Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

segunda-feira, março 31, 2008

Gripe de homem

Um amigo me disse uma vez que a gripe dos homens é muito mais debilitante do que a gripe das mulheres. "Baseado em que você diz isso?". Para meu choque e horror, ele respondeu: "Porque quando vocês estão gripadas ainda conseguem cuidar da gente, ao passo que nós, gripados ou não, não conseguimos cuidar de ninguém". Ahn. Bom saber.





***
Tradução freestyle (pro Olney, com carinho):

Eu também não consigo entender tudo o que se fala em inglês britânico, mas lá vai (freestyle, plis):

A mulher chega em casa e pergunta ao marido como ele está, e ele, prostradaço no sofá, faz a maior chantagem emocional: "Como você acha que eu estou me sentindo? 'Tou amargando aquele resfriado ridículo que você me passou..."

A moça segue, paciente: "Coitadinho! Se você tivesse me falado, eu teria vindo aqui e feito uma sopa pra você.". Ele diz que tentou chamá-la -- "Lauuuuu....ra..." --, mas a voz dele estava por um fio, afinal ele realmente estava nas últimas (grifo meu, super meu), então TEVE (não houve jeito) de ligar pro 999, que é o telefone de emergência da Inglaterra. Seria como o 192 daqui, com a singela diferença de que lá alguém atende e toma uma atitude.

A pobre esposa nem tem tempo de entender a sirene que começa a soar, pois imediatamente em seguida entram os paramédicos chutando porta em sua casa:

PARAMÉDICO 1: Fecha a porta!

POBRE VÍTIMA MULHER: Ahn?

PARAMÉDICO 1: Anda rapidinho aê, meu bem.

HOMEM CHANTAGISTA: Minha cabeça está explodindo. Acho que eu vou morrer!...

PARAMÉDICO 1: Não se nós pudermos evitar.

PARAMÉDICO 2: Como isso foi acontecer?

POBRE VÍTIMA MULHER: Ele pegou um resfriado... de mim...

PARAMÉDICO 2: Você não pensa, não é?

POBRE VÍTIMA MULHER: Peralá, eu tou um pouco confusa... Achei que ele só estava resfriado...

PARAMÉDICO 2: Ele é um homem, então o que ele tem é um RESFRIADO DE HOMEM (Nota do tradutor freestyle: ou seja, não é um simples resfriado, mas algo sério e debilitante) (PARAMÉDICO 2 para o homem chantagista) Haja o que houver, não saia desta cama. (para a mulher) Toma, segure este sino. Toda vez que ele tocar esse sino, vá correndo até lá, acaricie sua testa e diga "tadinho do meu coelhinho!"

PARAMÉDICO 1: Vamos logo, temos de atender o chamado dum cara com dor no joelho.

POBRE VÍTIMA MULHER: Ei, um momento: e eu, como fico? Também estou resfriada.

O paramédico mais viadinho desdenha da pobre vítima indefesa e o marido chantagista pede à mulher uma sopa e a TV ligada no único canal que ele consegue assistir assim, tão estropiado. Perdoem meu inglês capenga, mas se eu entendi bem, e espero ter entendido sem julgar moralmente o personagem (ou não!), acho que ele pediu pra assistir cartoon network -- ou qualquer coisa que um cérebro cozido pelo vírus da gripe de homem possa digerir sem comprometer a função de outros órgãos vitais.

sexta-feira, março 28, 2008

Kids

Uma vez eu tentei entender por que me encantam tanto as crianças, e cheguei à conclusão de que tanto fascínio tem pouco ou quase nada a ver com meu desejo de ter os próprios rebentos. As crianças são fascinantes, como são fascinantes os labradores ou tudo quanto é filhote que se equilibra entre o ser ridículo e o ser de fato, ou como é intrigante tudo aquilo que não se importa de ser e pronto.

