Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

sábado, maio 31, 2008

Profilaxia de assalto

Contei pro meu pai que uma amiga virou estatística esta semana ao ser obrigada a passar carteira, bolsa e anel num sinal da vida e que, em seu relato do crime, me chamou a atenção o fato d'ela ter dito que o bandido portava uma pistola, portanto não havia nada que pudesse ser feito para evitar o assalto. Depois de ouvir meu relato angustiado do causo - ó, então minhas pessoas queridas realmente têm o impulso da reação, isto é horrível! -, pro meu choque e horror, meu pai confessou que recentemente também reagiu a um quase assalto.

Estava ele ali, esperando um ônibus tarde da noite na Presidente Vargas, uma avenida cujos únicos transeuntes depois das 22h são os bandidos vivos, as almas penadas da chacina da Candelária e uma meia dúzia de vítimas potenciais, entre as quais os moradores de rua e o pai'Or, cuja cabeça completamente branca, aliada à baixa estatura, costuma atrair 11 em cada 10 trombadinhas. Pois vendo que dois camaradas em atitude completamente suspeita cruzavam a avenida em sua direção, ele jogou os livros e o jornal que carregava no chão, tateou os bolsos simulando a busca nervosa de algo, levou as mãos ao alto gesticulando muito e começou a gritar: "MERDA, MERDA, MERDA! MIL VEZES MERDA!" Olhei pro meu pai impressionada, perguntei sua intenção com aquilo, e ele explicou: ninguém se aproxima de uma pessoa nervosa e de temperamento descontrolado, nem mesmo os ladrões. Tanto foi, que os suspeitos deram meia volta e sumiram entre as almas penadas, no ninho da escuridão.

Essa lógica me deixou tão impressionada que não tive como não me imaginar na mesma situação, reagindo a um assalto iminente. Se eu tivesse de gritar alguma coisa pra assustar o ladrão, gritaria "IÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁÁ!", saltaria em posição de combate e xingaria coisas inomináveis em japonês - it, nit, san, xi, go - pro ladrão pensar que eu estou possuída por uma variedade agressiva e delirante de pombajira ninja.

É claro que eu jamais faria uma coisa dessas, até porque sou péssima atriz e correria o risco de rir de mim mesma no meio da cena, mas é divertido imaginar que é possível reverter contra nossos algozes uma pequena parte do medo que eles nos infligem para faturar facilmente algo que nos custou muito suor. Seria muito bom se, na hora de votar, a gente pudesse deixar registrado na cédula eletrônica nossos gritos de "MERDA, MERDA, MERDA, MIL VEZES MERDA!" para que esses bandidos do colarinho branco pensem duas mil vezes antes de enfiar ainda mais a mão em nosso bolso sob a falsa alegação de que não arrecadam o suficiente para garantir nossos direitos constitucionais.

Do jeito que a coisa vai, se a gente não começar a gritar agora, não nos restará mais nada.

sexta-feira, maio 30, 2008

Como dar comprimido para seu gato

Primeiro vídeo de uma série de muitos que temos pra fazer. Idéia é que não nos falta, mas aceitamos sugestões. Assistam, opinem, divulguem: http://www.youtube.com/watch?v=PTBa5d3h9hc.

quarta-feira, maio 28, 2008

A Lála me confunde.

Galera, eu sei que ando repetitiva, às vezes nem eu me aguento, mas preciso que vocês entendam o seguinte: a Lála me inspira. Pra mim, ela é uma espécie de musa, uma estrela de enorme grandeza em torno da qual eu simplesmente orbito, e aí é muito justo que, nos dias em que a tenho aqui, eu só consiga pensar nela, escrever sobre ela e, se Lála tivesse os músculos necessários para atender e falar ao telefone, eu provavelmente passaria o dia inteirinho dependurada no telefone com ela. Eu gostaria de ter, de verdade, disponibilidade afetiva para falar do Minc no Ambiente, das milícias em favelas, da caçada ao Pitbull da Mangueira, mas mesmo quando eu ouço granadas explodindo e disparos de metralhadoras a poucos quilômetros do meu escritório, só consigo pensar na Lála e em sua fobia de ruído.

O feriado prolongadíssimo, como todos sabem, terminou há 3 dias, mas as férias da pituca ainda perduram em minha casa. Quando seu dono a trouxe na semana passada, perguntei quando ele viria buscá-la, mas já perguntei não querendo perguntar, porque às vezes o dono se distrai e vai deixando o cachorro, vai deixando... mas aí, se eu vou e pergunto assim, em cima do laço, isso instantaneamente acende um alerta no cérebro do proprietário e ele logo se programa para voltar e buscar o cão num determinado dia. Pois foi só eu perguntar que ele respondeu, dando a entender que não seria dessa vez que ele esqueceria sua comigo. Mesmo correndo o risco de soar esquisita, despedi-me dizendo: "Olha, se você resolver não voltar para buscá-la, tudo bem: na minha casa tem um lixeirinha do tamanho exato da Lála." Ele sorriu e eu fiquei mais ou menos séria, pensando que da próxima vez eu tenho de ser mais objetiva e perguntar, por exemplo, se ele não gostaria de vendê-la ou trocá-la por um poeminha, sei lá.

***

Hoje não vou colocar fotos da Lála porque ontem ela "sofreu" uma tosa higiênica, que é aquele corte de cabelo que deixa as extremidades magras e o corpo gordo. Sou contra humilhar os outros com a publicação de fotos desfavoráveis. Não que a Lála estivesse completamente magra antes da tosa, mas toda mulher sabe que, dependendo do corte de cabelo, a vítima pode pular de leitoa a baleia num abrir e fechar de tesouras. Se nas mulheres o cabelo é a moldura do rosto, no poodle, é a moldura do corpo!

segunda-feira, maio 26, 2008

Ajudem a encontrar a Meg!


Ajudem a encontrar a Meg!
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Fugiu em 04/05/08 de uma casa no Anil, Jacarepaguá, por medo dos fogos. Sua dona também é idosa e está sentindo muito a falta de sua amiga. Tel. 2447-6014 e 9163-5682.

domingo, maio 25, 2008

Urca


Urca
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Um domingo perfeito


Um domingo perfeito
Originally uploaded by Van-Or
Às vezes um cão nos ajuda a lembrar que os melhores prazeres da vida são também os mais simples, como um passeio ao pôr-do-sol.

