Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

sábado, setembro 30, 2006

Gatos do Flamengo


Gatos do Flamengo
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Tá cheio de gato aqui.

sexta-feira, setembro 29, 2006

Medo

Sei que está cedo pr'eu me gabar, mas há seis dias eu venho utilizando minha bicicleta magenta como um digníssimo meio de transporte: digno porque não polui, não tem impostos a pagar, permite estacionamento fácil e é 100% flanelinha-free.

Em parte, devo minhas pedaladas ao laboroso processo de auto-cura daquela classe-mediíte diagnosticada por minha joelhaçoterapeuta; como estou tentando me convencer de que eu sou pobre -- e pobre não tem de onde tirar, esquece! --, me peguei calculando quanto eu economizaria por mês se fosse daqui ao Flamengo de bike (e não de ônibus).

Por outro lado, tenho pedalado porque tenho verdadeiro pavor de pedalar na rua e ser atropelada, sofrer fratura exposta e acabar morrendo com as tripas espalhadas pelo asfalto, sob algum coletivo cheio de passageiros apressados, na contra-mão, atrapalhando o tráfego. Pode parecer meio paradoxal e auto-ajuda total, mas foi justamente por ter tanto medo de pedalar na cidade, no meio dos carros, que eu achei que esta seria uma boa oportunidade d'eu enfrentar algum medo, alguma vez na vida. É que eu passei a minha evitando tudo o que me assusta, e agora estou de saco cheio disso. Quero o lado bom do medo, o lado que enfrenta e vence, e não o que fica e não faz e, porque não faz, não vive.

É claro que eu não tenho esse medo de ser atropelada de bicicleta à toa. Eu tenho um trauma de infância, daquele bonitos e difusos, repleto de fragmentos sem sentido. Eu, aos sete anos, em Brasília, indo de bike de rodinha pro Parque Rogério Piton... meus pais e irmãos na frente, eu pra trás, cada vez mais, tanto que atravessei a rua pra cortar caminho. Foi aí que um carro passou raspando por mim, e o motorista, fulo da vida, ainda teve a desfaçatez de gritar nos meus ouvidos: "QUER MORRER, SUA MALUUUUCA?!?!?!" Não me lembro se minha mãe ouviu, se chorei, se contei pro meu pai ou se levantei meu dedo médio pro motorista. Só sei que criei um medo de morrer, sua maluca, que nem te conto. Medo de morrer andando de bicicleta no meio da rua, ao lado dos carros.

Hoje, voltando pra casa de bike em meio aos carros que disputavam milímetros no tráfego pesado das noites de sexta, eu tentava tranquilizar meu pobre coração a mil por hora, repetindo o seguinte mantra: não vai morrer, não vai morrer, não vai morrer.

E não morri.

Mas se eu morrer pedalando um dia, por favor escrevam em minha lápide:

"Morreu enfrentando seus piores medos.

E foi dramática até o final."


PS: chamei a Gabi pro Fla x Flu no Maraca, na quarta que vem. Quero ir com um colega de trabalho, que faz parte de torcida organizada, toca pandeiro, empunha bandeira de 20 metros e o escambau. Ela disse que tinha medo. Acontece que a Gabi é uma das pessoas mais raçudas que eu conheço, então, se essa moça não for comigo na Raça, vou começar a achar que a palavra dela é medo. (f*deu, desafiei!)

quinta-feira, setembro 28, 2006

Felicidade é uma cidade pequenina

Hoje acordei antes das 6h, e sem despertador! Pode parecer uma besteira, mas eu fiquei super eufórica com isso, porque levantar cedo e de bom humor, pra mim, é um indício palpável de que minha vida está voltando ao normal. EU SOU NORMAL!

Aí eu vim pra academia de marombática tentando pensar em alguma outra coisa concreta pra me manter assim, tão... [bem, eu não queria usar essa palavra porque tenho uma certa mêda dela, mas vá lá]... feliz, pro resto do dia. Então fiz uma lista mental dos meus amigos e uma palavra que definisse porque amo cada um deles. Assim, pensei na Vivi (cumplicidade), no Tom (presença), no Lucas (orgulho), na Monica L (competência/sensibilidade), e por aí foi. Como é bom ter amigos! You're the best, guys.

Aliás, eu não consegui encontrar uma palavra apenas pra Monica L, porque esta semana, além de amiga, ela atuou como minha dentista. E resolveu um problema que eu provavelmente devia ter há mais de dez anos, e que tornava minha vida muito mais dífícil (era um defeito de oclusão que, resumindo muito, me dava uma puta dor de cabeça e sensação de tensão horrível, como a que um ministro da saúde deve ter se for decente, no fim do dia). Tenho andado tão emocionada com o alívio que o trabalho competente dela me deu, que me seguro pra não ligar de dez em dez minutos só pra dizer que o quanto a amo ainda mais por isso. OBRIGADA, MONICA L!!!

Acho que estou sob efeito de endorfinas pesadíssimas.

U-hu!

Carpe diem. Que o dia de vocês seja tão bom quanto o meu (ou pelo menos a metade do bom, porque eu tenho plena consciência de que tá bom demais, como diz o Tom.)

quarta-feira, setembro 27, 2006

Cemitério de grandes amigos


Cemitério de grandes amigos
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Luquitos, eu sempre choro. O melhor amigo do homem tinha que ter ao menos a mesma longevidade.

Cemitério de pequenos amigos


Cemitério de pequenos amigos
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PROCURA-SE UM CANDIDATO A DEPUTADO ESTADUAL

Eu sei que está super em cima, mas tenho cinco dias para escolher um deputado estadual e nunca achei tão difícil encontrar um que valesse meu voto. Muita gente me liga perguntando se há algum comprometido com a causa animal, mas eu, sinceramente, não conheço nenhum digno de confiança, e jamais indicaria alguém por esta plataforma. Pode parecer paradoxal porque eu amo bichos, mas "causa animal" não está exatamente na minha lista de prioridades políticas. Num país como o nosso, político que levanta essa bandeira é demagogo. Proteger os animais é importante, mas tem muita coisa urgente na frente, e sempre terá enquanto houver gente morrendo de bala perdida, de assalto em sinal, de falta de médico em hospital, de doença que tem prevenção e cura, de fome, de abandono, de ignorância, de desvio de verba, de falta de perspectivas, de prostituição infantil. Tenho certeza de que, se as pessoas forem cuidadas como devem, elas cuidarão bem de seus bichos. Proteção dos animais começa pela proteção ao dono do animal.

Se alguém tiver um candidato a estadual digno de voto, por favor registre aqui o nome, número e, last but never least, o porquê.

Curta metragem

Estou lendo um auto-ajuda para quem quer encontrar Deus através de um corpitcho seco, com no máximo 15% de gordura. No segundo parágrafo, percebi que da fruta que o autor come, eu chupo até o caroço: ele descreve com requintes de menina-moça a atração física que sentiu por um pescador negro e musculoso que habitava a aldeia dele. Era pra ser um livro sério, mas eu estou rindo horrores. E isso não será nada bom pro meu desenvolvimento atlético-espiritual. Afinal o cara é Cobra, uma "otoridade" em fitness e poder da mente.

[alterado]
***

Li numa revista especializada em gente como a gente que eu quero ser um dia (O2, a revista dos corredores) que cada quilo de músculo corporal humano ocupa o volume de uma bolinha de tênis, ao passo que nosso quilo de banha tem o volume duma bola de futebol. Dei uma espiada na minha última avaliação física e constatei, consternada: tenho 17 bolas de futebol de gordura espalhadas pelo corpo, sendo que pelo menos 12 delas entre bunda e barriga. E o foda-na-roupa é que eu nem gosto tanto assim de futebol.

***

No jantar, meu carrancudo pai falava sobre comida, e eu, sonolenta, disse: É verdade, um banquete. Banquete de Platão. E ele: Bah, Platão comia com as mãos, sentado no chão. E eu: Mas inventou o amor platônico. E ele: Grandes coisas, não serve pra nada! E eu: Serve sim: serve pra fazer poesia! E ele... bem, ele se calou.

***

Frase desanimadora do preparador físico Fernando Roberto de Oliveira, em entrevista à O2: "Se você quer ser um campeão, escolha bem os seus pais." Ainda estou tentando entender qual o legado genético que meus pais me deixaram. Definitivamente, nada que ver com esportes.