Na saída da escola, vejo um desfile de fadas, brancas de neve e homens-aranha, todos com cerca de um metro de altura. Pergunto pra uma mãe passante qual havia sido a ocasião para tanta gala, mas não tinha tido festa: aquela era apenas mais uma quarta-feira banal, como poderia ter sido quinta ou segunda de uma semana qualquer, numa escola-parque em que as crianças se vestem como bem entendem. Desço a rua sonhando com um mundo em que a gente pode ser o super-herói que quiser, mas o encanto se quebra quando vejo três meninos descalços salivando sobre a vitrine da loja de brinquedos. Até aí, tudo lindo, não fosse pelo segurança do shopping que tentava removê-los daquele solo sagrado, lustroso e reservado a pegadas com poder aquisitivo, como as deixadas pelas rodinhas iluminadas dos tênis de um outro menino que observava a cena com a perversidade risonha que só as crianças têm. E eis aqui mais uma prova de que filhote é o mais fértil jardim: tudo de bom e ruim que existe em nossa espécie abunda na infância, e aos pais apenas cabe ceifar o que é daninho e fertilizar o que é bom, pra que daquele solo saia algum futuro.

No restaurante, ouço uma vozinha infantil da mesa ao lado contar como foi seu dia na escola, e a mãe tem tanto interesse naquela conversa arrastada, tão cheia de "aí né, aí né" que do lado de cá eu prendo o riso, imaginando se aquela santa está fazendo lista de compras mental, ou respondendo emails por baixo da mesa, ou se está, como realmente parece, prestando atenção naquela sucessão de queixas contra pedrinhos e olívias. Não é nada fácil a vida de uma criança que tem na sala uma olívia tão terrível, tocadora de toda a sorte de terror possível, e bem às barbas da professora. Aliás, sinal dos tempos: as crianças mais levadas de hoje têm nomes dos nossos avós, e os brunos e danielas, quem diria, são os mais bonzinhos de hoje em dia.

Pergunto pra menina no elevador o nome de seu cachorro, mas ela não sabe. "Não sabe?", reajo com espanto exagerado, aperto a mão contra o peito e simulo uma síncope cardíaca. "E como ele sabe que você está falando com ele se você nem sabe o nome do cara?!". "Nasabi", sussura com desdém. O nome do cachorro era Nasabi, e eu entendi outra coisa. A menina desce no nove me achando muito ridícula, e olha que eu acho que sou mesmo, porque de onde diabos eu tirei essa idéia estapafúrdia de que uma criança poderia não saber o nome de seu cachorro? Eu, heim! Mais fácil eu não gostar de criança.

terça-feira, março 25, 2008

The fish is on the roof.

A avó telefona pro neto pra saber como estava indo sua terça-feira chuvosa, após uma segunda de cinzas e perdas. Descobriu que tudo ainda ia mals: O Cara tinha caído da bicicleta, por isso estava manco duma pata e vesgo dum olho, e seu pai havia devolvido Dino à pet shop. Dino era o peixinho que tinha sobrado no aquário após a trágica e inexplicável morte de Rex.

- Por que seu pai fez uma coisa dessas?, a vó estranhou.
- Pra ele não ficar muito sozinho, vovó, respondeu o menino, que parecia até muito feliz com o destino providenciado em prol da felicidade de seu peixe.

Agora há pouco, o pai d'O Cara fez um DDD sussurrado para esclarecer que o peixinho Dino também bateu as botas -- "mas, xiiii.... o menino não pode saber". Como meu sobrinho não viu o cadáver boiando no aquário, eles acharam mais bonito esconder a verdade, que não há nada mais desagradável que a verdade, verdade, verdade o tempo todo, sobretudo se a dita é reincidentemente desagradável.

***

Meu lado djindinha acha tudo ótimo, mas minha faceta legista veterinária gostaria muito de saber se a causa mortis pode ter alguma coisa a ver com leite condensado. Talvez nossa família carregue o gene do peixicídio serial.

O céu dos peixinhos (para meu sobrinho Pedro Augusto)



Aquele tinha sido um dia muito difícil pro menino: quando acordou, seus avós não estavam mais em sua casa (tinham saído na calada da noite para pegar um vôo promocional da Gol), ele teve de ir pra escola depois de um longo feriado e, ao chegar em casa, flagrou seu peixinho Rex flutuando de barriga pra cima e com os olhos bem abertos no aquário. Com um puçá, cutucou o cara pra ver se o desvirava, pôs comida para ver se ele comia, ligou e desligou a luz pra ver se ele piscava, mas foi sua mãe quem lhe tocou a real mais dura do dia, talvez dos últimos seis anos: Rex estava morto. Dino estava vivo, mas Rex estava morto. "Por quê?", ele murmurou em tom de queixume choroso. E aí eu não sei o que a mãe dele disse (porque nem sempre a gente consegue ouvir do Rio aquilo que se fala em Salvador), mas provavelmente ela falou a coisa certa: que os peixes duram bem menos que a gente, e que um belo dia a bateria deles pifa e infelizmente a gente não tem como trocar.