A coLáleta de sangue

Uma das vantagens de se ter uma babá super-qualificada e hipocondríaca é justamente o diagnóstico precoce de algumas doenças. A Lála não tem como saber disso porque é apenas um cachorro; não bastasse ser um cachorro, é também um poodle, uma das raças mais sócio-politicamente alienadas que há. Para preservar sua inocência e mantê-la ignorante de minha identidade secreta de médica veterinária, terceirizei a um enfermeiro do CAD a suja tarefa de furar seu bracinho encaroçado para a coleta sangue de um check-up de rotina. Ele chegou, lavou as mãos e perguntou se o cachorro mordia. Respondi, entre dentes, que cachorro que ladra não morde e pensei, cá com meus botões, que nenhuma pessoa que lide rotineiramente com animais dotados de dentes deveria fazer uma pergunta estúpida dessas, porque, afinal, pega muito mal. Todo animal dotado de boca e dentes morde, ora bolas, basta que para isto a boca se abra e feche sobre o objeto mordido.

Posicionamos a Lála sobre meu colo no sofá, ele sacou da maleta aquela borrachinha de garrote e, quando apertava o laço sobre o bracinho não-encaroçado da menina, noto um convulsionar de corpos, um recuo do homem e ouço um pífio "ai".
- Ela me mordeu, o moço disse.
Pedi pra ver o local da mordida, analisei bem a situação e decretei:
- Não, ela não mordeu: ela bicou. É diferente. Mordida sangra ou, no mínimo, fica com a marquinha dos dentes. Ela só te bicou pra te alertar que preferiria que você não a tocasse. Vou ter um particular com ela, me dê só um segundo.

Tive meu particular com a Lála. Porque ela estava agitada, precisei lançar mão de um recurso extremo, o doguitos, para que ela se concentrasse 100% nas coisas importantes que eu tinha pra lhe dizer:
- O mosquito, que não é da dengue, e mesmo que fosse não te contaminaria, vai te picar aqui no bracinho. Você vai levar um susto, mas será um susto rapidinho, a gente vai ficar paradinha por 60 ou 90 segundos, e depois eu vou te dar esse doguitos aqui (e talvez mais um), a gente vai passear e daqui a dez minutos ninguém vai se lembrar desse episódio.

Não foi tão simples assim: precisamos chamar a Fabiana, minha diarista, pra segurar os pezicos da Lála que se agitavam no ar. Ela ainda tentou bicar o enfermeiro algumas vezes, mas na quarta tentativa o sangue saiu, ele encheu alguns tubos, e fomos felizes para sempre.

Alguns minutos depois, quando eu e minha protegida caminhávamos ao sol da meia estação, comecei a gargalhar alto, rindo sozinha da minha cara-de-pau encerada e lustrosa, que livrou, ao mesmo tempo, não só o enfermeiro de uma mordida no exercício da função, como a minha própria mão d'uma bicada e a Lála do estigma de cão feroz mordedor de coletores de sangue e quetais. Poodles são tão fofos que deveriam ficar longe de qualquer tipo de estatística.

sábado, maio 24, 2008

DiLáLagos


Eu gosto de conversar com a Lála porque ela, além de ser um cara legal e super de bem com a vida, é divertida e me faz rir à vera. Nossos papos não são extremamente profundos, como vocês podem imaginar, mas eu acho bacana manter alguns amigos que nunca falem de política, religião, esporte, tecnologia, relacionamentos amorosos, saúde, dinheiro, trabalho ou filosofia, just for a change. Parece que, tirando tudo isso, sobra pouca coisa mas, por incrível que pareça, sobra todo o resto. Por exemplo:

Comida
Lála é louca por comida e eu não fico muito atrás. Ainda há pouco travamos um diálogo - quase uma batalha - sobre esse tema:

- O que é isso que você está comendo? Tem um cheiro ótimo, hum... posso enfiar meu nariz aí dentro?
- Não, Lála! Isto aqui é risoto de frango e alcachofra, não é comida de cachorro. Sua comida de cachorro está ali, ó, no seu pratinho.
- Ah, fala sério. Como é que você pode considerar comida aquela ração light? Isto aqui está bem mais interessante, hum..., vou colocar meu nariz só um pouquinho, talvez um pedacinho da língua.... ih, acabei provando sem querer! Eu estava certa, sua ração é muito mais gostosa. Vamos trocar?
- Não, nem pensar! O máximo que eu posso fazer por você é colocar uma colher de chá daquele risoto de lula na sua ração, esquentar no microondas - hum, olha que cheirinho bom... -, jogar um fio de azeite extra-extra virgem por cima de tudo, dar uma misturadinha, um tiquinho de cottage e voi lá: sua ração agora parece um risoto.
- Mas não é.
- Não posso fazer mais nada, Lála. Sou um ser humano limitado e meu nome não é Sudbrak. Come aí pra gente terminar de ver "Beyond Borders". Depois a gente faz mais um passeio.
- É. Se eu passo dois segundos sem pensar no gosto da sua comida, até que a minha não fica nada mal. Nham nham nham. Isso meio branco aqui é o quê mesmo? Alcachofra?


Les misérables
A consciência social dos poodles está longe de ser admirável, e por isso a Lála sempre se encanta com a quantidade de gatos abandonados na rua. Ela quer brincar com eles de igual pra igual, cheirar-lhes a bunda e ver pra onde eles correm, mas nessas ocasiões eu faço o papel desagradável daquela que traz o maluco de volta à realidade:
- Deixa o gatinho pra lá, Lála. Ele é coitado, você não vê? Esta aí à deriva, sem sofá, nem pizza.
- Mas pelo menos ele está sem coleira, né? Pode correr livremente.
- Ah, é? Mas o pobre do gatinho também está sem babá. Ou você gostaria de estar sem babá num feriado prolongadíssimo como este? Ahn?
- Tudo bem, mas será que eu pelo menos posso cheirar a bunda daquele vermelhinho ali? Acho que aquele não vai correr de mim.
- OK, pode, mas depois vamos ter de escovar os dentes. Você conhece as regras.

quinta-feira, maio 22, 2008

Aqui se faz, aqui se Lála.


