Este é o meu quartinho de bagunça. Da embalagem vazia de Chokito ao último livro do Saramago que eu não terminei de ler, você encontrará aqui de tudo um pouco.

segunda-feira, outubro 30, 2006

Uma mensagem de esperança pros 40% que não votaram nelle.

Elis Regina / Gonzaguinha Redescobrir 1980

Quando vi este clipe da Elis cantando Redescobrir, com uma bela e reconfortante surpresa incidental ao fim, chorei feito um bebê. O Lula ganhou e eu não estou feliz com isso, mas a Elis mesma dizia que já que taí, pela metade mas tá, melhor cuidar pra peteca não cair, pra não deixar escapulir como água no ralo. Este continua sendo meu país e vou torcer por ele e por sua governabilidade.

Redescobrir (Elis Regina)
Autor: Luiz Gonzaga Jr.

Como se fora brincadeira de roda, memória
Jogo do trabalho na dança das mãos, macias
O suor dos corpos na canção da vida, história
O suor da vida no calor de irmãos, magia
Como um animal que sabe da floresta, perigosa
Redescobrir o sal que está na própria pele, macia
Redescobrir o doce no lamber das línguas, macias
Redescobrir o gosto e o sabor da festa, magia
Vai o bicho homem fruto da semente, memória
Renascer da própria força, própria luz e fé, memória
Entender que tudo é nosso, sempre esteve em nós, história
Somos a semente, ato, mente e voz, magia
Não tenha medo, meu menino bobo, memória
Tudo principia na própria pessoa, beleza
Vai como a criança que não teme o tempo, mistério
Amor se fazer é tão prazer que é como se fosse dor, magia
Como se fora brincadeira de roda, memória
Jogo do trabalho na dança das mãos, macias
O suor dos corpos na canção da vida, história
O suor da vida no calor de irmãos, magia

Fim de semana musical

Lau ouvindo a trilha do mar e experimentando a crocância musical do biscoito Globo, que só tem no Rio.



Neste fim de semana, pude fazer algumas constatações musicais:

1) Embora eu tenha escolhido uma música agradável pra tocar no meu celular sempre que me ligam, descobri -- depois de uma tarde inteira de sábado sem meu Motorola respirador-artificial, como diz a sábia Monica L -- que sou muito mais feliz sem celular. E é um alívio tremendo descobrir que a musiquinha familiar que ouvi no quiosque de alguém não é uma chamada pra mim. Será por isso que tanta gente afoga o celular na privada e diz que foi sem querer?

2) Mônica Salmaso é uma elegante cantora instrumental.

3) Acordeão está para a trilha do cinema italiano como o samba está para o carnaval.

4) A trilha sonora deste segundo turno deveria ser o negativo do refrão de "É", do Gonzaguinha:

É
a gente não tem (TEM, sim!) cara de panaca
a gente não tem (Ah, TEM sim!) jeito de babaca
a gente não está (ESTÁ, SIM!) com a bunda exposta na janela pra passar a mão nela



5) O que chamam de música experimental, eu chamo de motor batendo pino.

6) O iPod é muito mais difícil do que parece.



Tim Festival


Tim Festival
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Olha quem eu achei no Tim? Ou melhor: quem eu não perdi um minuto sequer.

sexta-feira, outubro 27, 2006

A imensidão é azul.


A imensidão é azul.
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Quero voltar a nadar. Nadar é estar dentro do azul.

quinta-feira, outubro 26, 2006

Como diria o TOM TABORDA... O Que Dizemos Nos Define!

Descobri, hoje, no blog da Cora que a Meg tinha publicado um texto genial e exclusivo do Tom Taborda sobre linhas editoriais. Juro que tentei não sentir inveja da Meg por ter tido o privilégio de publicar um Tom exclusivo, mas não houve jeito: eu sou humana, gente, e fiquei com aquilo na cabeça o tempo inteiro. Escrevi pra ele pedindo autorização pra publicar um texto exclusivo. Ele, que é um tímido de carteirinha, topou, pra minha surpresa.

Enjoy, guys. Não é todo dia que a gente tem essa sorte!


O Que Dizemos Nos Define
Tom Taborda
(27/01/04)



O modo com que uma determinada Cultura vê o mundo à sua volta se traduz perfeitamente pelas palavras que usa para nomeá-lo. Dizem que os esquimós têm algumas dezenas de palavras diferentes para o que chamamos simplesmente de 'neve'. Assim, para os puritanos ingleses, um animal quando vivo tem um nome e servido à mesa é rebatizado, para que o comensal sequer associe aquilo que come a qualquer coisa que caminhe, ou voe: o 'pig' vira 'pork', 'bird' vira 'poultry', 'flesh' vira 'meat' e 'raw' vira 'rare', quando para nós, o porco é porco, a ave é ave, a carne é carne e cru é cru. Com o quê nos regalamos, sem pudores.

E como é, portanto, que os americanos — esse povo reprimido, histérico e puritano a ponto de quase levar aos tribunais um garotinho que tascou um beijo numa coleguinha durante o recreio — podem pretender se arvorar como condutores da sexualidade e comportamento mundial? Vamos lá:

Para começar, não existe na língua inglesa equivalente para o nosso delicioso verbo 'namorar', que tem suas raízes em 'en-amor-ar', ficar 'cheio de amor', quer coisa melhor? Lá, as pessoas estão apenas 'se encontrando' (dating) e nada mais — Argh! —; logo, se não se namora, tampouco existe a(o) 'namorada(o)', que se torna a burocrática 'date', dizendo "ela é meu encontro"; ou o dúbio 'girl(boy)friend', onde termina a 'amizade' e começa o 'namoro'? A resposta, bem a calhar, depende do uso ou não do possessivo: se for dito "my girlfriend" é namorada, apenas "a girlfriend", amiga. E eles têm 'infatuation', que mais parece uma doença (e a consideram assim; aqui, podemos 'sofrer de amor', mas não elevamos à categoria nosológica), tipo 'flatulência' Quer coisa pior?

