Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

segunda-feira, setembro 28, 2009

Festival

Não me lembro quando fui ao Festival [de cinema] do Rio pela primeira vez, mas eu lembro que fiquei tão enlouquecida que consegui emplacar, heroicamente, uma média de 4 sessões por dia por uma semana ao custo de ter arrancado todos os pentelhos do meu corpo no desespero de chegar às salas lotadas, em cantos opostos da cidade, a tempo de pegar cada sessão antes do primeiro ponto de virada. Ufa!

Um breve parêntese sobre heroísmo

Na semana passada, ouvi de um médico da Fiocruz (que defendia a investigação clínica detalhada e o fechamento do diagnóstico antes da prescrição de qualquer droga nefro&cárdio tóxica usada contra a leishmaniose cutânea) uma frase brilhante sobre culhodice (a arte de ter culhões): "A linha que separa o heroísmo da imprudência é o êxito".

(fecha parêntese)

Ou seja: quando o ser humano compra ingressos para 4 sessões no mesmo dia, e todas elas ocorrem no horário, o trânsito da cidade flui como seda, nenhuma desgraça acontece e o bilhetes não se perdem no caminho, parabéns, você é um herói: conseguiu cumprir sua agenda de cinéfilo maluco.

Agora... se o bilhete do cinema fica no bolso da outra calça, se uma carreta vira na Praia de Botafogo, se o metrô pega fogo ou se o filme ainda não chegou do raio que o parta de onde veio - ou pior, se não vieram as legendas justamente daquele filme iraniano que você quase desistiu de ver, mas foi mais forte que seu preconceito contra tudo que vem do Oriente Médio e se fudeu novamente - bem feito pra você, que foi imprudente.

Por isso é que eu, que sou cinéfila, mas sou madura, só me arrisquei a comprar ingressos pra, no máximo, duas sessões por dia. E já tá de bom tamanho. Afinal, ninguém come tanta pipoca.

sexta-feira, setembro 25, 2009

AIDS: enfim, uma boa notícia.

Deu na Scientific American e em todo o resto: enfim, uma vacina anti-HIV que parece ter eficácia em 1/3 dos imunizados. Resta saber se funcionaria fora da Tailândia e se algum ministério da saúde aprovaria uma vacina do tipo roleta russa (com um canhão de 3 balas).

quinta-feira, setembro 24, 2009

12 assinaturas hoje: estamos cada vez mais perto da meta



Hoje eu consegui coletar 12 assinaturas sem muito esforço. A maioria das pessoas não carrega consigo o título eleitoral, mas eu tenho sempre comigo uma lista onde eu anoto o telefone ou e-mail dos que não sabem de cor o número de seu título e, no final do dia, entro em contato para completar os dados obrigatórios dos signatários.

O MCCE já recolheu mais de um milhão de assinaturas; agora faltam cerca de 300 mil para que o movimento possa apresentar o PROJETO DE LEI DE INICIATIVA POPULAR SOBRE A VIDA PREGRESSA DOS CANDIDATOS. Nada que a gente não consiga obter com um grau mínimo de esforço e mobilização. Se metade das pessoas que eu conheço se comprometesse a coletar pelo menos 100 assinaturas, o MCCE não estaria nem um pouco preocupado neste momento em obter o número mínimo de signatários para evitar que essa gentalha ficha-suja se candidate nas próximas eleições.

Por isto, faço um apelo a cada um dos meus 130 leitores diários: coletem assinaturas e encaminhem seus formulários para o MCCE o mais rapidamente possível. Os formulários enviados até o dia 28/09/09 serão encaminhados junto com o projeto de lei; os restantes serão anexados à medida que forem recebidos, apenas para reforçar o apelo popular do projeto.

Cabe lembrar que o MCCE não é um movimento político, e sim de resgate de cidadania. Ainda há tempo de resgatar a nossa. Entrem no site, imprimam formulários, coletem assinaturas, formem comitês, mudem o Brasil!

Ou não façam nada disso, mas também parem de dizer que o Brasil está um cocô danado. Está na hora de sairmos de nossa zona de conforto, arregaçar mangas e fazer alguma coisa.

E se nada disso der certo, pelo menos consultem a lista de prefeitos e vereadores cassados por corrupção aqui. Seja cidadão, vote consciente.

VÍDEO CAMPANHA FICHA LIMPA: BAIXE, ASSISTA E DIVULGUE!