O menino chorou boa parte do dia, e do lado de cá, a djindinha dele chorava também, pensando em como é cruel essa função (de ensinar sobre a tragédia inevitável de todas as coisas vivas) que os peixinhos de aquário têm na vida de uma criança. Ela, a djindinha, também um dia viu peixes -- eram três ou quatro -- flutuando em seu aquário. Tinha ela uns cinco anos e era uma contumaz devoradora de leite condensado, o único alimento que se dignava a comer porque era razoavelmente gostoso e ela não tinha apetite pra coisa outra alguma; e porque egoísta não era, um dia ofereceu seu doce aos peixinhos dourados, que afinal lhe encaravam fixamente (sem piscar!), com a boquinha abrindo e fechando, como se estivessem implorando: por favor, menina, me deixa provar! E ela deixou, mas aparentemente o leite condensado lhes infligiu severa dor de barriga, porque ficaram todos com a barriga inchada e virada pra cima em poucos minutos. Quando sua mãe chegou do trabalho e viu aquele cenário de peixicídio, não havia mais nada a fazer além de oferecer aos peixinhos mortos um enterro digno em meio aquático. A menina nunca mais deixou de associar a morte ao conceito de esgoto, tornou-se hipocondríaca e criou fobia de peixe, porque os peixes, afinal, morrem, e morrem bem debaixo do nosso nariz sujo de leite condensado.

***

Minha experiência traumática com o óbito de peixes não me torna, é claro, uma especialista em luto infantil precoce, mas se serve de algum consolo pro meu sobrinho, O Cara, eu tive 30 anos para imaginar bem como funciona o céu dos peixinhos de aquário: o cenário é de desenho animado, tipo Nemo, e a temperatura da água é ótima para afastar tubarões e outros peixes grandes devoradores de peixes menores. De quando em quando, os peixinhos dourados podem sair da água e caminhar pela areia de praias repletas de estrelas do mar vermelhas, onde não há gente para lhes capturar, mas há potes e mais potes daquele farelo próprio para peixes, ao contrário do leite condensado, com a vantagem de que lá, no céu dos peixinhos, eles podem comer à vontade, sem medo de morrer. Também há milhares de castelos com labirintos maravilhosos, onde os peixinhos se escondem e passam horas a brincar.

Eu, que sempre achei que isso era fruto de minha imaginação, juro que vi o céu dos peixinhos numa piscina de recifes ao norte de Natal. Tenho a forte impressão de ter reconhecido dois dos meus amigos por lá, mas eles estavam com muita pressa para brincar de pique-esconde, e aí eu não pude ter aquela certeza concreta, que a gente toca com as mãos, mas as melhores certezas do mundo são aquelas que a gente só sente dentro do coração.

Com amor,

Sua Djindinha

sexta-feira, março 21, 2008

Happy Buzios hour.


Happy Buzios hour.
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Geribá

Buzios


Buzios
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Lua super linda, copo super cheio.

terça-feira, março 18, 2008

A falta que vovó me faz.

Ontem foi dia de Saint Patrick. "Who the hell is he?", eu perguntei pra um amigo inglês que está passando uns dias aqui no Rio. Ele falou que não faz idéia, mas sabe que em dia de São Patrick neguzinho enche a cara. Ele deu um chêgo lá no Shenanigan's e pagou 16 contos numa guiness, e eu perguntei: "Por que tão cara?" E ele praticamente respondeu: "porque é dia de São Patrick".