Aqui, o ritual da 'corte e acasalamento' tem tantas nuances, quanto nomes para as diferentes gradações e estágios: 'paqueramos', 'azaramos', 'ficamos', temos 'amizades coloridas', estamos 'juntos', 'noivos', 'vivendo juntos', ou 'casados'. Tudo com a malemolência e a imensa flexibilidade que também nos separa de nossos primos hispânicos que radicalizaram: para eles, uma singela 'namorada' já é a comprometedora 'novia', praticamente às portas do altar. Mas, voltando aos americanos: 'afagos' e 'carícias' sexuais recebem o nome de 'petting', que é algo a se fazer com seus animais de estimação (pets). Nosso gostoso 'beijo de língua', para eles é tão estrangeiro que é chamado de 'french kiss'.

Por outro lado, paradoxalmente na linguagem coloquial, o americano médio é um 'cu sentiente', um cu com uma pessoa em volta; ouvimos o tempo todo nos filmes: "get your ass outa here!", "move your ass!", ou "kiss my ass!" (que não é um convite lúbrico, mas um insulto!). De fato, o cu deles é tão importante que, enquanto nós 'puxamos o saco', eles enfiam os narizes no cu dos respectivos chefes, o denominado 'brownosing', um conceito graficamente expresso de forma absolutamente nojenta.

Uma amiga minha, tradutora, descobriu que não temos uma palavra para 'stalker', aqueles tarados compulsivos que se comprazem em intimidar suas vítimas, fazendo-as notar que eles estão sempre ali, ameaçadoramente observando-as. Isso não existe para nós, sequer temos um termo para eles. Mais uma vez, viva nós! Nossa alma latina e afro-lusitana.

Os xingamentos são também curiosíssimos: os dois piores envolvem a mãe, como aqui, mas de uma forma completamente diferente. O 'bastard' somente indica o status inferior do insultado, enquanto o nosso 'FDP' desmerece a 'santa mãe' do outro. Mas, considero bem mais curioso o pesadíssimo 'motherfucker', que só vejo três possibilidades: ou o insultado é um pai (e o xingado bem que podia retorquir "YOUR father is a motherfucker!"), ou transa com as mães vizinhas (e acrescentar, machistamente, "and MY father is even a more prolific motherfucker: he did yours!").

E um detalhe, nos arroubos verbais sexuais, é de um edipianismo/incestuosismo ridículo e freudianamente assustador: a invocação do 'daddy' (ela: "give it to me, daddy!"; ele: "who's your daddy?"). Eca!

Tem também o estranhíssimo 'pussy eater' ('comedor de buceta'), que ao invés de enaltecer o sujeito, o denigre justamente por agradar a mulher! Trazendo embutido o conceito que um homem se degrada ao fazer sexo oral com a mulher. Tudo na cultura americana indica que sexo oral é submissão, a começar pela expressão 'go down on'.

Mas, francamente, cá para nós: um povo que precisa de um artigo, publicado num dos mais visitados portais da Internet, ensinando "How to Deal With a Feeding Breast" ("Como Lidar com [a visão] de um Peito Amamentando"), ou que chama aquilo que pedimos como 'beijinho' ou 'chupetinha' de 'blow job' não tem nada a ensinar ao mundo a respeito de sexo, pois não entendem nada mesmo do assunto: além de tornar em 'job' o que deveria ser um prazer, até hoje, ainda não se deram conta que não se sopra (blow), mas se chupa (suck)!

quarta-feira, outubro 25, 2006

A gramática de merda (ou a gramática merderna)

Diz um e-mail que eu recebi ontem:
A palavra MERDA pode mesmo ser considerada um curinga da língua portuguesa.

Exemplos:

Como indicação geográfica 1:
Onde fica essa merda?

Como indicação geográfica 2:
Vá a merda!

Como indicação geográfica 3:
18:00h : vou embora dessa merda.

Como substantivo qualificativo:
Você é um merda!

Como auxiliar quantitativo:
Trabalho pra caramba e não ganho merda nenhuma!

Como indicador de especialização profissional:
Ele só faz merda.

Como sinônimo de covarde:
Seu MERDA !

Como questionamento dirigido:
Fez merda, né ?

Como indicador visual:
Não se enxerga merda nenhuma!

Como elemento de indicação do caminho a ser percorrido:
Porque você não vai a merda?

Como especulação de conhecimento e surpresa:

Que merda é essa?

Como constatação da situação financeira de um indivíduo:
Ele está na merda...

Como indicador de ressentimento natalino:
Não ganhei merda nenhuma de presente!

Como indicador de admiração:
Puta Merda !!

Como indicador de rejeição:

Puta Merda !!!!

Como indicador de espécie:
O que esse merda pensa que é ??

Como indicador de continuidade:
Na mesma merda de sempre.

Como indicador de desordem:
Tá tudo uma merda!

Como constatação científica dos resultados da alquimia:
Tudo o que ele toca vira merda!

Como resultado aplicativo:
Deu merda.