Campanha "Ficha Limpa" - MCCE

Imprima o abaixo-assinado no link abaixo e recolha o máximo número de assinaturas pra evitar que bandidos continuem sendo eleitos.

http://mcce.org.br/sites/default/files/formulariocomdata.pdf

Mais informações sobre a campanha: http://mcce.org.br/

terça-feira, setembro 22, 2009

Castelo Fiocruz


Castelo Fiocruz
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Aberto ao público para visitas guiadas de duas horas. 25906747

Turistas para sempre na cidade maravilha

Almoço com foto no curso de leishmaniose em Manguinhos.

Fiocruz


Fiocruz
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Endomarketing


Endomarketing
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Maneiro!

segunda-feira, setembro 21, 2009

Quelônios monk blues

Tem muita gente que choca e sufoca na própria sialorreia quando eu digo que, embora seja veterinária, não entendo nada de urubu, onça pintada, boto ou baleia. "Mas de cavalo e boi entende, né?" Hum-hum. Aí a terra treme com o impacto do queixo caindo no chão. "E nem de bode, galinha, pato, coelho, porco e hamster?!?"  Nem. "Mas e se eu atropelasse um mico leão dourado, espécie em extinção, você teria coragem..." E as situações hipotéticas pipocam. Nessas ocasiões, eu sempre digo a verdade: que conheço um veterinário ótimo que atende todos esses bichos que não são cachorro ou gato. E de cara eu conto algumas histórias que ilustram bastante minha ignorância com os animais exóticos.

Primeira regra de ouro da veterinária: na dúvida, verifique a identidade dos pais.

Eu trabalho num serviço que não tem pronto-socorro. Ou seja: o atendimento é feito por ordem de chegada, e pra saber quem chegou na frente de quem, há distribuição de senhas em dois horários - 8 da manhã e 1 da tarde. Embora não haja atendimento de emergência - e a tolerância de nossa clientela madrugadora para furadores de fila costuma ser zero -, de vez em quando alguém na sala de espera grita: "MEU ANIMAL ESTÁ MORRENDO!" E aí a gente, obviamente, vai ver o que é. Numa dessas, uma mulher, tão logo abri a porta de meu consultório, enfiou nas minhas mãos uma caixa de sapato com uma gata escama de tartaruga, dizendo: "Ela entrou em trabalho de parto há dois dias e o último está atravessado no canal, agonizando, todo roxo." Caraca, diante de um caso prontinho como esse, não havia nada a fazer além de sair correndo pro centro cirúrgico. Cheguei lá que nem primeiro segmento de "E.R.": PREPAREM UMA CAIXA PRA CESÁRIA, RÁPIDO! DISTOCIA FETAL EM GATA MUITO PEQUENA, NEONATO EM HIPÓXIA. PRECISO DE AMBU PEDIÁTRICO, OXIGÊNIO E DE UM TRAQUEOTUBO NÚMERO...."

Aí eu fui ver que raio de traqueotubo eu usaria num gatinho tão minúsculo, e olhei pra ele de novo, e de novo, e de novo, pra perceber só na quinta ou sexta olhada que aquele rato só podia ser filhote de um porquinho da índia; o que fazia muito sentido, porque a mãe, que eu achei que estava encolhida de dor, era na verdade um tipo muito curto e alto de gato, como são todos os porquinhos da índia quando olhados de relance. Sorte que na cirurgia, naquele dia, estava meu professor de todas as horas, o Ricardo, que sabia exatamente o que fazer com um porquinho da índia naquela situação. Eu jurei que nunca mais confundiria predador com presa.

Quelônios blues

A Lorena uma vez me contou às lágrimas como tinha morrido seu jabuti de 30 anos: o pai juntou as folhas secas num canto do quintal e tascou fogo naquela montanha de 3 metros de altura. Dez anos depois, saiu de baixo da fogueira um jabuti em chamas naquilo que eu acredito ser a velocidade máxima de um quelônio desesperado: 200 cm por hora. A Lorena fazia veterinária comigo e estava inconsolável porque internou seu jabuti numa unidade de terapia intensiva, fez fluido, cirurgias de emergência, mas nada deu jeito de salvar seu bichinho. Ela chorava com aquilo, coitada, e eu juro, por tudo que me é mais sagrado, que tudo o que eu conseguia fazer naquele momento era pensar nas cenas mais tristes da minha vida pra não rir do jabuti "running for his life".

Aliás, até hoje, quando eu corro, eu penso nisso: preciso melhorar meu tempo, porque sei que minha vida um dia dependerá do quão rápido eu consigo correr, e a vida de veterinária me ensinou que quem corre pouco pode acabar morrendo queimado no próprio quintal.