Domingo eu fui tomar café da manhã com o Joel e com a Monica L e vi uma pá de gente carregando uns raminhos pra lá e pra cá. Tive um feeling de que aquilo era troço de igreja e liguei correndo pra minha mãe pra perguntar: "Por que a galera terceira idade está carregando galinhos pra lá e pra cá?" Ela levou as mãos à cabeça (imagino) e lembrou que tinha perdido a missa de ramos. Perguntei o que diabos era a missa de ramos, e ela responde que era uma missa antes da Páscoa. Fez-se um silêncio de 20 segundos e como ninguém falava nada, insisti: "Hum, e daí?". Daí que ela não sabia.

Todo ano, eu passo por essa crise católico-existencial. Com a chegada da Páscoa e desse monte de coisa misteriosa que vem a reboque -- coelho, ovo de chocolate escondido (e por que escondido, meu deus?!? ) e bacalhau --, vou ficando angustiada de não entender do que se trata este feriado. Pros outros eu cago dez baldes, mas eu tenho uma ansiedade realmente brutal de entender a Páscoa, e a ansiedade é tanta que todo ano eu me informo, e todo ano eu esqueço. Algo como o Feitiço do Tempo, mas só pras informações relevantes à Páscoa.

Eu não entendo a cabeça de quem deu de achar que chocolate combina muito bem com bacalhau, mas se minha avó estivesse aqui, ela me explicaria tudo. Ela, sim, sabia de tudo. Se bobear, sabia até patrono de quê é o São Patrício e porque o ovo de chocolate dele é uma caneca de guiness. Ela tinha explicação pra tudo, curtia tudo, comprava bacalhau já em dezembro, deixava de molho desde janeiro, em fevereiro já tinha escondido todos os ovos pela grama de sua casa, e aí, quando a Páscoa chegava, ela fazia uma cara bem serena, de quem já estava com o almoço de domingo prontinho pra esperar os netos, se sentava naquele sofá atracada com uns novelos de linha e uma agulha de crochê e ia tecendo as histórias que todo o ano me repetia como se fosse pela primeira vez.

Ah, que saudades eu tenho da minha avó!

domingo, março 16, 2008

Raça


Raça
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Xô chororô!

quarta-feira, março 12, 2008

Para minha irmã gêmea

Boundin', filminho de auto-ajuda da Pixar que me faz chorar, depois sorrir, pular e cantar (laralá, lá, laralá...)

terça-feira, março 11, 2008

Lenny, the Kravitz

Grande Lenny, sabe das coisas.

Meu erro

Auto-imagem

Não sei em que momento exato da adolescência os seres humanos começam a se queixar do próprio nariz, só sei que não conheço uma pessoa que nunca tenha reparado - e normalmente isto ocorre nessa fase da vida - que tem um nariz grande demais, ou achatado demais, ou arrebitado demais, ou adunco demais, ou pequeno demais. Nunca ouvi ninguém contando vantagem desses excessos, dizendo, por exemplo, que ter um nariz grande demais é bom porque favorece a oxigenação dos tecidos e, portanto, melhora o desempenho esportivo. As pessoas, sobretudo as mulheres, em última instância, começam a odiar a própria imagem através do nariz. Depois vêm a barriga, o quadril e os peitos, nessa ordem, até que chega um ponto que não sobra quase nada, talvez só um cantinho do lóbulo da orelha que preste, mas depois de noventa piercings até isto acaba. E o que seria da classe joelhoterápica ou plástico-cirúrgica sem isso?

Aos 20 anos, minha irmã, que sempre vestiu 36 e veste até hoje, aos 33, quis fazer uma lipo no joelho. Achava que tinha os joelhos gordos. Eu olhei bem pros joelhos dela, comparei com os meus e reparei que ela tinha (tem) uma estrutura óssea mais larga que a minha - mesmo levando em consideração que ela foi feita numa escala dez centímetros mais alta. Eu não sabia que "estrutura óssea grande", nos Estados Unidos, onde ela já morava então, é um eufemismo para "gordo", o que só piorou seu complexo de obesidade joelhal. Fomos no Daher, cirurgião plástico honesto, avaliar o quão grave era o problema. Lembro que ele teve muita paciência de ouvir o relato choroso de minha irmã sobre sua complexa gordura localizada por dentro dos ossos, e me lembro do esporro que ele deu em minha mãe por permitir que sua filha alimentasse aquela doença da auto-imagem; disse que uma lipo naquele corpo esquelético poderia pôr a vida de minha irmã em risco e, assim, saímos da clínica no Jardim Botânico com o rabo entre as pernas diretamente para a Chaika, onde celebramos a magreza recém adquirida dos joelhos da Samantha. O joelho da minha irmã continua grande até hoje, e talvez por isso ela nunca tenha engordado (porque qualquer acréscimo nas medidas do joelho lhe seria fatal), mas o centro do universo já saiu dali para outras partes.