Como indicador de performance esportiva:
O Flamengo, o Grêmio, o Palmeiras, o Fluminense, o Corinthians
o Vasco,e o Coxa não estão jogando merda nenhuma!!!

Como constatação negativa:
Que merda !!!!

Como classificação literária:Êta textinho de merda
O autor é desconhecido...eu não escrevi essa merda não...

UM ANO DE BLOG

Confesso, para os devidos fins e efeitos, que criei este blog pelos motivos errados. Ou que o criei pelos motivos certos (poder comentar no blog do Ribondi, que não vingou), mas o mantive por teimosia e pelos motivos errados. Tão errados que nem vale à pena se falar sobre isso. O que vale é lembrar que, 365 dias e 66 mil hits depois, eu fiz amigos valiosos aqui. Este quartinho será sempre o cômodo preferido de meu coração, e por isso convido todos a tomarem um negocinho qualquer comigo neste sábado à noite, aqui no Rio de Janeiro, no boteco de vossa preferência (a definir, nesta caixa de comentários, nos próximos três dias).

***

ATUALIZAÇÃO:

Como isto aqui é uma democracia, está resolvido: o encontro começará no Teatro Rival, neste sábado, onde ocorrerá show da cantora Monica Salmaso às 20h30. Ingressos a 30 ou 25 reais, estudante /terceira idade = meia entrada. Detalhes no site do Teatro Rival. Se o show não for muito triste, daquele tipo que faz a gente ir correndo pra casa abraçar um bichinho de pelúcia e se afogar em uísque, a gente pode seguir pra Lapa, onde mil atrações etílico-musicais nos aguardam. Esta segunda parte eu não quero combinar, não: na hora, a gente vê. Liberdade não é só passar a mão na bunda do guarda: é deixar o sábado em aberto.

As presenças do Lucas (meu personal photographer & blog-designer), da Cora (fada madrinha) e do Povo do Blog são fundamentais. Além, é claro, do meu Lauzinho: prova concreta de que há vida inteligente, romântica e amorosa (ao mesmíssimo tempo) na internet.

terça-feira, outubro 24, 2006

Recadinhos

Princesa Radija e Povo Brasileiro em maré alcalina pós-prandial.


Toda vez que meus pais vão a Miguel Pereira e eu não, eu mando um recadinho pra Princesa Radija. Geralmente é a camisola que eu dormi na véspera ou uma meia usada (para a intensidade do recadinho, quando mais usada, melhor). Radija fica enlouquecida quando mamãe lhe entrega o recado: primeiro dispara com a peça na boca, contraindo as comissuras labiais daquele jeito que cachorro faz quando está feliz; depois, joga o recadinho pra cima e pra baixo, cheira, chafurda, morde e corre até meus pais pra que eles também tomem conhecimento da notícia. Então, vai pra sua caminha com o recadinho cuidadosamente preso à boca e acalma-se à medida em que assimila a mensagem, que invariavelmente é: mamã ama muito-muito, mamã tátusaudade, mamã pensa tucê tempo todinho-todinho.


Parece que ela entende, pois quando eu subo a serra, muito de vez em quando, ela vem me buscar no portão com aquela cara incrível de quem recebeu cartas de amor perfumadas e que mal podia esperar pra ver o remetente de novo.


Na sexta passada, ajudando minha mãe a carregar o carro pra subida da serra, lembrei -- no estacionamento já -- que não tinha separado o recadinho pra minha Princesa. Sob os olhares perplexos das câmeras de segurança e do garagista do condomínio, tirei o sutiã pela manga da camisa e entreguei pra minha mãe. Sorte que eu estava de sutiã, senão teria de voltar pra casa semi-nua. Jamais perco a oportunidade de dizer eu te amo.


***

PS: alguns de vocês poderão perguntar: mas e o Povo, não recebe recadinhos? Não, porque o Povo Brasileiro tem muita preguiça de interpretar mensagens. Ele prefere que a Radija receba e depois conte tudo pra ele. Sorte do Povo que ela é totalmente de confiança e nunca deturpa a verdade. Não é todo povo que tem essa sorte.

domingo, outubro 22, 2006

Quebrando tabus

Um post da Maria Paula* me fez perceber que as mulheres perderam a vergonha de entrar em sex shop. Antigamente, pra ir a uma loja dessas, era necessário vestir sobretudo, chapéu, pôr bigode postiço e torcer pra não ser vista. Confesso que eu mesma, se quisesse ir a uma sex shop, sentava na lanchonete ao lado, fazia um brunch interminável, lia todo o jornal, me espreguiçava e, duas horas depois, olhava pra loja que eu queria ir desde o início, com cara de "Ué, que lugar estranho será este?" e entrava, simulando mera curiosidade sócio-antropológica.

Entrar numa dessas sex shops da idade da pedra, com suas vitrines pretas, ar viciado e neon a la bordel, me dava a sensação tenebrosa de estar penetrando (com trocadilho, por favor) um submundo sinistríssimo ou adentrando a ante-sala do inferninho. Se eu encontrasse um homem atendendo no balcão, então, me limitava a ver etiquetas de preço e não encontrava a coragem necessária para pedir pra ver a nova camisinha feminina ou outras coisas de que as revistas femininas ou Sex and the City falam. Não me considero tímida, mas num ambiente lúgubre daqueles, tudo o que eu menos queria era iniciar uma conversa casual sobre sexo com gente estranha em festa esquisita. Pode ser um defeito de fabricação meu, mas sexo pra mim não é roxo, preto e nem vermelho: é branco, azul, fresquinho e arejado, de forma que eu não me sentia nada à vontade naquelas cavernas com clima de punheteria de auto-mecânica.