***

Esta noite dormi só 3 horas, mas ainda assim arrumei tempo pra sonhar, que o sonho é prioridade em minha vida. Sonhei que tinha uma filha linda. E que o nome dela era Luz.

Luz Lau.

segunda-feira, setembro 25, 2006

Declaração de voto

Pátria amada, Brasil.


Inspirada no post-crônica-política-de-botequim da Jussara, vou abrir minha seleção de candidatos para estas eleições. Longe de ser um dream team, lá vai:

Presidente: CRISTOVAM RICARDO CAVALCANTI BUARQUE - PDT - 12
Porque: A Educação no Brasil precisa ser levada a sério, nem que seja pra se ver resultados só daqui a 60 anos. Chega dessa desculpa esfarrapada de que nosso povinho não sabe votar. Se o brasileiro soubesse ler e escrever de forma funcional, tudo podia ser bem diferente. Infelizmente, pro Cristovam dar certo, o Congresso e o Senado teriam de passar por uma séria lobotomia. Utopia hoje, mas quem sabe um dia? Quem sabe pros meus netos e bisnetos?

Governador: DENISE FROSSARD LOSCHI - PPS - 23 (Coligação Unir para Mudar)
Porque: Por eliminação. Entre a corja dos Garotinhos e o fundamentalismo evangélico do Crivella, fico com esta raposa-juíza que me ainda desperta alguma desconfiança, mas que tem meu benefício da dúvida.

Senador: JANDIRA FEGHALI - PC do B - 651 (Coligação Um Rio para Todos)
Porque: Por sua invejável coerência ética e sua não menos importante combatividade para defender fracos e oprimidos, por vezes beirando a caricatura. Tem propostas excelentes para a Saúde e, como médica que já atendeu em hospitais públicos, entende disso mais do que qualquer outro demagogo provido de personal marketeiro. Ela e o Gabeira são os únicos candidatos em quem eu voto de corpo e alma.

Deputado FEDERal: FERNANDO GABEIRA - PV - 4321
Porque: Não quero parecer passional, (ha ha ha) mas em tempos de mensalão, ninguém precisa explicar porque vota no Gabeira. Além de íntegro, inteligente e foda pra carajo, ele é o melhor deputado que existe, e tem o melhor site! Sorte minha ele ser do Rio. Ufa!

E vocês, votam em quem?

Comerciais vegetarianos da PETA - (Legendado)

PETA is cool.

Campanha contra o uso de peles da ONG People for the Ethical Treatment of Animals (PETA).

Alma no Mistura (pro Joel)


Assinantes do Globo, aparentemente, têm desconto de 20%. Se o Joel me der carona, eu vou. Senão, vou armar uma tromba desse tamanho e vou ficar em casa traduzindo coisas. Mundo cão, esse.

domingo, setembro 24, 2006

Coisas do Povo Brasileiro (pra Jussara S.)

Povo Brasileiro, meu galgo iraquiano, um dissimulado produtor e soltador de armas químicas altamente mortais, ganhou esse nome porque, quando o trouxe da rua da amargura aqui pra casa e meu pai (um cara legal, mas algo nojentinho) viu aquele bicho estropiado, magro, com o corpo todo castigado por chagas mal cheirosas, disse:

- Tudo bem deixá-lo aqui até que se recupere, mas não quero "o povo" (fazendo cara de nojo) misturado com a gente.

Querendo dizer: não quero que ele saia da área de serviço.

Pois o cão ficou bom, foi adotado por uma família com crianças, mas foi logo devolvido porque criou uma tara sexual pela batata da perna (branquinha, branquinha) do pai das crianças, e não pegava bem pra um honrado chefe de família tentar passear com seu cachorro enquanto este ficava tentando cruzar com sua batata tesuda. Aceitamos o galgo de volta (porque a gente sempre se apega àqueles cuja vida salvamos, sobretudo se eles têm algum tipo de perversão sexual hilária), pedimos perdão ao cão por termos permitido que pessoas estranhas o chamassem de Mickey por 30 dias e eu mandei fazer uma plaquinha com o nome e sobrenome dele: Povo Brasileiro. Nome que o Povo entendeu imediatamente lhe pertencer, como se tivesse nascido com essa informação gravada em seu DNA. Ele aprendeu na mesma hora o que significava "coleira" e "passeio", e eu tenho a impressão de que, se o Povo fosse uma criança, ele seria um daqueles gênios que aprendem a ler, escrever e calcular em que dia da semana cairá 27 de outubro de 2099 antes de sair das fraldas.


Naquele mesmo mês, durante o horário eleitoral, estava o Povo em seu sofá que ele emprestava pra gente (sim, os cães são mais generosos que os humanos), quando minha mãe percebeu que o cara estava aflito com alguma coisa: ele sentava, levantava, olhava em volta, mas na TV não tinha nenhuma Lassie boazuda, nem tampouco uma panturrilha branca e sensual, apenas uma corja de políticos safados vendendo seu peixe podre. Foi então que nós percebemos que a toda vez que um cretino falava "porque o povo quer", "o povo precisa", o povo isso, o povo aquilo, o meu filhote, meu pequeno Einstein canino, sabia que o estavam chamando de algum lugar dentro da TV.

Esse nome, Povo, propiciou algumas situações engraçadas, como uma vez em que meu pai foi passear com o Povo e a Radija no bosquinho do condomínio e eles fugiram pra ter um pouco de privacidade. Como o Povo era mais antigo com a gente e a Radija era filhote e pouco conhecida onde moro, uns meninos conseguiram agarrá-la e sabiam que ela era a "irmã" do Povo, mas não sabiam o nome dela, nem o do condutor dos cães. Então puseram-se a gritar pelo meu pai, que ainda se embrenhava no mato em busca do Povo, para alertá-lo de que tinham pego um dos meliantes caninos: "Ô hômi do Povo, hômi do Povo!".

Minha mãe ficou muito aliviada de não ter saído com os peludos nesse dia, porque ia pegar malzão se saíssem por aí, gritando pra ela: "Ô mulé do povo, mulé do povo!".


PS: o blogger é uma entidade com vontade própria, e hoje ele não aceitou que eu subisse as fotos que tenho do Povo. Mas imaginem o galgo iraquiano mais bonito do mundo: o Povo é cinquenta vezes isso.


PS: o Povo, apesar de castrado no ato do resgate, há oito anos, ainda é um tarado sexual. Em Miguel Pereira, ele tem uma almofada para dormir e outra pra molestar. Não raro, chegamos em casa e encontramos a dita cuja largada no meio do campinho, pra onde ele leva suas vítimas de abuso sexual e as abandona depois de satisfeito. A Radija, que é inocente e casta porque foi castrada antes do primeiro cio, sente muito medo do irmão quando ele banca o esquisitão e, por via das dúvidas, fica sentada com a rabiola grudada no chão enquanto ele não volta ao normal.

Milagre no site da Billboard

Estava eu em casa, paralisada de horror diante da tela do computador, que me exibia mais um serviço megalo-mal-dimensionado de tradução, com um prazo que todas as moléculas de meu corpo gritam ser impossível de cumprir, quando me ocorreu que talvez ouvir uma musiquinha pudesse me ajudar a pisar na tábua e chegar à reta final antes dos garis.

Foi assim, buscando uma estação de rádio na internet (eu não suporto ouvir as músicas que eu tenho, porque essas eu já ouvi demais), que eu encontrei o site da Billboard (sorry, guys, encontrei mas já perdi -- não deu pra linkar); e dentro do site da Billboard, tem um link para Pandora, que é basicamente uma estação de rádio que faz telepatia com o ouvinte e só toca o que você gosta de ouvir. É um milagre, minha gente! Eu não me lembro exatamente como eu fiz pra começar a ouvir a rádio (e estou encagaçada de medo de não acertar o caminho nunca mais), mas eu pedi pra ouvir "Caetano", e o Pandora me perguntou "Esse Caetano aí, é artista ou nome de música? Você quis dizer Caetano Veloso?!?". Eu disse: sim, claro que é o Caetano Veloso, Pandora, o que você pensa de mim? E aí começou o miracolo: a rádio tocou, além de Caetano, Marisa Monte, Novos Baianos, Gil, João e Bebel Gilberto, Mutantes, Nat King Cole, Rita Lee, Nara Leão e Mila Drumke. Imagino que o site escolha músicas que normalmente agradem aos fãs de Caetano Veloso (ou do artista selecionado), e isto deve ser feito com base em algum banco de dados com feedback de usuários. É incrível, é de graça e não tem fim nunca, desde que você faça seu cadastro com um ZIP code válido nos EUA (eu usei o da minha irmã). Eu fiquei tão feliz, que fiquei com vontade de gritar pela janela: OBRIGADA, BILLBOARD!!!

