Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

segunda-feira, junho 08, 2009

Homens de terno

Outro dia vi uma matilha de homens de terno atravessando a rua. Observei como o terno alfa parecia contar vantagem de seu corte moderno e caimento perfeito aos ternos mais modestos do bando. Algumas barrigas salientes despontavam discretamente sob ternos que balançavam ao sabor do vento gerado pelas passadas largas das calças vincadas e meias escuras com sapatos de cadarço muito tristes, muito pretos, muito lustrados. Eram seis homens de modelos e andares diferentes, mas o terno os transformava em patéticos clones desvitalizados que entram em piloto automático das nove às seis (e só atonam à vida quando finalmente livram-se da gravata e atiram o paletó sobre alguma poltrona).

O sinal abriu e eu pensei: os homens de terno me enchem de pena.

É natural que muita gente pense que um bom terno deixa qualquer homem elegante. Era uma vez um homem elegante que um belo dia vestiu um terno, e a partir daí o terno virou sinônimo de elegância e uniforme de trabalho chato. Talvez eu seja a pior pessoa do mundo pra julgar a elegância (ou deselegância) alheia, primeiro porque meu trabalho não é chato, e depois porque eu tenho um estilo tipicamente desgrenhado, misturo tênis com pijama, vestido com roupa de ginástica, jeans com todas as coisas e perco mesmo m-u-i-t-o p-o-u-c-o tempo da minha vida pensando nesse tipo de coisa. Mas sempre que penso num homem de terno, penso em peixes asfixiados em aquários de águas estagnadas. Ou em cãezinhos de sapatos, ou poodles de saia, ou canários engaiolados. E aí eu sinto uma aflição danada. Uma vontade infinita de oferecer ajuda. Os homens de terno me enchem de ternura e solidariedade.

Sei que os homens de terno, sobretudo os de terno alfa, que vestem gravatas de mil reais, não precisam de mim para nada. Sei que eles desprezariam meus cabelos curtos e cacheados, desaprovariam meus sapatos de salto baixo, teriam vergonha de minhas unhas curtíssimas sem esmalte e ririam-se de meus moletons macios com furinhos de estimação. Sei que olhariam pro meu relógio e calculariam, automaticamente, quantas vezes mais valem os seus estimados roléquisses. E quando vissem meu veículo estacionado à porta - uma bicicleta velha com uma cestinha enferrujada - instantaneamente me taxariam de preguiçosa, medíocre e desprovida de ambição. Os homens de terno me dão nojo!

Mas eu sei que por baixo de um terno, existe uma camisa clara, e por baixo dessa camisa às vezes existe um coração. Então, pra perdoar um homem de terno, gosto de imaginá-lo sem calças, de samba-canção e meias pretas até os joelhos, as pernas brancas e finas demais em relação ao resto do corpo, a barriga implorando pra escapulir pelos botões e a dignidade ferida de qualquer ser humano flagrado sem calças em qualquer situação. Tire as calças de um homem de terno, e você entenderá porque os homens de terno me matam de rir.

Pensando bem, eu até gosto dos homens de terno. Mas, ainda assim, eu os prefiro sem.