir dentro da geladeira: fazia 45 graus à sombra, e isso às 10h da matina! Meu então namorado travou uma luta gloriosa contra minha possessão demoníaca estrogênica e conseguiu me arrastar pelo entorno do muro. E lá fui eu, praguejando, maldizendo a Itália e seus verões, enquanto fritava a sola dos pés na calçada-frigideira, rumo à Piazza San Pietro, onde uns trinta mil fiéis aguardavam a aparição do (já) moribundo JPII. Niki o homem me aparece na janela -- e eu confesso que fiquei emocionada de ver uma criaturinha tão frágil e trêmula fazer um mega-ultra-power esforço pra falar a tanta gente que foi ali só pra vê-lo --, eu identifico, no meio da multidão, o Fábio Pareto, uma das minhas pessoas favoritas, querido amigo de infância. Eu moro no Rio, ele em Lisboa. Ele não sabia que eu estaria em Roma, tampouco eu poderia imaginar que ele fosse estar lá no mesmo dia. Se tivéssemos combinado de nos encontrar no meio daquele mar de gente, nunca teríamos tido sucesso. A gente gritava tanto de felicidade -- em bom italiano de novela da Globo: "ÉS IL MIRACOLO DO PAPA, ÉS IL MIRACOLO DO PAPA!" --, que os guias de turismo católico arrastavam seus fiéis a uma distância segura de nós, os malucos. Afinal, o Papa pode até ser milagreiro, mas há de se ter cautela com gente doida. Se o cara, que é papa, tomou uns tiros, imagina um fodido qualquer!

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O papa chega hoje, e o céu resolveu cair sobre nossas cabeças. Não pude deixar de observar. Se o Flamengo não vencer por 4 gols mais tarde, terei certeza: esse cara é fascista. E estranho.

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Fiz uma visita cheia de privilégios famigliares ao Castel Sant'Angelo, nessa ocasião em que estive em Roma. Um dos "privilégios" de que usufrui descaradamente foi sentar minha bunda num trono papal, que fica numa sala de reuniões onde, na metade do tempo, os papas e seus intelectuais assessores de saias deviam ficar elocubrando sobre o cardápio papal da semana ou o modelito da missa de domingo. Pois sentei minha bunda lá, percuti o trono com meus dedinhos e senti um profundo vazio existencial: eu jamais poderia ser papa: minha bunda não é grande o bastante: eu estava sobrando ali, naquele troninho.

Pensei que a privada papal também devia ser muito solitária. Sem trocadilhos.