A velocidade da tradução continua do mesmo jeito, com um pé quebrado e o outro atolado na jaca até o joelho, sem muitas esperanças de cumprir o prazo. Mas como é bom ouvir uma musiquinha bacana e não pensar tanto nisso!

Beijos e bom domingo de trabalho escravo a tutti,

Van

sábado, setembro 23, 2006

Resoluções de ano novo (de novo)

Ano novo nos olhos de todos é refresco:

- Parar com essa coisa genérica de dizer que "quero emagrecer", "quero ser mais forte", "quero ter mais saúde". Meu negócio agora é trabalhar com metas concretas: corrida de 10 km em dezembro, de 21 km em março e 42 km em 2008. "Forte, magra e saudável" serão reles conseqüências orgânicas do meu esforço pra atingir essas metas;

- Fazer ginástica de manhã-antes-de-tudo, nem que tenha que madrugar pra isso, uma vez que de noite eu sou a mais cara-de-pau das criaturas;

- Evitar fazer unha em manicure, sobretudo as de 10-reais-com-estufa-cenográfica (e ter muito medo de hepatite, que o fígado é um órgão vital).

Daqui a três meses, eu complemento a lista se for necessário.


PS: por falar em olho, não é que eu amanheci com uma recidiva daquela conjuntivite maldita?! Tem vírus que, como algumas pessoas, não sabem a hora de parar. :o(

sexta-feira, setembro 22, 2006

Shana Tova a tutti


Às minhas amigas que certamente optarão pela conversão ao judaísmo graças a um inocente cursinho de Kabbalah; aos ortodoxos esquisitões; aos meus amigos seculares, que só lembram que é Rosh Hashnah depois de tomar um esporro da mãe; aos meus amigos israelenses que são kosher pra tudo, menos mulher; aos meus médicos favoritos; aos meus cineastas americanos prediletos; e a todo mundo que, como eu, não é judeu mas adora conceber um ano com duas chances de recomeço, feliz ano novo!

Gaping Void forever


Preciso de um celular fodaço novo. Alguém tem o endereço atualizado do Papai Noel?

Canil municipal


Canil municipal
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Abraço e cafuné da veterinária no canil municipal. Quem ama o que faz, trabalha melhor.



Update:



E tem gente que diz que os veterinários de prefeitura são uns exterminadores sanguinários! Quando eu vejo uma cena dessas, protagonizada por um veterinário "de saúde pública" e um cachorrinho abandonado e descamisado, que, por não ter qualquer atrativo especial pra adoção, mofa num canil municipal por anos, tenho vontade de esfregar o focinho [de quem põe todos nós no mesmo saco] no chão onde foi depositada a caca da calúnia. É um método arcaico e contraproducente de castigo, but so is theirs.

A propósito: esta cadelinha, que apanha dos coleguinhas de canil por ser dócil demais, se empoleira no portão e uiva todos os dias às 17h em ponto. Os cães uivam para chamar uns aos outros, e a maioria dos cães entende que seus donos são cães, como eles, mas não ligam pro fato de sermos tão feios e pelados. Eles são tão generosos que não têm nojo da gente.

A veterinária do canil acredita que era essa a hora que o dono da bichinha chegava em casa, antes d'eles se separarem. Talvez ele tenha morrido, porque vê-se nos olhos dela que eles se amavam de verdade (não há acusação naquele olhar melancólico); talvez tenha ficado louco, e por isso a tenha abandonado. Só sei que não há um dia que eu me deite sem pensar em quem poderia ser feliz com essa mocinha. Me corta saber que ela segue uivando por um dono que nunca voltará.

Mundo cão, esse.

Auto-imagem (meninas x meninos)

Esta tirinha aqui foi uma descoberta sensacional do Tom Taborda. Não é guerra dos sexos: é a mais dura realidade. Meninas, pensem a respeito: precisamos melhorar esses números!

quinta-feira, setembro 21, 2006

Histórias de mulé


Foi assaltada à mão armada na Lagoa, saindo de seu carro para a igreja. Vestida a rigor para o casamento da melhor amiga, carregava uma carteira daquelas em que só cabem duas coisas: a chave do carro e um batom. Hesitou em entregar seu ouro, o bandido se enervou. Ela negociou: te dou o carro, com chave e tudo, se você me deixar ficar com a bolsa e o batom. Ele topou. Entrou na igreja, linda e loira, fingindo não ter sido assaltada. Lidaria com aquilo outra hora. Agora ela só tinha que estar bem bonita.


***


A reunião não estava nem perto de chegar à metade quando ela sentiu um líquido grosso e quente escorrer-lhe entre as pernas, primeiro tímida, depois caudalosamente. Estava na cadeira mais distante da porta, uma distância que agora lhe parecia quilométrica. Podia sentir a mancha de sangue menstrual aumentar em sua calça de linho, primeiro como uma bola de tênis, depois como uma bola de basquete, mas por sorte fazia meditação transcendental com um maluco de Santa Teresa e, agora, comandava o desligamento de toda a sua musculatura facial, cervical, humm... como era gratificante conseguir relaxar num momento de estresse intenso. Nada mais a conectava à Terra quando seu chefe pediu-lhe que fizesse a apresentação de seus slides. Ela alegou qualquer coisa e pediu pra fazer a apresentação assim, sentada, e foi linda a sincronia verdadeira de seu fluxo com a passagem das telas no data show, um prazer raro que era só dela. Esperou que todos fossem embora e pediu à copeira que levasse sua calça na lavanderia express mais próxima. Pra quem nunca fez, esta moça recomenda: não há nada mais incrivelmente sexy e poderoso que passar uma tarde inteira trabalhando só de terno, salto e calcinha num prédio sem cortinas no centro da cidade.

***

Tenho 9 anos e estou revoltada porque acabo de ganhar de minha avó um sutiã. O que ela espera, que eu tenha peito aos 9 anos?!? Acontece que eu não tenho peito e tenho raiva de quem tem! Eu me recuso a criar peito. E se nascer pentelho, eu arranco com pinça!

quarta-feira, setembro 20, 2006

VanOr responde urgente!

Van Or, preciso de seus sábios conselhos. O que eu faço se o cara que eu amo, que me amava até há pouco, com quem eu casaria e teria dois filhos, não me ama mais? E se, pra piorar, estou cheia de urucas, acabei de entrar no meu inferno astral (de quebra ainda vou ficar mais velha) e não tenho dinheiro pra comprar uma bicicleta?

Beijos desesperados,

euzinha


VanOr responde:

Euzona (com "E" de gente grande e o sufixo do tamanho do seu real valor),

Eu te conheço, te manjo e sei do que você é capaz, portanto não poderei te dar um joelhaço com o distanciamento crítico adequado. Farei o possível, no entanto, porque, agora que voltei a malhar, preciso distribuir uns joelhaços a esmo pra alongar minha dolorida musculatura glútea.

A primeira coisa que você tem que se perguntar, já de volta pros seus quase dois metros de estatura moral, é: eu quero um cara que surta mais que mulher bipolar com ovário policístico e TPM alastrante? E que, em todos os surtos, lava seu cérebro pra te convencer que a louca é você? Talvez você precise de um atestado de sanidade mental pra se convencer de que o maluco é ele. Talvez apenas precise separar claramente o que é amor de fato do que é a fantasia de menina que sonhou casar e ter filhos com aquele garoto de jeans rasgado do ônibus.

Vocês não estão mais naquele ônibus. Vocês saltaram há 20 anos e, aqui, fora do transporte escolar, a vida é pra valer. As pessoas precisam contar umas com as outras para assumir compromissos, precisam se doar e precisam se sentir amadas e valorizadas. Senão a gente sente pena e chora, amor, mas a Terra não pára de girar. A vida continuará, a gente vai continuar tendo que fazer essas coisas chatas que os adultos fazem para sobreviver, vai continuar pegando um cineminha-bar-teatro-praia pra desanuviar e, eventualmente, numa dessas, a fila vai andar. Até porque não é humanamente possível que as suas únicas opções românticas estejam pra sempre restritas àquele ônibus escolar. Ele até já saiu de moda, se você quer saber.