Essa história do jabuti sempre me deu a sensação de que eu um dia pagaria um karma quelônico ou, no mínimo, passaria uma eternidade ou duas no purgatório dos jabutis. E não deu outra: quando eu morava em Santa Teresa e a Radija era apenas um filhote ridículo de 5 meses, recebo uma ligação de alguém da minha casa: "Radija atacou o jabuti do Frank". Frank era um alemão que trabalhava na casa em que eu morava, e só naquele dia eu descobri que além de filar nossa máquina de lavar roupa, nosso leite e nosso café, ele filava também nosso quintal, onde ele criava seu jabuti, que meu cachorro comeu. Ou melhor, tentou comer. Na verdade, em defesa da Radija, vou dizer que ela latiu pro Jabuti e ele, que era muito prepotente, escondeu-se dentro de sua casa e ignorou completamente os chamados de minha cã, que na ausência de um adulto responsável que lhe dissesse exatamente o que se pode e não pode fazer com um jabuti genioso, resolveu mastigar o casco do jabuti pra que ele saísse da toca. O resultado não foi nada bonito, me disseram ao telefone. "Parece que o jabuti está  partido ao meio. Se ele não está morrendo, seria melhor que você viesse aqui pra sacrificá-lo e acabar com essa agonia." Minha espinha gelou. Eu estava dando aula de inglês e avisei pra galera: "Sorry guys, but my dog attacked a turtle and I have to run to the nearest turtle hospital right now." Levei o jabuti pro hospital de jabutis mais próximo, o que já era bastante longe pacarái, eles remendaram todas as suas partes e colocaram a resultante no soro imediatamente, mas ele não resistiu aos ferimentos e morreu.  Fiquei arrasada. Meu bebê cão era um assassino confesso, e tudo aconteceu porque eu era uma dona ausente e não estava em casa com ela em todos os momentos de sua complicada e delinquente infância.

Não tenho o menor orgulho da Radija pelo mal irreversível que ela fez ao Jabuti do Frank, mas da mesma forma que não adianta pensar que a gente estará ao lado do nosso cão em todos os momentos, não dá pra ralhar com um cachorro infantil duas horas depois da merda feita.

Quanto ao Jabuti do Frank, eu queria realmente ter tido uma chance de conhecê-lo melhor. Eu nunca tinha tido um jabuti em casa e, quando tive, eis que meu cachorro o come antes d'eu conhecê-lo! Foi só então que eu compreendi a Lorena e a injustiça que é essa antivelocidade dos jabutis: se eles fossem mais rápidos, talvez tivessem alguma chance de escapar dos cães hiperativos e dos incêndios domésticos.

quinta-feira, setembro 17, 2009

Vivi

Minha amiga e fiel escudeira, Viviane, acaba de inagurar um blog pra exibir as bolsas lindas que ela está vendendo. Passem por lá!

sábado, setembro 12, 2009

Coisas do Leblon


Coisas do Leblon
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Figuração canina em vitrine.

quarta-feira, setembro 09, 2009

Você já abraçou seu veterinário hoje?

As vacinas estão em dia? Cadê a carteira de vacinação? Desculpe, mas só acredito vendo. Já lhe falaram sobre as vantagens da castração? Posso botar a mão na ferinha? Segura a boquinha. Por que você está rosnando pra sua tia com esses dentes c-h-e-i-o-s de tártaro? Por que não escova os dentes do seu cachorro? Como assim, ele come pão? Como assim, ele come pizza? Você não tem vergonha de dizer uma coisa dessas prum veterinário? Barriga pra cima. Vira de lado, umbigo pra mim. Silêncio, por favor. Sabe que cheiro é esse? Pum de pizza. Sobe na balança. Precisamos melhorar esses números. É, eu sei... cafuné na orelha é super bom!... Hum, agora você quer me beijar, né? Precisamos cuidar desse bafo de tigre louco. Quero ver vocês aqui na semana que vem. Traga os exames. E a carteira de vacinas! Ah, e nada de pizza!


9 de setembro: dia do médico veterinário
(a profissão afetiva mais engraçada do mundo)

quinta-feira, setembro 03, 2009

A United quebra violões

Isso é o que acontece com as empresas que maltratam o consumidor e não assumem suas responsabilidades!