Hoje, como a Mary bem lembrou, há lojas lindas de apetrechos sexuais pensadas para a mulher. Nelas, tudo é rosa e lilás, da logo à vitrine, o ambiente é arejado e perfumado, e as atendentes são mocinhas bonitas e saudáveis, recém saídas da puberdade, que poderiam perfeitamente ser vendedoras da Cantão ou da Ecletic. Dá gosto de ver! Se você porventura tiver dúvida sobre o funcionamento do rabbit com pérolas metálicas, elas vão descrever em detalhes (porque está cientificamente provado, por algum americano desocupado, que mulheres falam cinco vezes mais que os homens, por isso dão tantos detalhes) como usar o brinquedinho; e ainda vão explicar como ele fica muito melhor com o gel mentolado que solta fogos de artíficio em contato com a pele, e como você pode associar o rabbit, o gel e o namorado ao mesmo tempo sem contraindicações ou risco de contorções. Como as atendentes são treinadas para simular sua melhor amiga, elas vão dizer que já fizeram tudo isso com o rabbit, o gel, o estimulante, o vibrador e as bolas de pompoarismo e que a-ma-ram. E que o sexo anal pra elas nunca mais foi uma coisa dolorosa, e vão dar relatos pessoais extraídos de algum manual de treinamento razoavelmente bem escrito, por quase convincente que é.



***

Tenho uma grande amiga que diz que toda mulher, hetero ou homo, solteira ou não, deve ter um vibrador pra chamar de seu. Hoje, com toda essa facilidade das lojas de apetrechos sexuais women-friendly, só não tem seu personal brinquedinho quem não quer. Este, espero, é mais um tabu que caiu por terra.



***

* O blog da Mary fica em http://www.segredinhosecretinhos.blogspot.com. Não consegui linkar porque há mais entre o Blogger e a terra do que supõe nossa fã filosofia.

sexta-feira, outubro 20, 2006

Muito engraçado, esse tal de Gero!



Disse a Jussara, cá neste bloguito:

Pérola colhida no Programa Furado do Rio Show de hoje:

Reclamação da cliente: Fui conhecer o famoso Gero crente que ia aproveitar o melhor da gastronomia e fui obrigada a me intoxicar com os fumantes do local, que nem tem área especial. Não existe uma lei proibindo o fumo em recinto coletivo e privado?

Rogério Fasano, dono do Gero, responde: "O problema da lei é que ela é estadual. Em São Paulo e outros estados, essa proibição não existe. Como recebemos clientes de fora, fica difícil controlar. Peço desculpas e lamento que a leitora não tenha gostado da casa."

Sou só eu que acho ou a resposta do Fasano é o cúmulo do absurdo?


Não, Ju: você não foi a única a achar absurda a resposta do Fasano (seria o cretinismo um mal numerológico?). Geral na Vigilância Sanitária Municipal do Rio de Janeiro achou. Anotamos mais este queixume do Povo X Fumantes Fora da Lei e tomaremos as providências cabíveis.

Ora, veja se pode! A lei que proíbe o fumo em ambientes fechados é federal, o que significa que vale em todo o território nacional, o que inclui o ar bafejado em restaurantes de preços exfoliantes, como o Gero.

Se mais alguém souber de restaurantes, faculdades e ambientes fechados e climatizados onde o fumo ainda é tolerado, anotem o endereço completo do estabelecimento meliante e liguem para 2503-2280*. Reclamem! Exerçam sua cidadania!

* Atendimento de seg a sex, de 9 às 17h, apenas para o município do Rio de Janeiro.

quinta-feira, outubro 19, 2006

Liberdade é um canivete, um pecorino e uma garrafa quente de Chianti.


O conceito de liberdade está intimamente associado à transgressão. A idéia é essa: ninguém pode ser completamente livre se obedece a todas as regras e convenções. Minha musa teen, Alanis Morissette, recomenda, por exemplo, que se ande pelado pela sala e que se ponha mais comida na boca do que o cavidade bucal comporta. Ela recomenda, aliás, que se enfie o pé na boca -- por que não?!? A qualquer momento. Seria surpreendente se, durante uma reunião pentelha com pessoas pentelhas do seu trabalho, você tirasse seu lindo sapatinho, desse uma cheirada básica no pé pra ver se ele está em condições de ser mastigado, e TCHOC: enfiasse o dedão do pé na boca diante de uma platéia estupefata. Isto sim, seria liberdade!

Casseta & Planeta (ou talvez o Planeta Diário) venderam, por muitos anos, camisetas dizendo que liberdade é passar a mão na bunda do guarda. Concordo plenamente, como não? E se o guarda der aquele pulinho de susto e uma olhadinha indignada pra trás, melhor ainda: mais liberdade ainda!

Acho que o momento de minha vida em que fui mais livre foi num dia de verão na Toscana, em que eu já acordei dizendo que não ia pentear o cabelo e foda-se. Se meu cabelo já é uma bosta penteado, despentado é ó-do-borogodó, de forma que não penteá-lo é um grito de independência sem tamanho. Eu tinha acabado de comprar um sutiã, peça que não uso por injustificabilidade anatômica, porque os italianos reparam se você está de sutiã ou não (independente do seu volume mamário), e eu particularmente acho isso muito inconveniente; mas nesse dia, em que eu acordei com o ovo virado, disse que não ia usar porcaria de sutiã nenhuma. E entrei nos prédios sacro-medievais assim, de camiseta de alcinha, sem sutiã, sem lenço nem documento. Estava pronta pra dizer pro primeiro guardião da moral e dos bons costumes que me abordasse que não capisco mesmo, nem vem que não tem, cadê meus direitos humanos de ser estrangeira onde eu bem entender? Naquele dia, pode-se dizer, eu estava com o diabo no corpo. E foi um dia maravilhoso!!!