O amor não é um luxo: é necessidade básica da existência plena. Mas o amor também não é como o lixo, que se descarta e se recicla a todo momento. A matéria prima ego tem um limiar de reciclabilidade muito baixo, se você quer mesmo saber. Repare bem: acho que você chegou no seu limite.

beijos e 3 séries de 12 joelhaços, dia sim, dia não,

VanOr

Sogrossauraus terrificus*

Pra vocês não sairem por aí falando que neste blog só se trata de abobrinha, aqui vai um texto científico extremamente relevante*, escrito há cinco anos para um concurso do Jornal O Globo sobre criaturas monstruosas fantásticas. Valia um ingresso pra ver Jurassic Park III ou V ou VII, mas eu ganhei uma camiseta que nunca fui buscar. Eu só queria mesmo era falar mal da sogra. Tenho essa necessidade, mesmo quando estou solteira.

Em tempo: eu não acredito mais em Coelhinho da Páscoa, Mulher de Branco, Papai Noel, muito menos em sogra boazinha. Com sogra, protocolarmente, não tenho um, mas sim dois pés atrás. 600 km atrás. No mínimo!


Nosso Instituto Antropo-arqueológico de Pesquisas Inúteis (INAAPEI), na busca do elo perdido entre as espécies Homo sapiens, variedade sogra, e Crotalus terrificus, a cascavel, descobriu o fantasmagórico esqueleto gordo do Sogrossaurus terrificus.

Como todos sabem, a sogra é um verme humaniforme peçonhento, enquanto a cascavel é um réptil serpentiforme pouco menos venenoso, mas ainda assim bem ágil no bote. Aparentemente, as duas espécies só teriam em comum a destreza para o ataque e o veneno, mas gravuras primitivas ilustrando mulheres de Neanderthal sendo barbarizadas por mulheres velhas e corpulentas, levaram nossos cientistas a crer que havia um ancestral paleozóico comum às duas espécies, e que este tenha escapado da Era Glacial por um triz e às custas de muita chantagem emocional.

O Sogrossaurus terrificus era um réptil humaniforme de sangue frio, onívoro oportunista e ovovivíparo. Estudos feitos sobre os vestígios de esmalte cafona encontrados nas úngulas do esqueleto indicam várias seqüências cromossomiais semelhantes às encontradas em bote de cascavéis e línguas de sogras humanas, incluindo sogras judias, portuguesas, sicilianas, tijucanas e emergentes da Barra da Tijuca. Como todos sabem, a língua de sogra humana produz um potente veneno conhecidamente capaz de arruinar casamentos felizes e destruir lares outrora estáveis, pelo menos antes daquela visita inusitada da sogra por 15 dias (BOCA DO POVO ET & AL), e esta propriedade aniquiladora totalmente do mal pode ter contribuído para que o S. terrificus pusesse em risco sua própria espécie, o que é cientificamente estúpido e revoltante.

Morfologicamente, o sogrossauro era um bípede de sangue frio que nascia com coração, mas perdia-o com o passar dos anos. Tinha membros superiores afuncionais, o que significa que, apesar de ágil e um tanto astuto, era inútil e dependia totalmente da prole para realizar qualquer tarefa que não a predatória-específica de outros adultos jovens que demonstrassem interesse afetivo por seus filhotes.


Até o momento não está totalmente explicado o motivo da perda da função cárdio-sentimentalóide do Sogrossaurus terrificus. Estudos in vivo e in mortum não foram conclusivos, e a hipótese menos provável seria a influência ambiental sobre os indivíduos sogrossauróides, acompanhando a máxima do Bom Selvagem pré-histórico (“O sogrossauro erabom, a sociedade é que o corrompia”). A hipótese mais provável, no entanto, é que o sogrossauro era mau pra cacete mesmo, e portanto desprovido de coração e sentimentos nobres.

A partir do amadurecimento sexual de seu primeiro filhote, o sogrossauro tornava-se um carnívoro voraz extremamente cruel, com atividade predatória-específica de adultos jovens de outras famílias. Exterminador implacável, o sogrossouro devorava, sem deixar vestígios (apenas algum DNAzinho, pra comunidade científica elucubrar sobre), qualquer indivíduo que tivesse pretensões reprodutivas com sua prole até o final de sua vida, que era mais longa do que deveria ser. Estima-se que cada sogrossauro eliminasse, em média, de 8 a 12 adultos jovens por filhote. Na maioria das vezes o filhote, já adulto de meia-idade, entrava em fossa abissal ou depressão profunda e morria de doenças oportunistas, como a tuberculose e a cegueira por falta de sexo.

A predação do S. terrificus era elaborada e ocorria em fases bastante distintas, onde a primeira seria a observação minuciosa do comportamento sexual das potenciais presas em relação aos seus filhotes. Após observação e estudo detalhado do comportamento da presa, o sogrossouro adotava um comportamento amistoso com a vítima, o que precedia o bote. Um capítulo à parte na etologia da espécie, o bote era uma simulação de batalha onde o sogrossouro invariavelmente fingia sair ferido, comportamento que os paleontólogos etologistas classificam como chantagista emocional ardiloso, cretino e sem-vergonha.

Apesar da simulação de fragilidade psíquica, o predador Sogrossouro terrificus era um animal robusto (em três apresentações: acima do peso, gordo ou super obeso) e refratário à maioria das doenças que vitimavam répteis semelhantes. Acredita-se que a espécie tenha entrado em extinção porque o sogrossauro: 1) não encontrava parceiros sexuais que suportassem o sobrepeso de sua carcaça; 2) era extremamente inútil e cruel, e Deus sabe o que faz.

O estudo paleontológico do Sogrossaurus terrificus representa um importante ponto de partida para complementação de estudos antropo-sociológicos sobre a influência nociva de sogras humanas nas relações familiares. Etologistas, psiquiatras e médiuns sensitivos especializados em vidas paleozóicas passadas encontraram vários traços comuns a ambas espécies. Novos estudos indicam claramente que, também na espécie humana, ocorre o mesmo tipo de mutação cárdio-sentimentalóide do sogrossouro (a substituição do coração por uma prótese de concreto), o que explicaria o comportamento diferenciado desses indivíduos (sogras) em relação ao restante da humanidade.

domingo, setembro 17, 2006

Antipatia aérea

Embora eu seja uma criatura extremamente sociável, a ponto de ser incompatível com namorado ciumento, sou dotada de uma inexplicável antipatia aérea. Trocando em miúdos, a única coisa relacionada a viagens aéreas que realmente me apavora é a desconfortável possibilidade de algum estranho resolver puxar conversa comigo. Eu não su-por-to. Talvez seja minha forma de manifestar pânico de voar; talvez seja minha forma de lidar (mal) com o pânico dos outros; mas bem provavelmente é o que ocorre com 11 em cada 10 poodles & afins de madame: eles se sentem bem entre humanos, seus iguais, mas agem muito mal em contato com seus semelhantes, os outros cães, que eles não reconhecem mais como semelhantes e sim como... bichos... ou sabe-se lá o quê. Definitivamente, os poodles & afins não se vêem babando e correndo com uma bolinha na boca, e sentem-se ultrajados com a possibilidade de um dia agir como um canino. Coisa nojenta que eles sabem que não são.

Pois acho que comigo é justo isso que acontece. Embora eu seja humana, não me sinto à vontade num lugar tão cheio de humanos nervosos com o atraso, nervosos com as condições climáticas, nervosos com a agenda, nervosos porque não vão conseguir esticar as pernas na poltrona, nervosos porque avistaram um bebê três fileiras à frente e temem que o bebê chore. Sobretudo, não me sinto bem por perto de humanos que não obedecem regras básicas de segurança e não desligam o celular nem com o comissário o cutucando insistentemente e dizendo "senhor, o avião precisa decolar, senhor, desligue o celular, senhor, por favor coopere.". Eu não me sinto esse tipo de humano, não me sinto bem entre esse tipo de humanos e, assim, me identifico totalmente com os poodles bem tosados e de unhas pintadas, que ficam tão deslocados num par-cão cheio de labradores mastigadores de coco que chega a dar dó. No duro, eu sou como um cachorro com um sério problema de auto-imagem.