Uma vez sofri uma queimadura de segundo grau na barriga, um desastre de depilação doméstico, e fui ao consultório de um cirurgião plástico ver o que eu poderia fazer para minimizar as marcas que ali ficaram. Ele me olhou da porta e bradou: Não diga nada! Já sei o que você quer fazer no seu nariz. Ou seja: eu, que tinha levado dez anos para me recuperar do complexo de nariz grande, torto e adunco da adolescência, entrei ali com um problema (queimaduras) e saí com outro (nariz). Foi muita generosidade dele me brindar com um complexo completamente gratuito pelo preço de apenas uma consulta. Passei a ter fobia de cirurgiões plásticos e fico tão nervosa na presença de um como uma pessoa com complexo de maluca ficaria normalmente na presença de Freud.

Quando vou à praia, antes de ficar só de biquini, olho em volta pra ver se encontro olhares que assim, de cara, pareçam pertencer a médicos (sobretudo as médicas) esteticistas, drenadores linfáticos e pessoas que sobrevivam de banhas em geral. Para minha própria paz de espírito, só viro minha bunda na direção de pessoas normais, ou seja: com celulite. Eu desconfio da sanidade mental de toda pessoa magra cuja dieta consista em duas folhas de alface por dia, e continuo achando que, entre a celulite e neuroses profundas, a primeira é muito mais orgânica e salutar. O bom espelho é aquele que nos mostra de dentro pra fora, e não de fora pra dentro.

domingo, março 09, 2008

Pão de açúcar


Pão de açúcar
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Vai pro trono ou não vai?

É de famiglia!

Comentei com meu pai sobre a impertinência de alguns alunos da pós-graduação. Ele, que é aluno elevado, assim como eu, contou de seu primeiro dia numa aula de sua segunda graduação há poucos dias: o professor fez aquela atividade constrangedora típica de início de período, em que todos os alunos se apresentam para a classe dizendo o nome e suas principais características. Numa turma repleta de mulheres, 80% do eleitorado se apresentou como "meu nome é fulana, e eu sou muito ansiosa" ou "eu sou a sicrana, e sou perfeccionista". Meu pai, constrangido, se encolheu na cadeira, mas o professor o encontrou e o obrigou a dizer seu nome. Meu pobre pai, obediente, disse. Parte da turma, que conhece o mau humor da fera, cobrou do professor: ele não falou de suas características! E o professor voltou-se pra sua vítima, meu pai, e pediu: "E você, Jorge, como é?".

- Eu sobrevivo sem muitas dificuldades, respondeu.
- Como assim?!?, a turma de sacanas quis saber.
E meu pai, que perde o amigo sem pestanejar, mas jamais perde a piada, explicou:
- Eu me viro bem num ambiente de pessoas ansiosas e perfeccionistas, mesmo quando elas me enchem o saco.

VanOr de volta às aulas

Há cerca de 10 anos, eu morri na praia na única pós-graduação que fiz na vida, a especialização em Homeopatia Veterinária no Instituto Hahnemanniano do Brasil. O motivo, ridículo: não escrevi minha monografia. Como se eu não gostasse de escrever. Isto sempre foi um motivo de vergonha pra mim, mas o que importa é que agora eu voltei, e voltei para ficar porque aqui, aqui é meu lugar. As aulas que assisti neste final de semana me fizeram ter certeza disso.

Pecuária orgânica (Prof. Lilian Rangel)
Vocês sabiam que a alface hidropônica é completamente poluída por agrotóxicos? E mesmo assim, o hortifruti tem o mal hábito de colocar a gôndola dos hidropônicos, tão limpinhos, bem ao ladinho daqueles tomates feios e esmirrados, opacos (porque não foram lustrados com cêra de agente laranja), superfaturados por causa do selo de produto orgânico? Depois da aula de sexta, aqui em casa só entrarão batata, tomate e morango orgânicos. O DDT não compensa, e não deve ser à toa que tantas pessoas jovens têm aparecido com câncer apesar da falta de histórico familiar.