Hoje descobri um caroço no bracinho da Lála. Quando disse isto em voz alta para mim mesma, percebi que meu cérebro involui na presença de cães fofinhos e quetais: onde foram parar meu conhecimento técnico e todo aquele repertório fantástico de termos médicos? O que eu diria normalmente em vez de bracinho e caroço? Tenho certeza de que existem palavras melhores para definir isso, mas a Lála me faz esquecer de tudo, até das minhas herméticas convicções contrárias à humanização de animais. Eu não estou humanizando a Lála, ela já veio humanizada para mim! Só estou mantendo a coerência, juro.

Tentei há pouco assistir um vídeo do Cesar Millan, mexicano radicado nos Estados Unidos que ganha a vida criticando, em cadeia nacional, pessoas que tratam seus cães como filhos humanos (grifo meu, mas o Cesar me mataria). Eu e Lála tínhamos acabado de tomar café e ler jornal na cama, e toda vez que o Cesar dizia que cães se sentem mais felizes quando são tratados como caninos, eu olhava de banda pra Lála e dava graças aos céus por ela não entender o inglês. Parecia que eu a estava traindo com a opção por aquele DVD, mas depois eu lhe expliquei que toda regra tem uma exceção, e que ela, felizmente, era a exceção. Vamos tratar como cachorro o cachorro dos outros, e está muito bom assim.

Aí, carinho vai, carinho vem, passo a mão novamente no caroço. Meu Deus, que caroço é esse?!? Lála tem 8 anos, não é idade pra sair tendo caroço por aí (ou é?). Vou ligar pra veterinária dela (sim, eu sou apenas a babá):
- Lála tem um caroço no braço. Acho melhor fazer um check-up completo, estou com nervoso de palpar.
- Mas tá duro ou mole, aderido ou solto?
- Ai, não sei, tenho medo de ficar apertando. Melhor fazer uma tomografia, é menos invasivo que ficar apertando a coitadinha.

Tenho vergonha de dizer o que me respondeu a veterinária. Foi um banho de água fria tão grande, que eu me aprumei, cocei o saco e logo me pularam da boca palavras de cagação de goma técnica e até uma (forte) possibilidade diagnóstica: lipoma. Tudo bem, lipoma, lipoma não fede, nem cheira. Agora eu e a Lála podemos esquecer essa idéia estapafúrdia de coleta de sangue e check-up, pelo menos por enquanto. Por via das dúvidas, vou parar de alisar muito a menina, porque com toda a minha hipocondria, vou acabar achando chifre em cabeça de burro. E nós já combinamos, cá entre eu e a mocinha, que na sua presença eu sou apenas uma escrava humana muito obediente, e ela minha dona benevolente.

PS: eu perdôo meus pais por fazerem churrasco sem sal e outras receitas pros nossos peludos e depois ainda me perguntarem, na maior cara de pau, por que eles têm tártaro. Perdão válido somente pelos próximos 5 dias, favor não insistir.

terça-feira, maio 20, 2008

Profissão: babá de poodle

Eu, que sempre temi-mais-do-que-tudo, mais do que o bicho papão, mais do que estupro de carona no campus e mais do que saidinha de banco em dia de pagamento me transformar numa tratadora de poodle-de-madame após tudo o que o povo brasileiro investiu em minha educação, nunca, jamais pensei que um dia fosse dizer com a boca transbordante de saliva que sou, sim, babá de poodle, and very proud of it.

Escrevo essas már-traçadas enlevada pelo vinho, sim, mas antes de tudo, enlevada pela Lála, a poodle que mudou meu conceito de poodle e quetais e, por que não dizer?, minha vida! Ela chegou ainda há pouco para passar mais um feriado prolongado comigo. Pelo menos pra alguma coisa servem essas bostas de feriados religiosos que ninguém entende, aleluia irmão!

Ela chegou toda de branco, toda molhada e despenteada, que maravilha, que coisa linda que é a Lála. Depois de subir em todas as camas só pra verificar se ainda estavam razoavelmente confortáveis e limpinhas, Lála sentou-se à mesa conosco e comeu nossa focaccia. Na verdade, não era pra ela jantar nossa comida nem beber do nosso vinho, mas as coisas simplesmente acontecem com a Lála, que é totalmente demais, linda como neném, só vai na boa e só se dá bem. Ela nos distraiu com um ruído na área de serviço e, quando olhamos, o canino tinha uma focaccia de seu tamanho na boca: uma cena linda! Diante do inusitado (afinal, imaginamos inocentemente que o cão comeria sua comida de cão, e não a nossa), negociei com ela 3/4 daquele pão pros humanos e fui dando seu quarto de direito, ora com queijo de cabra, ora com um fio de azeite extra-virgem (pra agregar valor ao quinhão subfaturado) de quando em quando pra que ela não se entediasse do jantar, que em minha casa costuma durar uma hora e meia.

Agora que ela dorme de barriguinha cheia, começo a relembrar do curto diálogo que tive com seu dono quando ele a deixou em minha portaria há pouco:
- MEU DEUS, MAS A LÁLA ESTÁ ENORME DE GORDA!!!
- Não, Vanessa, é o pêlo que cresceu. Ela só está mais peluda.
- Fale a verdade: quantos pacotes de Doguitos vocês estão dando pra ela por dia, ahn?
- Juro que é só o pêlo. Ela tomou banho hoje e eu vi: debaixo desse pêlo todo, é um esqueletinho.
- Mas ela está com queixo duplo e pneus nas laterais, um esqueleto não costuma ter esses acessórios.
- Ah, Vanessa, então tenta passar um dia sem dar Doguitos pra ela. Daqui a uma semana te pergunto.

Enquanto o tubo digestivo da menina processa todo o pão, azeite, queijo e vinho que comeu-comemos, começo e entender o que o dono da Lála, um triatleta preocupadíssimo com a saúde e a forma física ele mesmo, estava tentando me dizer: ela não está gorda, só é mesmo peluda. Um problema comum a todos os poodles e cachorrinhos fofos em geral. Eu, que afinal de contas sou veterinária, devia saber muito bem disso e de outros fatos caninos da vida.

segunda-feira, maio 19, 2008

Um dos vídeos mais blogados do mundo

domingo, maio 18, 2008

Anarquista, graças à Zélia

E antes que me chamem de anarquista, palavra que só passou a existir de fato depois do livro da menina Gattai, aquela que disse ao pai que quando a força e a razão contrastam, vence a força e a razão não basta, e que ontem dormiu pra sempre, tenho a dizer que sim, graças a Deus, sou fã e leitora dessa mulher que nos deixou ontem. E talvez por isso eu esteja tão transtornada.