Em aviões, não converso nem com comissários de bordo. Não tenho curiosidade de conhecer a aeronave, não pergunto pra que lado fica o sanitário mais próximo e, mesmo que queira saber, não pergunto nem quanto tempo falta pra chegada, nem se aquele barulho estranho foi uma explosão da turbina, nem que filme será exibido durante o vôo. Se a informação não estiver escrita, eu desisto. Se for um vôo de mais de uma hora, então, meu pavor é tanto que exige o consumo de um tarja preta com qualquer coisa alcoólica forte nos primeiros minutos, pois, se eu consigo dormir antes de o cara ao lado puxar assunto, me considero salva pro resto da viagem, que é o período mais crítico, quando as pessoas puxam assunto com as outras por puro medo de o avião cair.

Uma vez, numa viagem pra Salvador, meu vizinho de assento perguntou o nome do livro que eu lia e eu, idiota, respondi a verdade: “O demônio do meio dia”. Embora o livro seja um tratado sobre a depressão e nada tenha a ver com o antagonista de Cristo, isso me rendeu uma pregação religiosa de 90 minutos, durante as quais eu tentei todas as formas possíveis de se interromper uma conversa indesejada – do laconismo carrancudo à simulação de morte súbita, passando pelo MP3-player a um volume audível do solo e idas sucessivas ao banheiro –, mas o maldito servo do senhor não me deixou em paz até o desembarque. Quando levantamos, eu me adiantei dois passos e disse pro maluco, dedo em riste: Nem pense em me seguir! E ele foi atrás de mim, falando alto -- pra todo mundo ouvir e decidir quem era o maluco ali -- sobre como o sete-peles estava presente na vida das pessoas sem Jesus no coração.

A despeito disso tudo, uma vez conheci um cara legal num avião. Corroborando minhas suspeitas de que esse estresse de viagem aérea tem a ver com minha suscetibilidade ao público neurótico da classe econômica, nessa única vez que conversei no avião, o fiz numa primeira classe (da qual só usufruí porque a companhia aérea já tinha lotado a classe econômica). O cara ao meu lado, um alemãozinho de terno e gravata, tentou não rir de mim, mas se apiedou de minha burrice e me ajudou a armar o DVD-player individual que cada passageiro daquelas poltronas de couro sinistras tem diante de si. Ele viu que eu não ia perguntar como aquilo funcionava, e por isso ficou na dúvida sobre que língua exótica deveria tentar falar comigo, então arriscou umas cinco, pelo menos até eu perguntar se ele sabia falar inglês, que inglês estava fine pra mim, e aí ele morreu de rir. Então nós conversamos por nove horas seguidas. Foi isso. Apesar da antipatia aérea, tenho nove horas de conversa furada no meu curriculum.


Seria nove um número cabalístico?

Procura-se um amor que goste de cachorro.



Este branquinho aqui foi encontrado todo estropiado na rua por um amigo do blog. Agora está aí, todo lindão, vestido de branco, com sua barba dura mal feita, olhos verdes, ciente de seu altíssimo poder de sedução. Tem um fraco irrefreável por mulheres humanas.

As interessadas (vá lá, interessados também) devem ligar pra Daniele, no tel. 21- 9651-XXXX. Esta foto aqui não faz jus à beleza do mancebo pois trata-se de um cartaz amador scanneado. Contudo, tenho certeza de que a Dani deve ter fotos melhores do branquinho pra quem quiser tirar dúvidas sobre o verde desses olhos pidões, que hoje só clamam por uma família bacana. Como a sua, assim. (Joel?)

ATUALIZAÇÃO: O BRANQUINHO ARRUMOU FAMÍLIA! Algum humano se deu bem por aí.

Cães que ralam


Cães que ralam
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Cutucadora de barriga e cobradora de guloseima por baixo da mesa. Profissional experiente, só atua junto a trouxas que pregam o "façam o que digo, mas não o que faço."

sábado, setembro 16, 2006

Meu esporte favorito


Meu esporte favorito
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Esmagamento de focinho, revezamento de mão pra cafuné de orelha e coçada rápida de barriga. Uma espécie de triathlon afetivo do qual sou recordista mundial.

Papo em dia


Papo em dia
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Ela me contou altas cachorradas que aprontaram com ela na minha ausência. Mundo cão, esse.

sexta-feira, setembro 15, 2006

Gatos que ralam


Gatos que ralam
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Vigia de sombra da prefeitura. Vida dura!

quinta-feira, setembro 14, 2006

Sherlock


Intrigada com a descoberta tardia da grafia correta de supérfulo, digo, supérfluo, Sherlock resolve investigar a origem de seus deslizes (fono)ortográficos. Sua mãe, suspeita número um por ter lido na juventude tudo em cuja capa se lia Sabrina, Bianca, Júlia e Sidney Sheldon, foi interrogada sutilmente, de forma que não percebesse o real intuito da pesquisa:


- Mãe, qual é mesmo a palavra que a gente usa pra dizer que uma coisa não é necessária, que se pode passar sem?
- Lixo.
- Não seja radical. Mais uma tentativa. Acho que começa com supér...
- ...fulo.
- Valeu!


Não satisfeita com a prova do crime e a falta de álibi da principal suspeita, nossa Sherlock tupiniquim interroga o suspeito número dois, seu pai, indo direto ao ponto dessa vez:


- Você fala supérfulo ou supérfluo?
- Supérfulo.
- E como se escreve isso?
- S-U-P-E-R-F-L-U-O.
- Mas você soletrou supérfluo!
- Isso mesmo. Supérfulo.
- Nã-nã-não, você falou supérfulo e soletrou supérfluo.
- Qual é o seu problema?
- Não, nada. Nenhum. Obrigada pelo seu tempo.


E Sherlock, percebendo que nada é mais inútil nesta vida que esse papo-brabo Freudiano de os pais serem culpados de tudo, abriu sua agenda e viu que tinha outras prioridades, como perder 6 kg, escrever dois contos, compilar um livro e correr uma maratona. Não necessariamente nesta ordem.

Conte sua história pro Galpão.

Galpão em cena.


O Grupo Galpão, uma das minhas companhias de teatro favoritas, está selecionando histórias de anônimos, contadas em até 7200 caracteres (ou duas páginas), para roteirizar e encenar um espetáculo. Não queria usar de analogias baratas, mas, trocando em miúdos, eles querem fazer uma espécie de "Páginas da Vida" teatral. Eu vou mandar a minha história hoje. Do jeito que sou prolixa, terei de relatar um episódio de cinco míseros minutos, pois é só o que caberia num espaço tão ínfimo. Mandem suas histórias também, só por diversão. Os autores selecionados devem, se a hombridade for um valor universal, ganhar um ingresso de cortesia. O causo tem de ser fantástico, mas verídico, e o autor vai ter de permitir adaptações do texto à linguagem teatral. O deadline é amanhã e o endereço eletrônico para entrega é contesuahistoria@grupogalpao.com.br.


Aqui tem um trechinho do e-mail convite dos produtores da companhia com mais detalhes sobre a seleção:

Os temas que buscamos para esse novo trabalho são acasos inexplicáveis, pequenos milagres cotidianos, coincidências curiosas, tramas surpreendentes, lances improváveis, situações poéticas, acontecimentos que se recusam a obedecer às leis do senso comum, coisas grandes ou pequenas, ásperas e delicadas, trágicas ou cômicas.

quarta-feira, setembro 13, 2006

La vie en rose

Minha máquina fotográfica cismou de transformar os brancos em rosa. Talvez haja algum significado emblemático para isso. Talvez essa predileção pelo rosa explique muita coisa.



Café do Sol em rosa.
Noivos na Pampulha em rosa.


A vida em cor-de-rosa parece ser um dos sintomas mais exuberantes do mal de que deveras sofro, a classe mediíte. A classe mediíte é um distúrbio comportamental diagnosticado pela primeira vez por minha joelhaçoterapeuta de Bagé, cujo nome preservarei até que ela aceite sair do anonimato. O mal acomete seis em cada dez pessoas de até 35 anos ditas de classe média, mas desde que a Globo colocou seu núcleo de porteiros e manicures morando em casas de dois andares com escadarias e móveis Tok Stok, o conceito de classe média tornou-se algo muito vago e confuso. Segundo minha joelhaço, a patogenesia do distúrbio reside no fato de que a jovem criatura iludida de classe média tem bolso de pobre e cabeça de rico, o que gera um conflito emocional em seu comportamento de consumo. Isto se torna ainda pior se o paciente tem pais que passaram por dificuldades financeiras na infância e juventude e prometeram a si mesmos que nada jamais faltaria a seus filhos.