Também gostei de saber que para um produto ostentar o selo de orgânico, a fazenda auto-sustentável do produtor passa por uma rigorosa e permanente avaliação multidisciplinar do solo, pasto, animais e pessoas. O ambiente deve estar livre de defensivos, os animais não podem usar medicamentos alopáticos (aí entram a homeopatia, a acupuntura e a fitoterapia como alternativas terapêuticas) -- 3 tratamentos alopáticos na vida, e a vaca sai da linha de produção para virar mascote da fazenda, com direito a assistir TV na sala e lacinhos de cetim na testa --, devem ter uma boa qualidade de vida, e as pessoas que trabalham na fazenda devem ter os filhos na escola e seus direitos constitucionais à saúde, alimentação, moradia, etc, completamente assegurados. O produtor orgânico é muito mais que um rostinho bonito, como o Marcos Palmeira: ele é uma pessoa orgânica e integral, um ser humano de verdade, e não um monstro que confina vacas e galinhas num espaço que mal comporta o tamanho de seus corpos, transformando-as em tristes máquinas de produzir ovos e leite.

Não se admirem se eu, dentro de poucos dias, me tornar vegetariana novamente. Ovo-lacto, é claro, mas só se o ovo e o "lacto" forem orgânicos.

Comportamento Animal (Prof. João Telhado)
O Telhado, maior autoridade em terapia comportamental no país, é uma figurinha rara. Com um sotaque português fortíssimo e humor ácido, suas aulas são divertidíssimas e a única coisa que eu detesto nelas são os alunos exibicionistas que sempre têm um causo pra contar, mas cujos relatos nunca acrescentam nada à aula, pelo contrário: só tomam o tempo do professor e a paciência dos alunos mais elevados, como, obviamente, eu. Tudo bem, compreendo que o tema seja extremamente agradável e sei que praticamente todas as pessoas que tenham ou gostem de bichos se identificam plenamente com os assuntos que dele derivam, mas peralá: que tipo de ser humano interrompe um professor de pós-graduação, num curso caro, cobrado por aula, para dizer que meu gato faz essa coisa fofa, e o gato do vizinho faz essa coisa feia? Sinceramente, em certas pessoas a gente devia enfiar uma mordaça ou um daqueles colares que soltam choque elétrico toda vez que daquela goela brota um comentário impertinente. Não seria uma forma orgânica de tratar o coleguinha, eu admito, mas acho que ainda tenho de comer muito capim até chegar a Marcos Palmeira.

sexta-feira, março 07, 2008

Diplomacia numa hora dessas, nêga?

Não sou a pessoa mais viajada do mundo, mas já dei minhas voltas por aí. Nunca carreguei na bagagem de mão cartas, protocoladas em delegacias de polícia, dos amigos que caridosamente me hospedam assumindo total responsabilidade sobre minha estrangeira pessoa durante as férias nos países onde eles residem -- e que eu não visitaria de outra forma, posto que dinheiro pra hotel, a-ha, não tenho! Não tenho dinheiro, nem tampouco a intenção de jogar pro alto minha vida no Brasil e estender as férias num país estrangeiro para sempre. Meus amigos, por outro lado, têm mais o que fazer que ir a uma delegacia carimbar uma carta tão ridícula. A impressão que tenho é que países como a Espanha e os Estados Unidos andam com o ego inflado demais, achando que tudo o que nosotros queremos é trocar o Flamengo pelo Manchester, a cachaça pelo Porto e cuspir em nossa pátria para ter a incrível chance de lhes lustrar os sapatos com o lábaro que deveras ostentamos estrelado.