Derradeiro post antes (ou talvez durante) o inferno astral

Vem aí mais um feriado infernal católico pra atravancar minha vida e a de milhões de pessoas proativas que padecem com esses malditos feriados sem-sentido, que as obrigam a transformar 5 dias em 3, o que naturalmente implica na exclusão de duas noites de sono, mas só o sono das pessoas que realmente trabalham e, portanto, odeiam feriados sem sentido, independente de raça, credo ou orientação sexual.

E antes que o maldito feriado acabe de uma vez por todas com o que me resta de humor, e olha que é cousa pouca, vou escrever um post malcriado, malhumorado e, por que não não dizer?, excomungado pela Igreja Católica, criadora de nove em cada dez feriados sem-sentido no Brasil e no resto do mundo ocidental.

Nunca achei que um feriado pudesse ser objeto do meu desamor, mas eis que de repente percebo que num país de maioria macumbeira (sim, católico que tem medo de macumba, macumbeiro é), ainda somos reféns dos feriados católicos que ninguém sabe pra que servem.

Quando um legislador propõe que um determinado dia seja decretado feriado para que os fiéis façam não sei o quê, não sei aonde, ele imagina que seus eleitores hão de gastar o tal dia santo em atividades de louvação ao quê-de-santo se celebre naquele dia, MAS QUEM DISSE QUE ISTO ACONTECE?!? Hã?! Ou alguém aqui sabe pra que diabos serve essa porcaria de Corpus Christi além de um pretexto pra esticar em Buzios?

Feriados religiosos são um atraso na vida da gente. Tudo bem neguinho ter uma religião e levar a ferro e fogo aqueles dogmas todos, mas eu não tenho nada a ver com isso, a economia do país não tem nada a ver com isso, então cada qual com seu probleminha. Os judeus fecham a loja em dia de Yom Kipur e eu nunca vi o Aterro ser fechado por isso. Por que, então, cada um não cuida da sua coisa e deixa os outros em paz? Cada pessoa deve arcar com os custos de seu próprio credo, essa conta não deve ser distribuída pro resto do país. Eu, que optei por não ter credo algum pra não ter de pagar dízimo nem porra alguma por isso, me sinto prejudicada.

Afinal, nos próximos 4 dias, dormirei 2 noites a menos. E não há 30 dias de férias por ano que consigam compensar isso. Não sei se odeio a Igreja Católica por tudo que ela fez para estar entranhada no Governo até hoje ou se odeio o Governo por ser babaca, e pronto.

sexta-feira, maio 16, 2008

Na boca do povo

A dureza tem lá suas vantagens: andar de ônibus e ouvir a conversa de pessoas com quem você provavelmente nunca teria a chance de conviver é uma delas. Por apenas dois reais e dez centavos, qualquer cidadão com a audição perfeita (e sem um iPod implantado profundamente nos tímpanos) pode saber o que o povo anda dizendo nas ruas. Ontem eu descobri o que o leitor do Extra pensa do veto ao cigarro nos fumódromos e áreas reservadas a fumantes em bares e restaurantes do Rio de Janeiro, mas antes preciso dar a minha opinião, que eu sou uma pessoa muito cheia de opinião e às vezes a opinião é tanta que eu fico sufocada, como agora!

Pra começar, confesso que achei confusa, pra não dizer divertidamente maquiavélica, a forma como o governo planejou a extinção do tabagismo. Devem ter pensado assim: vamos eliminar os fumantes devagarinho pra não dar muito na pinta. Seguindo esse planejamento malévolo, primeiro criaram a lei que separa conceitualmente fumantes de não fumantes, sobretudo em ambientes coletivos. Esta, diga-se de passagem, foi uma iniciativa inócua, pois, na prática, a área de um em nada difere da área de outro, a começar pela atmosfera carregada de fumaças rebeldes que não respeitam plaquinhas. Antes dessa lei, deveriam ter sancionado outra pra obrigar as fumaças de cigarros, charutos e cigarrilhas a freqüentarem a classe de alfabetização: só então elas saberiam se comportar, evitando as áreas onde se lê "proibido fumar". Pra uma coisa, pelo menos, essa besteira serviu: pra chamar a atenção da sociedade pro fato de que fumantes são elementos nocivos à Saúde Pública e os não-fumantes, coitadinhos, suas vítimas. Antes que me trucidem, preciso esclarecer: isto não foi idéia minha, e sim dos legisladores. Espalharam cartazes com fotos de garçons e mensagens sobre a relação câncer X fumo passivo . Ou seja: o fumante é tão mau, mas tão mau, que é capaz de matar de câncer até o seu garçom preferido! O macarthismo não é necessariamente ruim se conseguir abrir um bom debate e, neste caso, abriu. O não-fumante saiu do armário e o fumante ficou mais ciente de que seu prazer pode muitas vezes significar o desprazer ou até a desgraça do outro.

Depois, quando os bares e restaurantes já estavam acomodados com seus fumódromos subjetivos, vem o governo, proibe o fumo e ponto. Não pode fumar em bar, restaurante, universidade, trabalho, shopping, fumódromo, enfim, não pode fumar e pronto. Quer fumar, meu amigo? Vai pra casa! Quer fumar fora de casa? Vai pro meio da rua ou pra calçada, mas desde que o senhor fique longe o bastante das portas que delimitam ambientes coletivos fechados, pois se ficar perto, a-ha!, o dono do estabelecimento tem de chamar a polícia pra lhe enquadrar, senão ele mesmo paga multa de R$2000. Reincidiu? Pague o dobro! Enfim, se a lei pegar, vai ser uma raridade ver uma pessoa fumando por aí porque a nova lei municipal, que entra em vigor em junho, deixa o fumante sem lugar. O cara que ousar fumar na rua vai ter de estar de tênis pra correr da horda enfurecida.