Eu jamais poderia falar de um distúrbio comportamental sem aparar as arestas de Freud, que mais ou menos dizia que os pais são sempre os culpados por tudo: os pais são, sim, culpados de tudo que acontece com seu rebento até os dezoito anos. Depois disso, é hora do mimadinho ir à luta.

O pobre, segundo o raciocínio da classe mediíte, tem bolso de pobre e cabeça de pobre; desta forma, não há grandes conflitos, pois, como criatura com os pés plantados no chão, ele só compra aquilo que pode e, se não pode, abre um crediário nas Casas Bahia e compra um refrigerador em 20 anos de parcelas de 10 reais, o que quase não compromete o orçamento familiar, embora seja, na ponta do lápis, uma tolice. (Mas quem quer ficar um ano sem geladeira, quando pode tê-la agora, mesmo que a juros altos?) Já o rico tem bolso de rico e cabeça de pobre. Ou seja: tem dinheiro pra gastar, mas fecha a mão, barganha e exige contrapartidas. Como diria a Rita Lee, quanto mais tem, mais quer. Os acometidos pela classe mediíte, por outro lado, compram por impulso uma TV de plasma -- de que não precisam para sobreviver, observem bem: o consumo de supérfluos* é outro sintoma patognomônico do mal -- em 12 parcelas de 1000 reais, o que compromete um quarto do orçamento familiar por um ano, caracterizando uma profunda estupidez emocional, que por sua vez gera um crescente decréscimo de auto-estima, que por sua vez leva uma pessoa à depressão e até ao suicídio.

Não que eu queira ser dramática, mas, como é comum às pessoas que sofrem de classe mediíte, eu tendo a superestimar o que não existe concretamente (dinheiro é só um exemplo).


Daqui pra frente, contudo, tudo vai ser diferente. Montarei com minha fiel escudeira um grupo de ajuda mútua para gente doente como eu, e nós, juntas, aprenderemos a ser pobres de verdade, a pensar com cabeça de pobre, a economizar 20% de tudo que ganharmos e nunca mais comprar coisa alguma sem antes calcular quantas horas do nosso árduo trabalho escravo, em horário hermético estúpido, aquilo custa; e quantas vezes a gente tem vontade de mandar alguém à píula que o pariu no ambiente laboral nesse mesmo período. Assim, espero estar curada deste mal antes do Natal e do décimo terceiro, cuja metade adiantada já torrei em coisas inúteis. Como é típico de gente muito doente como eu.

Quem quiser participar das reuniões virtuais via MSN messenger do Consumidores Iludidos de Supérfluos Anônimos (CISA), mande sua ficha criminal, digo, sua história de consumidor consumista desembestado de classe média para vanorresponde@gmail.com. Seu relato será analisado por especialistas em classe de mediíte antes da incorporação ao grupo, pois o CISA, como entidade classista média, se reserva o direito de recusar pobres e ricos autênticos. Seu anonimato será preservado, mas sua história poderá ser usada neste blog como prova irrefutável de que eu não sou a única babaquara na face da Terra a sofrer dessa moléstia vexaminosa.

E tenho dito!



*Alterado graças ao comentário edificante da minha querida amiga Gabi Coutinho (uma das minhas revisoras favoritas, desde os tempos de Rural). Confesso que descobri, somente hoje, burra velha já, que a grafia correta de supérfulo é supérfluo, muito embora eu fale "supérfulo", como tem gente que fala "o pobrema é meu!", "estrupador" e "largatixa". Da mesma forma, aprendi há poucos anos que o correto é sobrancelha, e não sombracelha. Haverá cura pro meu mal (com éle, né)? Por que será que Tostines está (ou seria estão?) sempre fresquinho(s)? Fiquei muito insegura de repente (de repente junto ou separado? separado, separado, definitivamente separado!). Preciso fortalecer minha auto-estima urgentemente. Que o CISA não me ouça, mas preciso comprar um vestidinho.

terça-feira, setembro 12, 2006

Vírus



Uma forma maledetta de vida rudimentar tomou conta de mim há dois dias. Houve um momento, em plena maré pós-prandial no domingo, em que eu perguntei pro Lau:

- Tá ouvindo?
- O quê?
- O barulhinho dos vírus se replicando dentro de mim? Tic, tic, tic, tic?
- Hum.
- O quê?
- Eu bem que ouvi uns barulhinhos de putaria.

Coincidência ou não, estou lendo o último livro do Eduardo Gianetti, O valor do amanhã. Nele, o autor fala que a vida é regida pela lei dos juros: coma o que quiser agora, engorde amanhã; viva agora, pague (com a decrepitude e a morte) amanhã; divirta-se na friagem agora, fique gripada amanhã. Ou seja: só fiquei gripada, semi-surda do ouvido direito e semi-cega dum olho estropiado por esse adenovírus sacana ruidoso porque o feriadão em BH foi bom demais; e eu fiz todos os empréstimos de felicidade que meu parco limite de crédito permitia nesse curto prazo, e agora nada mais justo que eu fique de cama, fazendo uma transição de humores, por um dia ou dois depois deste feriadão. (Sim, eu estou sendo sarcástica; e sim, eu acho que gripe de cu é rola.)


***


Olha como o amor é lindo: nos 5 dias que passei em BH, o Lau foi meu companheiro em tudo, até na dieta. Eu comia aquele pouquinho, e ele também. Aí, lá pro segundo dia, eu fiquei com dó dele e perguntei: "Vai comer só isso, Lauzinho? Come um pãozinho..." E ele, mezzo sem jeito, mezzo sem vergonha, confessou que tinha acordado mais cedo pra comer croissant com manteiga e tomar uma xícara de café na cozinha, só pra não me matar de desejo. O Lau, como restauranteur, sabe melhor que ninguém que longe dos olhos, longe do estômago.

sexta-feira, setembro 08, 2006

Sumi não, uai. (ou Tem dieta que é píula!)

Gente, tô em Belzonte com meu Lauzinho. O computador aqui serve pra fechar as contas das mesas do Café do Sol, é meio flórida ficar alugando pra escrever no blog, mas aqui vai uma confissão que não pode esperar por um padre ou um joelhaçoterapeuta. Desculpe, eu sei que a retina de vocês não é penico, mas lá vai:

Voltei ao nutricionista depois de uma semana de dieta, fazendo 6 refeições microscópicas por dia, com hora, ingredientes, temperos, misturas, cachaça zero e tudo absolutamente controlado, exceto pela minha fome, que eu senti uma fome que, juro por Deus, só senti igual na faculdade, numa época em que eu fumava ervas orgâncias que disparavam um laricão animal no contribuinte. Cheguei a escrever um e-mail e-menso pro nutricionista dizendo que assim não era possível, que tinha alguma coisa errada, eu ia pirar de fome, que comida não podia ser uma coisa assim tão controlada, corrupção, violência e bandidagem, sim, vá lá, mas comida era coisa pra se tratar com prazer e não amarras. E o puto me liberou pra comer uma fruta extra por dia, fala sério!

Um super-mega parêntese aqui: o erro dessa dieta de fome miserável dele é o tal do dia livre. Um domingo em que se pode comer de tudo. Vocês podem imaginar que passei 72 horas cronometrando os segundos pro domingo chegar, e só de pensar em domingo, eu tinha um pré-orgasmo. E quando o domingo chegou, of course, eu dei uma enfiada de pé na jaca geral.


O resultado foi que, no dia do julgamento final, na hora da revisão semanal com o nutricionista, eu tinha engordado 400g. Até aí tudo bem, que se eu faço merda, eu assumo, e se tem coisa que não suporto é gente que não se assume, mas o que me tirou do sério, o que me fez querer arrancar os olhos do nutricionista, foi ele ter virado pra mim, com aquela cara cretina de escritor de auto-ajuda, e dito:

- Não desanime, não. Você merece emagrecer!