De repente, de prédio medieval em prédio medieval, conheci o melhor sabor do mundo: queijo pecorino. Provei todos os tipos numa lojinha medieval, que dava aos queijos um sabor ainda mais maturado, e resolvi que só ia comer pecorino na minha vida daquele momento em diante. "Não", disse minha companhia, "vamos nos reservar pro jantar." A gente tinha se programado pra jantar em algum lugar cuja rota já estava milimetricamente calculada no GPS do carro, e aquele planejamento todo, mais a idéia de que eu teria de pentear meu cabelo pra ser admitida como cliente num restaurante, me deu um nervoso medonho. Implorei de joelhos: "Por tudo que me é mais sagrado: é muito importante que hoje eu só coma pecorino. E beba vinho, porque cai muito bem. Se eu comer qualquer outra coisa, sinto que vou morrer pra sempre." Como se fosse possível morrer por uns instantes. E então -- chantagem feita, chantagem bem sucedida --, compramos o maior pecorino que eu já vi em toda a minha vida, duas garrafas de Chianti e fomos pra praça da matriz da cidadezinha para ver o pôr-do-sol. Não tínhamos abridor, faca, guardanapo, nada, mas eu tinha um canivete suíço que me acompanha desde os 19 anos e, com ele, cortamos o pecorino, abrimos as garrafas sem o auxílio dos dentes, bebemos às gargaladas (e gargalhadas) enquanto comíamos o queijo mais gorduroso do mundo e limpávamos a mão na calça, no cabelo e na cara um do outro, sem nunca deixar de falar mal (em português de baixíssimo calão) das pessoas que passavam e nos olhavam com espanto.



Hoje eu saí da ginástica e passei no supermercado pra comprar um pecorino: 30 g = 4 pontos. Isso não seria nada, se 30 g de pecorino não tivessem quase que o mesmo tamanho da unha do dedão do meu pé. Talvez seja por isso que a Alanis recomendou chupar o dedão do pé: equivale a um pecorino, em termos de liberdade, mas é zero ponto. Dependendo do estado do pé, talvez até menos.

quarta-feira, outubro 18, 2006

Aniversário


Aniversário
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Aniversariante do mês: Marina em fase solar.

terça-feira, outubro 17, 2006

Vox ubaldi, vox populi.

Neste domingo, 15 de outubro, João Ubaldo Ribeiro lavou nossa alma com este texto sobre o peculiar tratamento que a Polícia e a Patrulha dos Direitos Humanos (dos outros!) deram à senhorinha de 67 anos que atirou num assaltante em legítima defesa. Quando todas as vozes parecem ter se calado de vergonha, eis que surge o verbo do Ubaldo provando que esse triste silêncio é só uma faceta tímida -- talvez cansada, talvez puta-da-vida -- de nossa indignação.


Taí, agora senti firmeza

João Ubaldo Ribeiro

Vou contar muito resumidamente a história, apesar de ela ter saído em todos os jornais, porque já se passou mais de uma semana e nossa memória não é muito bem-falada. Uma senhora de 67 anos, d. Maria Dora dos Santos Arbex, ao ser atacada por um assaltante, abriu a bolsa, sacou um revólver e deu um tiro na mão do agressor. Desejo manifestar minha modesta opinião sobre o assunto e parte do que, pelo menos até o momento, ele rendeu.

Minha opinião, a julgar pelo que tenho lido, deverá ser considerada perniciosa, retrógrada, reacionária, insensível, censurável, quiçá burra e certamente ignorante, no ver de muita gente. Fico chateado com isso, porque sempre me achei progressista e meu pai se esforçou tanto para que eu tivesse uma formação razoável. Mas não posso fazer nada, porque, como disse, pretendo opinar sobre esse assunto e – digito estas palavras com os dedos trêmulos – a verdade é que estou com d. Maria Dora e não abro. E, desta forma, talvez esteja sujeito a ir em cana na companhia dela, pois todo o episódio demonstrou como é longo e rigoroso o braço da lei, que não irá poupar-me quiçá de uma alegação de cumplicidade (sim, porque estou disposto a abrigar ilegalmente d. Maria Dora em minha casa, caso ela precise foragir-se devido a seu grave delito) ou várias outras malfeitorias que a ordem pública defina.

Todas as desculpas que poderiam ser alegadas em nosso favor são inaceitáveis não só pela lei como pelo pensamento politicamente correto. Começa pelo fato de que d. Maria Dora realmente não podia estar portando uma arma. É proibido por lei, porque o Estado detém o monopólio da violência e não admite que ele seja violado, como sabe, por exemplo, qualquer cidadão do Rio de Janeiro e São Paulo – e, neste último, a polícia foi muitas vezes alvo de bandidos, mas é que os bandidos não foram bem informados. No mais, todo mundo sabe que a lei é justa, mais do que justa, porque o Estado protege a nós todos e ninguém aqui pode queixar-se de falta de segurança. Não só é lei como é realidade. O Estado protege inclusive os fracos e ninguém aqui precisa proteger a si mesmo. Ponto contra nós, d. Dora. Mal comecei e já tenho certeza de que a gente vai se dar mal nesta, de ponta a ponta.