A nova lei parece dura, e realmente é. Mas já não era sem tempo! Esqueçam temporariamente o peso do tabagismo nas contas do SUS (e também nas mensalidades dos planos privados de saúde), pensem só nos conceitos básicos de civilidade: se peidar fosse um vício e eu fosse viciada, confesso que teria vergonha de peidar seguidamente em ambientes coletivos, afinal o cheiro é desagradável e incomoda os outros. Infelizmente, os fumantes não pensam em seus cigarros como um tipo de peido, e acham tudo bem expôr os outros aos seus fedores e gases tóxicos. Tão tóxicos que causam aborto e todas aquelas coisas medonhas que publicam em embalagens de cigarro. Nada contra o fumante, sou louca por um sem número deles e até sorvo seus fumacês bem caladinha e resignadamente em prol da boa conversa, mas é claro que eu preferiria respirar só a poluição atmosférica que me compete, e olha que não é coisa pouca.

Aí, voltando pro meu 572, ouço o trocador dizer pro motorista: "Cê vê: o César Maia, agora que vai sair, depois de ter mamado nas tetas do Rio desde 92, resolveu sacanear todo mundo. Primeiro proibiu os caminhões na cidade: agora, pra fazer entrega, neguinho tem de se virar fora do expediente. Depois ele pega e faz essa lei aí, a tal que proibe o fumo em tudo quanto é lugar. Sacaneou os bares e restaurantes. Ele vai sair mesmo, meu amigo, então não quer nem saber. A gente é que se dane!"

Fiquei curiosíssima pra saber se ele era motorista de caminhão nas horas vagas ou se tinha algum bar ou restaurante freqüentado por muitos fumantes. Talvez ele alternasse os turnos de trocador com o de garçom num bar onde as melhores gorjetas costumam vir das mesas com cinzeiro. Tive muita vontade de debater, de perguntar o que mais, de entender como ele tinha uma opinião tão incisiva e tão absolutamente diferente da minha, mas logo ele escondeu a cara com um jornal que tinha uma bunda enorme de mulher estampada na capa. Então eu encerrei o caso por excesso de provas.

terça-feira, maio 13, 2008

I Love the World

Comercial gracinha do Discovery Channel. Tô chorando até agora.

Cheiro bom de cachorro molhado

No interminável capítulo da ode de amor eterno ao trabalho, sobretudo agora que eu sou uma criatura vaca-leviana-free, preciso contar uma coisa muito importante pra vocês: esta semana, começou o curso de banho e tosa lá no Instituto de Veterinária da Mangueira. Tenho andado bem feliz e ocupada por conta disso, esse pra mim é um sonho que se tornou realidade!

Trata-se de um curso profissionalizante que une o útil ao agradável: ao mesmo tempo em que ensina a pessoas de qualquer classe sócio-econômica um ofício que encontra alta demanda no mercado pet (um dos que mais cresce no Brasil), também serve para lavar e tosar os peludos do canil coletivo do IJV, que agora não só estarão disponíveis à adoção, como também ficarão sempre limpos e gostosos. Até agora, os caras do canil gostaram muito desse papo brabo de banho, sobretudo porque os alunos curtem acarinhar orelhas fofuchas e têm sempre os bolsos repletos de biscrok e doguitos, finas iguarias que fariam qualquer um até gostar de água.

O curso de banho e tosa tem dois módulos - básico e avançado - de 36h, e é completamente gratuito para o aluno. Da mesma forma que é completamente 0800, é quase completamente impossível conseguir uma vaga nele, posto que há apenas 8 alunos por turma - não dá pra misturar coisas que cortam e queimam com animais inocentes e um número excessivo de pessoas inexperientes -, e duas turmas por bimestre. A relação candidato vaga beira os 120. Algumas pessoas que nunca tinham falado comigo antes vieram me pedir uma "ajudinha" na matrícula, e a eles eu recomendei, com meu ar mais blasé, uma barraca tipo iglu ou uma rede confortável para acampar na fila desde a semana anterior ao primeiro dia de inscrição, pois as vagas acabam logo nos primeiros 45 minutos. A próxima matrícula, aliás, é no dia 23/06/08. Não quero desanimar ninguém, mas eu já dei essa informação a cerca de 1345 pessoas até as 17h de hoje.

Sim, podem tirar o cavalinho da chuva os fofos e fofas que gostariam de fazer o curso só porque é de graça e porque gastam uma fortuna com a tosa do Shi-Tsu, pois ser um dos oito agraciados é quase como passar no vestibular de medicina da USP, com a diferença de que você não precisa estudar nadica, não precisa nem saber ler e escrever, só precisa morar no Rio de Janeiro e ter mais de 16 anos*. E mais só digo quando me aposentar, e se! Até lá, vou lavar muito cachorro com água morna e xampu neutro, e não vou arrematar com perfume ou lacinho, que ninguém merece passar vexame só porque é de graça.

PS importante: ninguém aqui passa perfume no cachorro ou gato para eliminar sua identidade e o tornar ridículo ao seu semelhante, né?

* É só uma coincidência, gente, môdade!...

A Natureza se empenha.


A Natureza se empenha.
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O asfalto não tem nem duas semanas e a grama já conseguiu seu lugar ao sol. Meu trabalho me inspira.

domingo, maio 11, 2008

Povo Brasileiro


Povo Brasileiro
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E depois, mais peludoterapia.

Princesa Radija.

Na mesa da vovó...


Na mesa da vovó...
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... Junkie e saudável se misturam (e tudo é zero ponto).

Flores do jardim da vovó


Flores do jardim da vovó
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Feliz dia das mães!


Feliz dia das mães!
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Peludoterapia aqui começa cedo.

quarta-feira, maio 07, 2008

Tempo, tempo, tempo, tempo.

Estou com um horário novo ou pelo menos eu estou tentando me enganar com um horário novo: de segunda a quarta, vou trabalhar que nem uma condenada e não ter tempo pra nada para, de quinta a sexta, não precisar trabalhar como uma moura torta, e aí ter tempo pra tudo.