Cheguei à conclusão que há coisas na vida que a gente só consegue fazer sozinha, sem ajuda. Se você precisa matar uma pessoa, por exemplo, ou se precisa emagrecer (tendo lido 20 anos de revista femininas com tudo o que existe de informação a respeito de dieta), esqueça o cúmplice ou o nutricionista. Cúmplice e nutricionista são duas coisas que só servem pra atrapalhar. Faça a sua coisa e cague pra opinião alheia. Cada um sabe de seu cada um.


Agora, pelo sim, pelo não, estou associando essa dietinha suicida do nutricionista com a dos Vigilantes do Peso. E, desta vez, eu não abri mão da bebida alcóolica, vá pra píula que o pariu, mas desse luxo eu não abro mão, porque a qualidade de vida não pode cair com dieta alguma. E os Vigilantes podem ter mil defeitos de caráter e culpa no cartório em situações pregressas comigo, mas pelo menos eles não são radicais a ponto de modular a vida social de uma pessoa.

quarta-feira, setembro 06, 2006

Fred Negão - fim

(continuação)

Fred e eu éramos tão unidos, que talvez ele fosse apaixonado por mim e eu não percebesse. O que é bem típico meu. Tive um outro amigo da escola, cujo nome não revelo pra preservar-lhe a privacidade, que era apaixonado por mim, se é que é possível alguém ser apaixonado por alguém aos 13 anos. E eu correspondia, mas de um jeito que o chocou, no auge de sua expectativa de vivenciar comigo a primeira experiência sexual. Disse-lhe que ele me encantava e eu o adorava sinceramente. Como se adora sinceramente um ursinho de pelúcia, oras. E essa estória do ursinho fodeu com a cabeça e a sexualidade do meu amigo por quase duas décadas. Ele passou quase duas décadas se sentindo um ursinho blau-blau a toda vez que uma garota se aproximava dele, e eu, quando soube, burra velha já, me senti muito culpada. Se eu pudesse voltar o tempo, teria dado logo pra ele e pronto, pra não criar esse trauma todo.

Pois o Fred, apaixonado por mim ou não, foi meu único amigo -- e eu vou dizer isso bem alto, que in vino veritas, e eu saí da dieta pra dizer umas verdades, que tem dias que a gente precisa pôr pra fora! --, o único amigo HOMEM e o único amigo DA ESCOLA que foi à minha festa de quinze anos.


Minha festa de quinze anos foi um mico federal que minha mãe (ex-tijucana, ex-normalista e ex-pobre, não preciso dizer mais nada!) me obrigou a pagar. Me vendo incapaz de demover minha mãe daquela idéia louca de fazer um baile de debutante, com bolo e vestido de noiva, o máximo que eu consegui, pra reduzir o quórum de testemunhas a níveis compatíveis com a continuação de minha vida social adolescente carioca da zona sul, foi transferir o debutanticídeo para a cidade serrana distante do Rio mais próxima: Miguel Pereira. Eu faço drama de ninguém ter ido, etc e tal, mas fazer a festa-mico em Miguel era uma solução perfeita: garantia quase que absoluta de que a galera da escola não iria me ver dançando valsa e não haveria tesmunhas óculo-escolares do evento. Contudo, pro meu quase choque-espanto-encantamento, o Fred Negão, que me amava tanto a ponto de subir uma serra por mim, compareceu de terno e gravata ao evento, tendo pra isso se hospedado com o pai no hotel que reservamos pra festa. Quando cruzamos nossos olhares no salão, e ele tentou não arregalar muito os olhos ao me ver naquele estado, com cabelo, maquiagem e vestido de noiva escolhidos pela minha mãe, eu apenas disse: "Fred, haja o que houver, não conte pra ninguém que você me viu assim, combinado?".

Ele concordou, sem dizer uma palavra, comeu dois brigadeiros e saiu à francesa. De volta à escola, nossa relação esfriou consideravelmente. Acho que ele perdeu a admiração que tinha por mim. Uma negona de verdade, na nossa concepção de black is most definitely beautiful, jamais entraria numa roupa de noiva aos quinze anos, jamais dançaria valsa e jamais teria medo de ser vista naquela situação humilhante.
Depois da escola, o Fred fez medicina na UFRJ. E depois ele foi fazer um estágio nos EUA. E depois, como ele era um gênio, e os gênios são sempre sugados pra fora do Brasil, ele nunca mais voltou. Todos os dias, ano após ano, procuro pelo nome dele nos jornais nas editorias de Mundo e Ciência, pois tenho a expectativa cotidiana de ver seu nome associado à cura do câncer ou algo foda do gênero.

O Fred é um negão branquelo esverdeado, cabelos castanhos, talvez começando a mostrar algum componente grisalho, com olhos castanhos úmidos de planta carnívora. Médico, pesquisador, ri curtinho e pra dentro e tem uma postura engraçada, de gente que quer encostar logo na parede, pra não desmoronar. Não mora mais na Rua Belford Roxo, em Copacabana. Não deve haver muitas pessoas assim pelo mundo. Se algum de vocês topar com alguém com essas características, por favor, peça pra ele entrar em contato urgentemente, questão de vida ou morte, que está cientificamente comprovado que saudade mata. E eu morro de saudades dele.

terça-feira, setembro 05, 2006

Por um Raio de Sol

Tem coisas que é melhor a gente nem saber. Benditos sejam os ignorantes, pois deles é o reino dos céus, já dizia seu pai. Ela não devia ter aberto o envelope e, tendo aberto o envelope, não deveria ter lido e, tendo lido, não deveria ter virado a noite na internet tentando entender o significado daquelas palavras frias, tão frias que pareciam blocos negros de gelo colados ao papel que, em momento algum, demonstravam qualquer solidariedade por uma mãe que porventura lesse: "Pequena zona lítica, com aproximadamente 1,1 centímetros de diâmetro, circundada por tecido ósseo esclerótico, em cortical medial da metáfise proximal da tíbia. Conclusão: A imagem é sugestiva de tumor ósseo...". Aquele era um texto que nada lhe dizia, mas quando chegou à palavra "tumor", palavra conhecida, o chão lhe faltou; uma enorme cratera se abriu no céu e dela pulou um gigantesco dragão negro que urrava e gritava por ela, cuspindo fogo pelas ventas e fazendo ruir a Terra, que o mundo pra ela perdia todo o sentido à medida que voltava à palavra "tumor", a única dali que ela entendia, fazendo com que seu tradicionalmente gigante coração se recolhesse ao insignificante tamanho de uma ervilha. Há sete anos, o piá teve esse mesmo tamanho, mas então estava protegido de todos os males do mundo dentro de seu ventre. Donde nunca deveria ter saído.

Um tumor, ela dizia pra si mesma, pode ser qualquer coisa. Tumor, rubor, calor e humor são os sinais da inflamação, e até uma picada de mosquito podia causar um "tumor". Sentada ali na sala de espera do pediatra, vendo seu filho correr e brincar com as outras crianças, exatamente como as outras crianças, só que puxando discretamente da perna esquerda, ela queria ter certeza absoluta de que aquele tumor não passava daquilo: uma picada de mosquito. E que o médico receitaria gelol, e então todos seriam felizes para sempre. Mas sua ervilha estriada cardíaca latejava da garganta pra boca, na ante-sala do grito, paralisada de pavor. Pavor do tumor. Não devia ter lido o laudo. Se ela não tivesse lido, talvez aquela palavra jamais tivesse sido escrita. E seu coração jamais teria se tornado uma ervilha.


A secretária chama por Rafael, o coração da mãe pára de bater por dois segundos e ele, o Rafa, o cara, pula na frente do médico lhe estendendo a mão, como se não tivesse medo algum de ouvir nenhum papo brabo de injeção. O médico sente a mão fria da mãe e pisca o olho dizendo: "Deixa eu ver se eu adivinhei: você leu o laudo!". Se não estivesse travando a mandíbula pra não tremer de frio -- de pavor? -- , juro que ela teria dito bom dia, mas a urgência lhe impelia a ir direto ao assunto: "Por favor, doutor, me explique tudo bem devagarinho e com muito cuidado, como se eu fosse uma criança de sete anos."