Em segundo lugar, admitamos também, está inteiramente errado a senhora ferir o assaltante. O certo, todo mundo sabe, seria a senhora ser ferida ou morta pelo assaltante. É esse o procedimento adequado, adotado por centenas de bons brasileiros, todos os dias. E a senhora vai e fere o assaltante, sem perceber o egoísmo e a falta de espírito público de seu gesto. Se o assaltante, Deus a livre e guarde sempre, tivesse matado a senhora, seria mais uma oportunidade para lamentarmos a violência urbana, fazermos camisetas com seu nome e abraçarmos o Parque do Flamengo, ou qualquer coisa assim.

Não esqueçamos ainda que a posição politicamente correta é a favor do assaltante. Digo mais, d. Maria Dora, acho que a senhora vai ficar surpresa com isto, mas é verdade: assaltante é esquerda, assaltado é direita. Assim de primeira, sei que é difícil de acreditar, mas, considerando que, se perguntada o que quer dizer esquerda e o que quer dizer direita, a maioria dos auto-intitulados intelectuais de esquerda não saberá o que responder por ignorância mesmo e gaguejará abundantemente, acho que a senhora entenderá com mais facilidade que assaltante é esquerda e assaltado é direita.

Como a senhora sabe, de uns tempos para cá, ninguém é culpado de nada. Considerar alguém culpado de alguma coisa é horrivelmente incorreto, desde o momento glorioso em que a psicanálise e a sociologia invadiram os botequins. Agora todo mundo é vítima, ora das circunstâncias sociais, ora dos traumas psíquicos. Ninguém é mau-caráter, mentiroso, preguiçoso, violento, vigarista etc., é todo mundo vítima de alguma coisa. Culpar alguém, vamos ter de reconhecer, d. Maria Dora, não está com nada. Quer dizer, culpar a senhora pode, porque a senhora não teve a famosa origem miserável, causa principal da delinqüência, segundo as versões botecais das referidas ciências. Eu também não, isso é horrível e venho até escondendo o fato de que, por exemplo, nunca passei fome em minha vida, pois está ficando feio para o Novo Intelectual, o que lá seja isso.

Segundo também soube pelos jornais, o pobre assaltante vivia praticando sua arriscada e ingrata profissão há muito tempo por ali mesmo e costumava, sem que a polícia fizesse nada, achacar ou assaltar os moradores da área, o que teria levado d. Maria Dora a portar a arma. Não houve compreensão por parte desses moradores, como não há compreensão por parte dos moradores de todas as grandes cidades. Deviam cotizar-se para garantir o sustento do infeliz. Deviam oferecer-se como voluntários para o assalto do dia, a fim de que ele não se sentisse um inútil, sem exercer sua profissão e, portanto, socialmente excluído.

Soube finalmente que, para a prisão da d. Maria Dora, mobilizaram-se oito viaturas policiais. Pouco, talvez, mas acabou se revelando suficiente. Não sei qual será o destino judicial dela, mas certamente o do assaltante, se houver, será bastante menos severo. E, além disso, de mau exemplo para baixo, d. Maria Dora já vem sendo desancada pelos especialistas. Portanto, d. Maria Dora, nosso caso está perdido, a lei, a ordem e a segurança estão garantidas. Com a nossa prisão e a de indivíduos que pensarem como nós, a tranqüilidade geral será assegurada. D. Maria Dora, com todo o respeito, mas somos praticamente do mesmo tope etário e podemos dispensar certas frescuras. A senhora já pensou, como eu já pensei e já fiz, em mandar esse pessoal todo à merda? Não resolve, até porque a maior parte já está lá, mas consola um pouco.

A futura privada do Joel


Joel acaba de sair do Japão, onde conheceu esta privada mágica. Por favor, vejam os ícones das funções privadais e tirem suas próprias conclusões. O ícone que mais me intrigou foi o das duas pessoas sentadas na privada ao mesmo tempo. Não consigo imaginar o que seja isto! (UAHAHHAHUUAHUHAUA)

segunda-feira, outubro 16, 2006

Quando os avós são uns monstros.

PeuGuto, meu sobrinho, O Cara, recebeu a visita da vó e do vô neste dia das crianças. Quando o neto é único, O Cara manda e os velhos obedecem. E O Cara disse:

- Quero ir no Pé Grande, querendo dizer Playland (um desses parquinhos de fibra de vidro no subsolo do shopping mais perto de você.)

Vovô e vovó com o netinho no AUTORAMA

Dia das crianças. Mil e trezentas crianças por metro quadrado, e todas querendo andar no autorama. Vovó e vovô armam um singelo esquema tático de guerrilha urbana pra favorecer o netinho: quando PeuGuto estiver a dez crianças do início da fila, vovó vai pro final da dita cuja; e quando o netinho sair de sua autoramada campeã (que a platéia aplaude de pé e se admira de ver como aquele pingo de gente pilota, gente!), vovô passa com ele por cima da gentalhada toda e o deposita no início da fila, onde vovó já está a dez crianças da próxima rodada.

Uma mãe, desavisadamente, repara:

- Ué, esse menino vai brincar de novo? Ele não sai daqui não?

Vovó e vovô se entreolham, ficam com os pêlos eriçados, rosnam, babam e gritam impropérios pra mãe distraída. Distraída porque, se ela estivesse prestando atenção, saberia que quem paga o brinquedo e entra na fila tem direito de andar no diabo do autorama quantas vezes o neto quiser. E só não disseram mais porque o menino não tem idade suficiente pra ouvir o tipo de palavrão cabeludo que essa raça de mocréia despreparada merece ouvir.

