Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

domingo, maio 06, 2007

Verbo

Acordei pensando nas minhas contradições. Se eu detesto rótulos, não sei por que diabos fui fazer pós-graduação em homeopatia, a arte do "remédio de fundo", que nada mais é do que a projeção de um perfil físico e mental de um sujeito muuuuuuito doente (um doente Pulsatilla, um doente Arsenicum album, e por aí vai) sobre uma criaturinha de carne e osso.

Se eu detesto rótulos, não sei porque encomendava, sempre que me encontrava em deep shit, meu mapa astral: aquele riscado colorido, até bonitinho, que determina, com base em dia, latitude e uma hora nem sempre precisa (ah, a memória dos obstetras!), quem é, foi ou será uma determinada criaturinha de carne e osso.

Se eu detesto rótulos, não sei porque comprei "Sextrologia", um livro que encerra, em um verbo, o nativo -- homem hetero, homem gay, mulher hetero e mulher gay -- de um determinado signo. E por que um verbo, depois de tantas páginas cagando rótulo de aspectos físicos, arquetípicos, emocionais e sexuais de um doze (x 4) avos da população? Simplesmente, porque não há rótulo melhor que o verbo. O verbo fere, o verbo marca, o verbo é a arma mais eficaz que eu conheço. Pro bem e pro mal.

A numerologia já disse que meu verbo é o sonhar. A astrologia já acha que meu verbo é o sentir. Mas se alguma dessas artes divinatórias milenares inúteis me perguntasse, cara a cara, olho no olho, qual é o meu verbo, eu só poderia dizer: meu verbo é o fo-da-se.

Que se eu pudesse ser um verbo, eu seria o estar; porque nunca se é coisa alguma.


O homem que diz "sou" não é
Porque quem é mesmo é "não sou"
O homem que diz "estou" não está
Porque ninguém está quando quer
Coitado do homem que cai
No canto de Ossanha, traidor
Coitado do homem que vai
Atrás de mandinga de amor
(Canto de Ossanha, de Vinicius de Moraes & Baden Powell)