Dez anos se passaram pra ela, mas foram apenas dois minutos para todo o resto do mundo. Ela olhava pro rosto do pediatra, que examinava os filmes, para ver se ele exibiria sinais de desespero, mas ele se manteve impassível -- claro, era um profissional, estava acostumado a camuflar as emoções! -- e, ao fechar o envelope, sorriu-lhe de forma desconcertantemente confiante. Tudo indicava que se tratava de um tumor benigno, e eles teriam de fazer uma biópsia, um isso e um aquilo outro. Que não seria anestesia geral, que o procedimento era seguro, que o menino nem se lembraria disso no futuro. E ela imediatamente entendeu que se precipitou ao julgar Deus um tratante, porém seria absolutamente prudente mantê-Lo sob suspeita até que tudo aquilo estivesse resolvido.

Em casa, o filho confessou, depois de notar os adultos segredendo coisas por semanas, que não tinha entendido ainda o que fariam com a perna dele. E ela explicou que primeiro iriam dar um pum pra ele cheirar, e que o pum seria tão fedido que ele iria cair durinho e dormir, e enquanto ele dormisse, os médicos iriam dar uma injeção no joelho dele, e depois ele iria poder brincar de muleta por quase um mês. Ele não se incomodou com o pum, mas tentou negociar a parte da injeção, só que ela lembrou que ele estaria dormindo, e quando a gente está dormindo não sente nada, pode até pular do abismo que nada acontece. O cara quis saber o que eram muletas, ela explicou e acrescentou que era uma sorte incrível poder brincar de muletas só por um mês, ela mesmo queria ter tido a chance de experimentar esse brinquedo na infância, mas agora estava velha demais pra isso. E assim ele foi pro hospital sem medo, mas chorou ao ver que nem a mãe, nem o pai entrariam no centro cirúrgico com ele. Ainda bem que o pum veio logo, porque o cara gritava, fazendo com que as ervilhas encolhessem no peito dos adultos que ficaram do lá de cá, esperando o menino, que voltou tremendo de frio, com a dignidade fatalmente golpeada pelo avental verde de bunda de fora que todo ser humano, mesmo os filhotes, têm de usar nessas ocasiões especiais.

Mais tarde, já deitada em sua cama, depois de inventar pro filho mil brincadeiras com a muleta e mil prêmios pra quem não encostasse o pé no chão por nada! durante um mês, ela sentiu um medo descomunal, um medão incrível. Era um medo retroativo, seu coração de mãe sabia e podia apostar, mas era, sem sombra de dúvida, o maior medo do mundo.


PS: você me emociona e eu te amo por isso.

É hoje que neva no Rio!


É hoje que neva no Rio!
Originally uploaded by Van-Or.

Até a paisagem está com frio no Rio de Janeiro.

domingo, setembro 03, 2006

A maratona do Lau

Largada em São Conrado. Marcelo e Lau, super amigos à toda prova.

Eu nunca tinha me perguntado como os organizadores do evento sabem do tempo de cada um dos 15 mil atletas: é claro que eles carregam um chip no cadarço, dãããã! Elementar, minha cara VanOr!

Canincidências: o Lau é conhecido popularmente como "Didi", que também é o nome desta cadelinha idosa que corre com seu dono há anos, desde que ele lhe salvou a vida. Fiquei tão emocionada de ver a cachorrinha tremendo de desejo de correr com o dono, que chorei rios. Lau que me desculpe, mas eu gravei o número da menina (2387) no coração pra torcer por ela. Ver a cadelinha olhar tão fixamente pro seu pai humano, trêmula de amor, na expectativa de estar ao lado dele a cada segundo, me fez desejar tudo de bom que eu tinha, naquele segundo, só pra ela.


Leblon. Lau e Marcelo passando por nós, na torcida: só alegria no sexto quilômetro!


Em Copacabana, quilômetro dez: ânimos ainda em alta.


Em Copacabana, onde tem Cafeína, tem cafeinômaco. Tracei um strudel e um capuccino no meu dia de folga. Eles é que correm e a gente é que se esbalda.


Km 14, na curva do Aterro entre Botafogo e Flamengo: nada do Lau. Será que ele passou por aqui na nossa frente? O nó no trânsito não nos ajudou a ir mais rápido, de carro, que os meninos, de tênis.




Eis aqui a medalha do campeão. O orgulho da Joana, da Clara e, last but never least, da Vanzinha. Ano que vem, vou eu!

sábado, setembro 02, 2006

No túnel do tempo


Detalhe de uma foto do Lau no século passado (sorry, Lúcia), roubada descaradamente do blog da Marília.
Quem já viu fotos do meu pai sabe: o Lau é meu complexo de Electra.

sexta-feira, setembro 01, 2006

Porque a mente engorda


ovomaltine do bob's
Originally uploaded by Van-Or.

Porque a vida não foi feita pra se passar a alface e água.

Foi castigo, eu sei. Eu acredito em justiça divina, e sei que "cresci" três manequins em três anos porque passei quase toda a minha vida acreditando pia e cretinamente que só não é magro quem quer (ser uma baleia). Não quero que ninguém tenha raiva das minhas convicções passadas sobre magreza e gordura, mas entendam que com o meu histórico -- não gostar de doce até os 30, não ter o hábito familiar da sobremesa e ter sempre comido bem devagarzinho -- era fácil ser magro. Difícil era entender porque algumas pessoas estavam sempre lutando contra a balança.

Pois cá estou eu onde achei que jamais estaria: no time dos gordinhos mentais. Sei que não sou gorda (ainda estou no patamar da falsa magra), mas tenho total convicção de que chegarei à super obesidade mórbida se continuar pensando com esta cabecinha de gorda. Desenvolvi um pensar obeso ao longo dos anos, e não foi dum dia pro outro. Primeiro eu tive meu primeiro emprego e, com ele, meu primeiro vale refeição. Eu, que tinha um nojo irracional de comida de rua, me resignei àquela imundice e aprendi a comer no quilo na hora do almoço. No quilo, sempre tem um vigarista dum gordinho que almoça bebendo coca-cola NORMAL e pede sobremesa no grupo que almoça contigo; e um dia, você pede uma sobremesa também, só pra experimentar; depois disso, o cafezinho pós-prandial perde todo o sentido se não vier com uma mousse de chocolate. Depois, todos os quatro ou cinco cafezinhos do trabalho perdem o sentido se não vierem acompanhados de um chocolate prêt-à-manger, e quando você menos espera, está estocando Chokito na mesinha de cabeceira e não consegue mais ir pro trabalho sem o apoio emocional do bombom de cupuaçu.

Houve um momento, antes d'eu engordar meu primeiro quilo, em que eu senti a necessidade de um grupo de apoio. Procurei os Vigilantes do Peso, que me correram dali antes que eu fizesse os gordos de fato cortarem os pulsos. Eu insisti, disse "gente, eu vou ficar gorda um dia, preciso reprogramar meu cérebro pra voltar a pensar magro antes que isso aconteça", mas as ex-gordinhas não tiveram compaixão de mim. Uma me mandou buscar apoio psicoterápico, e a essa eu precisei dizer uma coisa muito rude, que não se diz pra mulher alguma, sobretudo se você é veterinária e ela, ex-obesa: "ah, vá se catar, sua vaca-gorda-sem-alma-miserável!"

O cérebro gordo pode estar embutido num corpo magro, e vice-versa. Conheço pessoas gordas com cérebro magro, que Deus não é justo sempre, e magras com cérebro gordo, o que me faz crer que o diabo deve ser mesmo um bom negociante de almas. Um cérebro obeso, como o meu, funciona assim: estamos em setembro, então tenho 4 meses para emagrecer até o Natal, quando poderei comer MUUUUUUUITA RABANADA, aê! Ou então, como ocorreu esta semana: Já que eu vou começar uma dieta amanhã, vou dar uma enfiada de pé na jaca geral, e comi duas empadinhas, um cachorro quente do Bob's com milk-shake de (óbvio!) ovomaltine, um Chokito e uma garrafinha de Grapete NORMAL! E no dia seguinte, tive que ouvir do meu novo nutricionista o seguinte: "não seja maluca com você mesma". É que eu tinha acabado de perguntar se, quando ele dizia que eu podia comer qualquer quantidade de fruta numa determinada refeição, ele queria dizer que eu poderia comer uma melancia inteira duma só vez, por exemplo. E eu só perguntei isso porque, enquanto ele descrevia a dieta, foi me dando uma fome, mas uma fome tão louca, que eu só pensava em emagrecer logo pra poder comer tudo o que que quisesse de novo.

Será que o Pitanguy lipoaspira cérebros?