Amanhã é quinta e eu já estou morta. Nem terei condições físicas para aproveitar essa grande brecha que eu criei no meu tempo, porque, para ter tempo na quinta e na sexta, eu marquei tudo que eu considero (how can I put this?) não-essencial à dignidade humana, como conhecer a nova série de musculação, sessão de acupuntura e aula de culinária, justamente na quinta e na sexta. Ou seja, amanhã tá flórida, sexta tá flórida, maio tá flórida, 2008 tá-que-tá! e, possivelmente, eu talvez só tenha tempo pra tudo-que-sonho-e-quero-fazer quando eu me aposentar, em 2025. Mas isto só se pararem de escrever livro, fazer filme e montar peça de teatro, porque não dá pra acompanhar, gente, não dá!

Vocês também notaram que estão cortando dois minutos do dia, mês a mês, e já faz tempo? Daqui a pouco o dia terá só 18 horas e aí, como é que a gente-sem-tempo fica? E com quem a gente reclama, heim?

PS mega importante: e porque eu falei em moura, e de moura pra mouro e de mouro pra mauro se vai num segundo, e porque tempo é dinheiro, e já que eu perdi meu tempo pra vir aqui reclamar dessa irremediável falta justo dele!, aproveito o ensejo pra dizer FELIZ ANIVERSÁRIO, MAURO LE FRANÇOIS! Não esqueci, não liguei pra dizer que pensei em você o domingo inteiro e eu tenho certeza absoluta de que vou pro inferno por isso. De gente que deixa passar o aniversário dos amigos, o inferno está cheio!

domingo, maio 04, 2008

It's not a motorcycle, baby.


It's not a motorcycle, baby.
Originally uploaded by Van-Or

sábado, maio 03, 2008

Vem marchar comigo!

Atenção, chapeize: amanhã tem Marcha!

A Grande Marcha acontecerá no Arpex, às 14h. Onde, exatamente, eu não sei, mas quem chegar por lá em torno de 13h50 verá um monte de gente empunhando cartazes, vestindo as cores da Jamaica e portando camisetas com o desenho de um cactus (ou algo assim). Não deve ser difícil identificar, até porque o Arpoador é pequeno. Nunca ouvi falar de alguém que tenha se perdido no Arpoador, mas em todo caso, não custa nada lembrar: NÃO PODE FUMAR CACTUS DURANTE A MARCHA, OK?

Quem tiver vergonha ou medinho de ser preso por fazer apologia às drogas (hermenêutica no rabo dos outros é refresco), pode entrar no site da Marcha, fazer o download de uma das máscaras -- a oferta vai de Marcelo Antony a Scooby Doo, passando, lógico, por Bob Marley e Gabeira --, imprimir, se mascarar e participar completamente incógnito.

Em tempo: o Gabeira acha que a máscara com seu rosto, nesta marcha especificamente, pode prejudicar sua imagem. Então, tá. F*da-se.

Contos Claustrofóbicos para a Hanna, parte IV

Para a retenção de Pedro

Ontem era dia de pegar o kit da corrida de domingo. Uma das melhores coisas da corrida de rua é essa aflição que a gente tem de pegar logo o kit, ver de que cor é a camiseta, que número inventaram pra nos definir e que brindes - lógico, os brindes! - vieram dessa vez. Eu sinto uma alegria tremenda na hora de abrir o kit, por isso dei nó em pingo d'água pra pegar o meu logo no primeiro dia, e não no segundo e último, porque nunca se sabe se os melhores brindes serão distribuídos só nos primeiros 200 kits, restando aos outros 2500 participantes uma edição de três anos atrás da O2 e um folheto promocional de algo que nenhuma mente sã compraria com o próprio dinheiro suadinho de guerra.

Chego na banca de distribuição, que alegria, apresento o boleto de pagamento e minha identidade, a mocinha busca meu nome numa lista, tudo parece muito bem organizado, olha meu nome ali!, beleza, agora é só pegar o kit e ir embora. Eu disse ir embora? Bem, eu não podia ir embora porque a mocinha queria ficar com meu boleto tatuado com a autenticação bancária, e tudo seria lindo se este pagamento fosse apenas daquela corrida, mas porque eu tenho amor às árvores e economizo papel de impressora e xerox à vera, paguei duas corridas (a de domingo e a meia-maratona de junho) num só boleto. Ela não acreditou, e eu perguntei:
- Quanto foi a inscrição dessa corrida?
- R$50.
- Que valor você vê aqui no meu boleto?
- R$ 113.

Aí eu mostrei no palmtop o recibo em pdf que discriminava as compras, puxei a calculadora do celular (senão a mocinha se perdia) e somei todos os itens pra provar que o recibo correspondia àquele boleto (mesmo valor, está vendo?), e a mocinha ficou tão aflita com tanta informação que, não teve jeito, ela teve de chamar o Pedro!

O Pedro deve ser o chefe daquela bosta, e aí eu expliquei tudo de novo, tomando todo o cuidado pra não me aborrecer: apresentei minha identidade, mostrei minha cara, perguntei se ele tinha dúvidas de que eu era eu mesma, mostrei no palmtop o comprovante de compras (das duas corridas, com seus respectivos valores), mostrei o boleto bancário original que pagava as duas corridas e implorei, forçando uma barra pro Pedro se achar:
- Pois, é, Pedro. Agora imagina se -- apesar de estar super comprovado que eu sou eu, e que eu paguei a inscrição desta corrida --, eu deixo este boleto aqui e lá na frente, em junho, uma pessoa menos esperta que a gente me pede esse boleto? E aí se eu não tenho nada, nem uma autenticaçãozinha bancária pra provar que eu paguei?, muito embora eu não precise provar coisa alguma, porque essa pessoa fictícia estará diante de uma lista exatamente como esta, na qual meu nome jamais estaria se eu não tivesse, efetivamente, pago a taxa de inscrição.
- É, eu sei que você pagou, mas eu preciso ficar com o comprovante.
- Mas Pedro, por quê? Não está provado que eu sou eu, que eu-e-somente-eu retirarei o kit, e que isto só ocorrerá porque a taxa de inscrição está paga HÁ 2 MESES, e não há mais dúvidas sobre isso?
- Entendo... Mas e se outra pessoa vier aqui e pegar outro kit em seu nome?
- Pedro, olha minha identidade, olha minha assinatura. Eu assino meu nome na lista, que tal?
- Não dá, a gente não pediu pra ninguém assinar. A regra é reter.