Quando vovó e vovô chegam tarde demais pra evitar o pior

PeuGuto resolve entrar num daqueles brinquedos angustiantes, cheios de túneis e pontes que tiram o contato visual dos avós com o neto por algumas frações de segundo. Entre um túnel e outro, vovô percebe a iminência do perigo: dois irmãozinhos cercam PeuGuto de forma ameaçadora. Parece que desta vez O Cara levará a pior, mas vovô nada pode fazer atrás das grades que cercam o brinquedo angustiante, senão aguardar. Ouve-se um choro de criança. De uma criança qualquer, então foda-se. PeuGuto sai do túnel carregado pela multidão, maravilhada com sua vitória sobre o garoto grandão. Até agora não se sabe o que foi que aconteceu nem com que dedo PeuGuto furou o olho do outro menino, mas podem ter certeza: o avô d'O Cara teria feito pior. Melhor que tenha sido assim: criança contra criança. Bater na criança dos outros é muito estressante, mas se for pra defender os nossos, a gente bate.


Jamais duvidem que famiglia é máfia.

domingo, outubro 15, 2006

Meu namorado é chef!


Meu namorado é chef!
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Arroz de bacalhau. Pena que não dá pra blogar aroma e sabor! Dou meu testemunho de fé de que está sinistro.

sexta-feira, outubro 13, 2006

Braços abertos sobre a Guanabara


Eu vi na fofa da Ana Maria Braga esta semana uma matéria sobre a exposição que a bisneta do criador do Criador -- aquele dos braços abertos sobre a Guanabara -- está fazendo no Rio por esses dias. Em uma das instalações, o visitante pode ficar parado sobre um ponto, cercado de fotolitos de paisagens por todos os lados, e ter a mesma sensação que o Redentor teria se fosse uma pessoa gigante, ali, de braços abertos, sobre a montanha.

Toda a minha vida eu tive vontade de fazer isso: ser o Redentor por um minuto. Nem tanto pelos superpoderes, mas mais pela paisagem. Se for pra brincar de Deus, só quero saber da parte fácil e café com leite do faz-de-conta.


Aliás, na mesma Ana Maria Braga, vi uma reportagem sobre um senhorzinho fofo (como são fofas as pessoas dos programas matinais!) que compra passarinhos caçados em reservas e os devolve à Natureza. E ainda diz pro pilantra do traficante: pode ficar com a gaiola e com o troco, meu filho. E o pilantra -- isso o programa não mostrou, foi só minha imaginação torpe que elocubrou -- pensa: "Otário! Vou pegar mais dez passarinhos desses e enfiar na mesma gaiola pra esse mané comprar. Ele solta, eu vou lá e pego tudo de novo."

O papo do passarinho não foi off-topic, não: foi só pra ilustrar a dificuldade que Deus deve ter na hora de decidir quem vai pro céu ou pro inferno.

quarta-feira, outubro 11, 2006

Isto é Impulse!


Quem me vê assim, viva e saudável, não pode imaginar que eu já sofri muito com uma doença chamada classe mediíte (Carmem et al), que me corroía os bolsos e a paz tempos atrás. Essa moléstia, que pode ficar subclínica (sem sintomas exuberantes) por anos até voltar a apresentar sinais agudos preocupantes, como a compra de um vestidinho estampado que-eu-jamais-usarei-uma-segunda-vez de 800 reais em seis vezes, deixa algumas cicatrizes. E, um dia, a gente não aguenta mais olhar pras essas cicatrizes e tem de vender toda aquela mercadoria semi-nova excedente comprada por impulso num acesso de mania.

Isto posto, venho por meio deste post-classificado anunciar a venda de uma magnífica cadeira ergonômica Colunável, que protege a coluna do contribuinte e não achata sua nobre região glútea, mesmo quando o honrado cidadão passa o dia na frente do computador. Eu usei uma única vez e não me adaptei porque tenho a coluna irreversivelmente desviada pra dentro (lordose), pra fora (cifose) e pro lado (escoliose), e minha maltratada coluna não suportou ser retificada. Mas você, que é normal, não terá esse problema. O Tom e a Cora usam (pronto, falei!).


Cadeira colunável
Cor: azul royal
Preço de compra em 18/10/05: R$340 (mais frete)
Preço de venda em 11/10/05: R$200 (e eu levo em sua casa, totalmente de graça, se você morar no Rio de Janeiro a menos de 10 km da minha)

(Entra a vinheta: E se de repente alguém lhe oferecer um produto sem uso pela metade do preço, isto é Impulse!)


Aproveitando este post de utilidade pública, vou ratificar aqui a oferta de produtos fotográficos não comprados por impulso do meu fotógrafo favorito, Lucas Landau. Lembrem-se que esses produtos, além de estarem em perfeitas condições, têm valor histórico: são as primeiras máquinas e trecos de máquina de um fotógrafo que tende a ser o melhor do mundo. Quem for caprichosinho e guardar tudo com carinho, poderá até vender essas peças à Fundação Lucas Landau, daqui a uns 95 anos, por vários milhões de brasilais (um nome provável pra moeda brasileira do primeiro trimestre do século XXII).


Detalhes no Vírgula e Ponto Final e através do e-mail lucaslandau@gmail.com.

terça-feira, outubro 10, 2006

Eu obro, tu obras, ele obra.