Foi com enorme choque e horror que acompanhei esta semana a via crucis dos brasileiros mantidos em cárcere, privados de água, comida e banho por até 3 dias no aeroporto internacional de Madri. Meu choque nem é tanto pela quantidade assustadora de brasileiros deportados ao desembarque na Espanha, mas sim pelos requintes de crueldade com que foram tratados e pelo julgamento preconceituoso destinado às mulheres naquele país. Uma aluna de física da USP, talvez o perfil sócio-cultural menos provável para uma prostitua, acredita que tenha sido mal vista pelo decoro espanhol. O que é o fenótipo potencial de prostituta para essa gente? Será que eles me deixariam desembarcar em Madri novamente, como no ano passado? Será que da próxima vez os federais do aeroporto não poderiam achar que eu - que afinal de contas não sou nenhum bagulho, sou mulher, tenho energia e muito amor pra dar -, sou uma potencial prostituta? Será que eles pensam que toda mulher é (uma potencial prostituta) pelo simples fato de possuir o produto, mesmo sem o o talento, ou a necessidade, ou o desejo para o vender? Será que prostituta, pra essa gente, é qualquer mulher latina, morena e bonita?

Estou estremecida com a Espanha. Os espanhóis de bem que me perdoem, mas esses eventos todos, tão perto do Dia Internacional da Mulher, só me fazem ter uma certeza: agora só retorno à Espanha depois que el gobierno tratar desse ego inflado com um pouquinho de cortesia, espírito humanitário e vergonha na cara.

A grave crise em Portugal

O trecho a seguir é um bem-humorado relato de minha amada Cristina Alves, companheira portuguesa de luta e correspondente de guerra:


"Quanto aos homens de Lisboa nada posso adiantar. Nem sei se nesta cidade existem exemplares daquilo que temos por hábito chamar de 'homens'. Existem exemplares masculinos, sim. Hetero, raros. Heteros e solteiros, ninguém sabe onde - é como o Santo Graal. E encontrar esse tal hetero, solteiro e além do mais, interessante, é como encontrar unicórnios brancos a passearem pelo Chiado. Não há notícias de nenhum.

Como vês as frases saem-me curtas e incisivas. É como ter um nó na garganta e não conseguir engolir. Nós, as mulheres portuguesas, estamos a passar por um momento doloroso.
Qualquer dia começamos a importar esperma, o que vai resolver o problema da renovação da população portuguesa, mas que por outro lado, vai pôr em causa a existência do "puro" português. O marialva que em tempos idos, por uma mulher, se sujeitava a facadas e tiros de maridos, irmãos e pais enraivecidos, que se deixavam deserdar por amor a uma bela mulher. Isso já é só literatura e daquela dos tempos idos."


***

Ou seja: a crise é geral!

quarta-feira, março 05, 2008

CCBB


CCBB
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Pobre blog abandonado!

Putz grila, mangalô três vezes!

Para penetrar na penumbra abandonada deste abafado quartinho hoje, tive de remover teias de aranha, varrer montanhas de poeira e abrir portas e janelas cujo o tempo tratou de carcomer de ferrugem. Fiz circular um ar, acionei meu aspirador de pó ultra-power turbinado, fiz uma aromaterapia básica de canela com patchouli pra elevar o astral (com uma nota de sensualidade, que não custa nada), amarrei minhas fartas madeixas num lenço de chita estampada e fiz o que eu sei fazer melhor nesta vida: faxina! Agora me sinto bene.

Venho por meio deste humirde poster dizer que estou mais viva que morta, embora morta seja a palavra certa para me definir às vezes. E porque morta é palavra certa pra me definir (às vezes), tem horas em que eu tenho muita vontade de ficar quietinha no meu canto sem fazer porra alguma, nem mesmo escrever -- que não é a coisa que eu faço melhor, mas é a coisa que eu mais gosto de fazer. Há momentos em que até eu me assusto com as coisas que eu penso em escrever, e que eu só não escrevo porque depois fico com tanto medo de ler aquilo que escrevi (quando muito triste, como aquele diário de 1998 que eu esqueci exilado na casa da minha joelhaçoterapeuta de então), que passo a não ler mais nada, e se eu não leio mais nada, vou ficando cada vez mais morta e alheia a tudo que está ao meu redor, e isso não é muito bom.

Só queria dizer que estou tomando providências para resolver meu próprio abandono e que, quando isto acontecer, este quartinho nunca mais ficará tão abandonado de novo. Primeiro os bois, depois o carro. Afinal, aqui quem fala é uma veterinária que não matou o husky siberiano no IJV, mas mataria com prazer a anta que espalhou essa besteira. No sentido figurado, ma non troppo.