A United Airlines danificou o violão de um músico americano e este, depois de ter tentado em vão uma indenização no valor do equipamento, pôs no Youtube um vídeo que conta a história. A empresa aérea, dizem, já andou oferecendo 200.000 pro moço tirar o vídeo do ar, mas agora quem tá com preguiça é ele. Sintam-se vingados!

terça-feira, setembro 01, 2009

Deus é carioca


Deus é carioca
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Praia vermelha, meu treino intervalado preferido.

Profissão: motociclista ou repórter (quem dá mais?)

Quando percebi que minha carteira de motorista estava prestes a vencer, decidi que em vez de simplesmente renová-la, eu aproveitaria todo aquele megaloprocesso burocrático hercúleo - que parece ter sido estrategicamente planejado por psicólogos-psicotécnicos especializados em artimanhas para o contribuinte desistir no meio - para fazer uma inclusão de categoria de habilitação. Dentre as categorias disponíveis, eu poderia me habilitar para a condução de ônibus, caminhão, jamanta ou moto, então eu fui modesta e decidi que moto, pelo menos pra mim, que sou mignon, estava bacana. Ademais, moto é um veículo econômico, ergonômico, maleável, cabe em qualquer cantinho e, portanto, não é tão difícil de estacionar quanto uma jamanta, e a questão do estacionamento nunca pode ser sublimada nesta cidade. Ter um carro grande, aqui, muitas vezes pode significar ter de estacionar no Grajaú para então andar até a Lapa, onde seus amigos todos te esperam num barzinho lotado.




Foi só eu decidir minha nova categoria, que imediatamente surgiram em minha adoentada mente imagens glamorosas de divas do cinema deslizando sobre vespas, metidas em calças saint-tropez com uma blusa xadrez amarrada acima do umbigo, um charmoso lencinho amarrado ao pescoço e sem qualquer vestígio de capacete, claro, que na época das divas, o cabelo era mais importante que a segurança. Mas como os tempos são outros, eu totalmente me imaginei andando numa moto mais modernosa, com um capacete minimalista e óculos penélope charmosa. Agora só faltava a habilitação, depois o capacete ideal, depois os óculos ideais, depois a jaqueta de couro ideal e aí, por fim - justamente por ser o menos importante - a moto mulherzinha ideal.


La donna è mobile sobre uma Guzzi.

No mundo real, no entanto, eu já tinha a mais completa noção de que jamais teria coragem de andar de moto no Rio de Janeiro, porque eu sou daquelas que se cagam de medo de assalto quando estão sozinhas e precisam parar o carro - carro, efetivamente, com portas que travam e vidros com janelas que fecham - num sinal de trânsito qualquer repleto de pedintes. Se eu sou assim de carro, imagina o ataque de pânico que eu não teria estando vulnerável sobre uma moto, à mercê de meliantes que podem, na ausência das barreiras físicas do carro, efetivamente tocar suas vítimas e até lhes arrancar pedaços de orelha e nariz com cacos de gilete e, quiçá, com os dentes. Tem mais gente ruim e raivosa nesse mundo do que supõe nossa vã filosofia.

Então, como vocês podem imaginar, eu já entrei no processo de habilitação sabendo que só subiria na minha Ducati ou na minha Vespa novinha em folha se fosse pra passear às margens do Sena ou do Tibre, ou pra tomar uma fresca numa colina qualquer da Toscana, ou seja, em lugares quase tão bonitos quanto o Rio, mas onde ainda é possível beber quantidades moderadas de um bom vinho e conduzir uma boa moto sem o risco de ser alvejado à queima roupa por três balas na cabeça sobre seu veículo ou dragado por um buraco no asfalto que o meu, o seu e o nosso IPVA não é capaz de tapar porque os políticos e os malfeitores em geral são sempre mais criativos que o homem de bem.

Na verdade, à medida que a minha certeza [de que eu nunca teria culhão pra andar de moto no Rio] se consolidava, eu ia perdendo o interesse no processo de habilitacão, que não tem validade quando se trata de inclusão de categoria, então deixei a coisa correr solta por quase um ano, até que finalmente chegou a hora do dá ou desce: ou eu fazia a prova prática e passava, ou minha carteira de motorista perderia a validade e eu teria de refazer todo o processo hercúleo de pagar DUDA, marcar ida ao Detran, fazer exame médico, prova teórica, etc. Ah, porque uma coisa tem que ficar bem clara: se você faz a prova teórica e o exame médico para inclusão de categoria, esses exames, embora sejam exatamente os mesmos exigidos para a renovação pura e simples da habilitação - não podem ser aproveitados de um processo para o outro. O sistema do DETRAN não suporta esse tipo de promiscuidade. Aliás, o DETRAN não suporta que as pessoas tenham uma vida e mais o que fazer de seu tempo que passar dias, semanas e até meses na linha tentando agendar uma porra de uma visita. Tudo isto posto, achei mais prático pedir pra motoescola marcar logo minha prova prática de moto. Afinal, quase um ano de aulas deveriam ter algum tipo de serventia. Então no dia marcada, lá fui eu pro Parque dos Patins, na Lagoa, fazer a minha coisa e resolver logo essa pendência na minha vida.