Meu sangue dava sinais de fervura dentro das veias, e eu tinha me prometido que a retirada do kit seria só alegria. Pensei em desistir, estava tudo muito difícil, eu não nasci pra esse tipo de confronto, não me sinto preparada pra isso. Da corrida de domingo eu poderia até prescindir porque trata-se de uma reles corridinha fajuta de 5km, mas a de junho é uma meia maratona, pô! E eu paguei por elas, eu tenho o direito de corrê-las. Vai que em junho eu encontro um pedro no meu caminho! Ah, não podia correr esse risco. Tentei de novo, desta vez uma abordagem mais chantagista:

- Se eu deixar meu comprovante aqui, tenho grandes chances de não conseguir correr a meia em junho. E eu tenho asma, correr 21km significa muito pra mim. Nós não queremos que eu perca essa chance, queremos?
- Entendo... Mas eu vou precisar reter alguma coisa aqui. Não posso entregar seu kit sem reter alguma coisa aqui.

Ele falou aquilo com a mesma ausência das criaturas que falam: "eu estarei transferindo sua ligação", então a frase, naturalmente, perfurou meus ouvidos assim: "eu estarei precisando estar retendo alguma coisa aqui, nem que seja um cocôzinho seu". Senti falta de ar e muita, mas muita vontade mesmo de sentar a mão no Pedro. Mas eu tinha prometido a mim mesma que não me aborreceria - é só uma corrida de 5 km, porra! -, então virei as costas e fui dar uma volta no quarteirão. Um brigadeiro, um mini-cookie e um capuccino grande depois, retorno ao local do crime armada: fiz uma xerox do comprovante de pagamento (num valor bem maior que o da corrida do Pedro) + um comprovante de residência + a minha identidade. Na loja de cópias, peguei emprestado um daqueles pilots atômicos de escrever cartaz de promoção em supermercado e escrevi no topo da folha: PARA A RETENÇÃO DE PEDRO.

Agora ele não só pode reter alguma coisa minha, como também pode enfiar no c* e rasgar. Mas isso eu deixei nas entrelinhas, tomara que ele saiba ler.

quinta-feira, maio 01, 2008

As cagarras de longe


As cagarras de longe
Originally uploaded by Van-Or

Eu ando muito ligada nelas.

Contos Claustrofóbicos para a Hanna, parte III

Insight neo-zen-burguês

De repente ele percebeu que só uma única coisa o afastava de toda a felicidade possível, do universo em expansão e da liberdade: sua própria mente. Pudesse ele se livrar de todos os pensamentos e aflições, nunca lhe faltaria espaço para sorrir, respirar e apreciar o momento, o aqui & agora, a vida, enfim.

Mas porque não tinha tempo para aprender a meditar, respirar ou viver, mandou a secretária ao Tibet pra uma imersão em meditação I, II, III e IV, pediu-lhe que mandasse relatórios por e-mail duas vezes por dia e ficou bem feliz de poder pagar por sua evolução espiritual em 10 vezes sem juros. Próximo passo seria se matricular (e não ir) no Nirvana pra (não) freqüentar aulas de yoga, tai chi chuan e bioginástica.

(a pior prisão é aquela na qual a gente deliberadamente se tranca)

Contos Claustrofóbicos para a Hanna, parte II

Telefone

Tinha de estar na porta do Canecão em vinte minutos, mas o Caco ainda não tinha ligado e ela precisava tomar banho. O telefone sem fio não estava funcionando, e aquele pão-duro do Caco, porque usava orelhão, nunca ligava pro seu celular, então resolveu tomar banho de porta aberta, já que tinha certeza que ele ligaria na hora exata do xampu, como sempre.

Pois era a hora exata do xampu, e o telefone tocou. Caraca, ela bem que sabia! Fechou o chuveiro, encharcou o corredor até a sala e não era o Caco, era a Marcinha querendo saber do Caco. Pediu pra amiga ficar tentando falar com ele, que faltavam só 17 min pro show e ela ainda estava tomando banho, e tudo ficou ainda mais angustiante quando a Marcinha disse que já estava na porta com o Paulo, a Tati, o Pedro, o Marlan, o Guto e aquela namorada escrota dele, a Blergueth, hahaha, e que eles iam comprar ingresso na mão de cambista mesmo, porque o Canecão estava lo-ta-do, aquilo ali estava uma lou-cu-ra, você não tem no-ção, e a mulher não pa-ra-va de falar, e agora faltavam só 15 minutos, caraca!, o Caco provavelmente estava ligando pra ela naquele exato momento, beijo, beijo, tchau, deixa o celular no vibra, te ligo já, ok! Ufa. Abre chuveiro, enxagüa xampu, telefone toca, chuveiro fecha, ela nada crawl na poça entre o banheiro e o telefone, atende e ainda tem tempo de ouvir o Caco dizendo: Ih, acho que ela já saiu... Não, não, Caco! Caco, eu não saí nada, alô-alô, m'escuta!, eu tô aqui, me ouve! E o telefone: pu, pu, pu, pu, pu...

Se aqui no Brasil tivesse aquele serviço de ligar pro último número que te discou, ótimo, mas ela nada tinha a fazer além de ficar ali pasma, olhando pro telefone, sua derradeira esperança de conseguir ingressos pra única apresentação do Gotan Project na cidade. Agora tinha só 10 minutos pra terminar o banho e estar linda e loura na frente da casa de espetáculos, conforme combinado, mas só entre idas e vindas do telefone ao chuveiro gastou 3 minutos; numa dessas, escorregou, caiu de banda e ganhou um hematoma do tamanho duma coxa; movida por um acesso de ira, arrancou o telefone fixo da tomada, enfiou na privada e deu descarga (mas não desceu); depois perdeu mais 3 minutos tentando falar com o celular de pessoas que talvez, porventura, quem sabe?, poderiam estar ao lado do Caco naquele momento crítico, mas nada. Sentiu um ódio inacreditável de seu amigo mais querido por ele ser diferente e não ter celular numa hora dessas (era horrível querer falar com alguém e não poder), desligou o seu (porque essa bosta não serve pra nada mesmo), ligou a televisão, lembrou que não tinha passado creme rinse, chorou convulsivamente ao analisar o tamanho do hematoma ovalóide coxal e dormiu assistindo A Grande Família. Derrota total.