A Prova Prática de Habilitação para Motociclistas

A prova é muito bem bolada: o percurso começa numa baliza com vários cones (para testar a destreza do condutor), passa por uma prancha com cerca de 5 metros (para testar o equilíbrio), por um redutor de velocidade, contém zigue-zagues (para testar a capacidade do ser humano de usar seta pra direita ou esquerda e depois, a coisa mais difícil de todas em se tratando de um veículo que não faz isso automaticamente, desligar a seta), um oito duplicado e, ao final, o condutor entra num retão com marcações para passar a terceira, depois a segunda, depois a primeira e, finalmente, frear, pôr o pé esquerdo no chão, colocar a moto em ponto morto, desligar o farol, desligar o motor e conduzir o veículo, a pé, por entre 3 cones. Isto serve para testar a habilidade do condutor de carregar a moto quando ela estiver bêbada demais pra andar com as próprias pernas.

Duzentos motoboys depois, quando chegou a minha vez, eu fiz tudo isso. Para meu total choque e horror, contudo, o avaliador do Detran chegou ao lado da minha orelha e disse:
- OK, você foi reprovada.
- Oi?
- Você foi reprovada porque deixou [a moto] morrer.
- Deixei morrer? Ah, moço!.. (grossas lágrimas começam a descer pelo meu rosto) Deixei, não, moço... (minhas mãos ficam geladas)
- Deixou, sim.
- Moço, olha aqui como não deixei (e virei a chave na ignição pra mostrar que a moto realmente estava em ponto morto; quando a moto morre, geralmente está engrenada). Eu verifiquei com a palma da minha mão que o farol estava ligado e só então eu o desliguei. O farol desliga quando a moto morre, moço, e eu sei o que é uma moto morrer, porque afinal eu fiz isso acontecer umas 157 vezes nesse ano inteiro em que eu tive aulas de condução.
- Olha aqui, eu não tenho motivo algum pra lhe prejudicar.
- Então me diz, por favor: por que você está prejudicando?!?
- Ó, a nossa conversa acabou aqui.

E acabou mesmo. Eu ainda tentei, mas ele já tinha se embrenhado entre os colegas de jaleco azul dele e não teve jeito. A maré subiu na Lagoa Rodrigo de Freitas, tamanho era o fluxo lacrimoso que eu vertia em cima da minha ficha de avaliação onde se lia a maior das injustiças: REPROVADA.

Confesso que eu teria ficado incrivelmente triste se eu tivesse, durante a prova, atropelado um cone - embora eu sempre pense que antes atropelar um cone que um cachorrinho -, mas eu fiz uma prova perfeita, meu próprio instrutor de moto estava lá e viu (e nem ele acreditou no que viu), mas a prostração que eu senti por ter sido vitimada por tamanha injustiça era algo que eu não experimentava desde a época do kichute. Ou desde que o Brasil perdeu a Copa do Mundo na França. Caí de cama.

Dois dias depois, comecei a achar que o avaliador do Detran, na verdade, queria que minha primeira frase fosse algo no estilo "claro que deixei morrer, chefia! E, muito cá entre nós, em quanto fica esse lapso tenebroso?". No terceiro dia, pensei que meu instrutor também fazia parte do esquema de corrupção, afinal ele tinha visto eu apagar o farol e não falou nada em minha defesa, deixou o avaliador sustentar a mentirada toda. No quarto dia, pensei em denunciar todo o esquema à Polícia Federal; no mesmo dia, à noite, achei que seria mais modesto denunciar antes pro Globo. Aí, porque eu sou brasileira e passaram-se muitos dias, eu esqueci.

Da próxima vez, talvez valha à pena eu perguntar ao avaliador, antes da prova, o que eu preciso fazer pra minha moto não morrer no final. Afinal, só tem um dono da verdade ali, e toda verdade parece ter seu preço. Espero que ele não note que está sendo filmado, porque eu prefiro vender o furo a tirar carteira de motociclista.