Por uns instantes, e porque definitivamente não era um ser humano melhor que ninguém, desejou morte horrível ao Gotan Project e seus agentes, que tiveram essa idéia de jerico de fazer uma única apresentação da banda logo no Rio de Janeiro, cidade tão vizinha de Buenos Aires, portanto tão fã de tango ou gotan, que seja. Não dá, gente, não dá: isso é uma falta de respeito!

***

Do outro lado da rua, sob o céu estrelado de uma linda noite de verão, Caco terminava sua latinha de Skol conversando animadamente com o Guto, a Tati, o Marlon, etc. Nenhum deles tinha conseguido ingresso pro show, então eles iam dar um tempo ali esperando a Tita atravessar a rua para pegarem uma outra bocada na Lapa. Pelas contas da Marcinha, que tinha ligado quando a moça estava no banho, ela pintaria por ali em pouquíssimos minutos. Então tá. Desce mais uma cerva aí, fazer o quê.

Contos Claustrofóbicos para a Hanna

Dia desses, lendo os comentários num post sobre maconha que veio parar aqui neste blog (e eu não sei como), me deparo com essa coisa gracinha escrita pela minha irmã caçula geral, a Hanna:

van, eu estou fazendo teatro na CAL, comecei esse ano, tá tudo maravilhoso!
a peça de julho vai ser em relação à claustrofobia, ou seja, o fato principal da peça ocorrerá em um local não necessariamente fechado, porém pequeno. a minha turma tem uma comuna no orkut e a prof pede pra escrever textos lá.
porque a partir destes textos teremos alguma idéia para a peça. pode ser pequeno mesmo;
sempre que eu ligo para aí cai na secretária eletrônica.
eu estou sem criatividade e minha sister escreve bem pra caramba!
help me, please!
eu estava desesperada até minha papai me lembrar que vc escreve peças.
vc vem jantar aqui um dia desses né?
te amo, saudades, vem logo!


Diante de um pedido tão fofolete desses, só me resta sair escrevendo. Segue aqui o primeiro.

O CORPO HUMANO
(com licença poética aos anatomo-fisiologistas de plantão)

Difícil definir o que era aquilo. Parecia uma convenção ou uma reunião de condomínio, mas os participantes eram órgãos - alguns mais vitais que outros - de um mentecapto acelerado que andava abusando do álcool y otras cositas nada legais. Os órgãos, revoltados, queriam escapar daquela condenação a qual estavam confinados; alguns tinham a esperança de ir parar num banco de transplantes, outros queriam discutir idéias pra resolver tudo ali dentro mesmo, sem sacrificar, importar ou exportar coisa alguma. O cérebro, claro, presidia a agitada assembléia e tinha toda hora de bater com o martelinho na mesa (coisa que dá uma dor de cabeça aguda, assim, bem aqui no alto da têmpora esquerda) para pedir silêncio aos excelentíssimos senhores órgãos revoltados.

- Eu quero sair daqui!, gritava o Fígado. Tanta gente precisando de fígado, e eu aqui preso neste corpo mal preservado em álcool. Olha aqui meus hepatócitos como estão histéricos e pré-cirróticos! Daqui a pouco eu não sirvo nem pra foie gras!
- Seu pedido não faz sentido, Fígado, porque se está ruim contigo, imagina sentigo. O máximo que eu posso te dar é uma licença de 2 minutos pra visitar o hemisfério esquerdo, mas ó: tem que voltar pelo mesmo caminho, senão o nó nas tripas poderá ser fatal.
- Mas eu preciso respirar!!! Preciso de ar puro, preciso de oxigênio! Estou ficando preto da vida com toda a fumaça tóxica que esse maluco faz circular pelo meu fino trato.

Era fácil identificar o Pulmão falando porque ele tossia muito. Dava até pena do bichinho! Um pulmão normal, se você parar pra pensar, já é feio; aquele, então, todo bichadinho, pintado e murcho, parecia um filhote de cruz-credo. O Cérebro, que não é dessas coisas de sentimento (ele deixava essas viadagens pro coração), se apiedou:
- OK, Pulmão, vamos combinar o seguinte: eu te deixo dar uma volta lá fora, mas sob a seguinte condição: vai só o pulmão esquerdo, e só porque ele está com...
- Gripe!, se adiantou o Coração, fuzilando o Cérebro com o olhar. O síndico realmente não tinha um traço de tato, e qualquer neurônio desmielinizado sabe que más notícias têm de vir aos poucos. Aquele não era o momento de se revelar pra galera a presença da massa neoplásica altamente indiferenciada no pulmão esquerdo. Afinal, a maioria estava naquela reunião em busca de soluções para viver melhor, e os órgãos não podiam ser derrotados pelo medo da metástase.
- Sim, só vai o esquerdo, que está gripado (o Cérebro captava as coisas rapidamente), aí ele vai, pá, dá umas voltas, se anima e retorna com a imunidade reforçada.

O Rim, que era muito baixinho, ficou tão inflamado de raiva que não teve jeito de ignorá-lo. Tudo naquele corpo começou a doer, era uma dor louca (pior que dor de parto) que fazia o sangue ferver. O Cérebro, então, deixou o Rim falar na frente do Grosso e da Bexiga, que estava super apertada. O Rim alegava que também trabalhava em dupla e que sempre foi mais eficiente que o Pulmão na compensação da falta do colega, então logicamente (palavra que o Cérebro adorava), quem deveria obter a licença pra sair daquele confinamento forçado era ele. Hum. Aí ficou difícil decidir. Rim tinha razão: talvez um corpo humano se vire melhor só com um dos rins que sem um lado do pulmão. Por outro lado, ele podia ser malandro, deixar o pulmão esquerdo sair e depois o impedir de voltar com seu tumor maligno, o que poderia dar esperança e uma sobrevida maior pros outros órgãos; contudo, deixar o pobrezinho do lado de fora assim, tossindo, implorando pra voltar e morrendo à míngua não era nada bonito. E o Rim lá, chato pacas, insistindo pra sair. E o dono do corpo lá, burro pacas, tomando uma substância entorpecente qualquer que começou a chapar o Cérebro.

Todos foram se aquietando... o Fígado ficou totalmente concentrado... os órgãos começaram a adormecer empilhadinhos, uns por cima dos outros e o Coração sentiu pena, mas a reunião se encerrou por motivos de força maior.