Há coisas que precisam ser faladas. Talvez não faladas, mas escritas, porque eu acho que eu não teria o carão de sair por aí falando tudo o que escrevo. E hoje eu vou escrever muita merda sobre... well... merda! Ei-la em fascículos peristálticos:

1) A primeira vez em que ouvi o verbo obrar, eu estava fazendo estágio na clínica homeopática no hospital veterinário de pequenos animais da UFRRJ, vulgo Rural, do km 49. O professor perguntou pro senhorzinho humilde, dono da cadela depauperada que atendíamos fascinados: "Ela está obrando direitinho?". Hum-hum, afirmou o homem. E a consulta seguiu sem que eu conseguisse acompanhar todo o resto, porque encasquetei com aquele negócio da obra, como assim?!? O que será que quer dizer cachorro obrar?, fiquei pensando. Mas como todos os outros estagiários faziam cara de prêmio Nobel da genialidade, tive vergonha de perguntar. Esperei acabar o expediente, todo mundo ir embora, os passarinhos se calarem e o sol se pôr pra perguntar pro professor o que vinha a ser obrar. E ele disse, singelo: "Cagar, oras!" Ah, bom. Fiquei super feliz por aprender meu primeiro e genuíno verbo proletário, enfim. E eu que achava que cagar fosse a versão mais popular disponível para "fazer cocô".

2) Crianças e cocô:
2.a) Minha irmãzinha caçula veio com defeito de fabricação, coitadinha, e fazia seu cocozinho infantil só uma vez por semana. Quando "O" fazia, chamava-nos (eu e meu irmão) pra testemunharmos o colosso de sua obra depositada nas profundezas de um vaso sanitário. Era um espanto maior a cada semana. Teve um dia em que eu tive ganas de fotografar o monstro e mandar uma cópia pro Guiness: minha pequena e talentosa irmã tinha produzido uma maquete perfeita de toda a complexidade do intestino grosso humano, com sua alças e curvaturas perfeitamente caracterizadas. Se não me falha a memória, tinha até o detalhe do saco de fundo cego do apêndice intestinal e uma alusão artística à válvula íleo-ceco-cólica. Se merda valesse alguma coisa... estaríamos milionários! Mas Deus não quis.

2.b) Em Brasília, as mães e os pais criavam seus filhos meio soltos ao vento, pois ali não havia avó, avô, tio nem tia: todos eram de outro lugar, ninguém tinha parentes em Brasília, então as crianças viviam como os meninos perdidos do Peter Pan. Pois um desses meninos perdidos, perdido que estava numa tarde sem lei em minha casa, foi fazer não sei o quê no banheiro da minha empregada. Sai ela, que era preta, lívida de susto da cozinha, berrando impropérios. Tinha uma lombriga enorme se debatendo em sua privada. Todos fomos ver a lombriga. Em poucos minutos, havia uma romaria de crianças pra ver a lombriga em nossa privada. À noite, uma multidão de pais visitou o banheiro da Maria pra ver a lombriga na privada e decidir da bundinha de quem "aquilo" havia escapado. Um horror. Teve uma hora em que a Maria deu cabo àquilo tudo apertando a descarga. E desinfetando o vaso com álcool e creolina, que nunca se sabe se lombriga pega em vaso.

2.c) Um amigo meu confessou que tinha, quando criança, o desejo enorme de ver seu próprio cocô. Entrou no banheiro dos pais, que era maior, ficou de cócoras e pluft: pôs seu ovinho no meio do banheiro. Ficou horas admirando aquela belezura: cor, cheiro, forma, textura. Depois, quando começou a sentir cãimbra, catou tudo com papel, jogou no vaso e deu descarga. Perguntei se ele passou um pinhosolzinho, pelo menos no lugar onde o cocô ficou depositado, ao que ele disse que não. Óbvio: ele era criança, e criança nem sabe pra que serve um diabo dum pinho sol.

3) Mulheres e cocô:

Ainda não consegui entender que estranho fascínio é esse que as mulheres têm por cocô. Cá estou eu, prova viva disso, escrevendo tudo até a última ponta sobre cocô. Mas se vocês ligarem a TV à qualquer hora, logo verão campanhas publicitárias sensacionais exibindo mulheres magras e bonitas que ficaram muito mais felizes depois que o iogurte Z, o remédio X ou o dispositivo tabajara Y as fizeram evacuar regularmente. Talvez vocês não estejam associando o nome à pessoa, mas, na TV, "fazer cocô" corresponde ao eufemismo "ir ao banheiro". E o pior é que essas propagandas adoram ser veiculadas na hora do meu café da manhã. Pior: do café da manhã do meu pai. E, por isso, a gente nunca esquece de ter uma alimentação rica em fibras, porque está testado, provado e aprovado pelo FDA que, entre dois seres humanos absolutamente iguais, aquele que obra todos os dias é um ser humano melhor.


Mulheres finas adoram dizer que não cagam, ops!, quero dizer, "vão ao banheiro" fora de casa de jeito maneira.

Va bene, sou uma pessoa crédula, mas se é assim... queria só saber pra onde vai tanta comida!


4) Merda e Deus:
Pode parecer antipático pros carolas, mas o Kundera diz uma coisa muito pertinente: se Deus criou o homem à sua imagem e semelhança, seria correto afirmar que Deus caga? Não quero tripudiar, mas se Deus caga, o Lula está explicado!

segunda-feira, outubro 09, 2006

My bad!

Foi mal pelo sumiço, galera, mas eu estou na reta final de um trabalho e-menso, a quatro dias de voltar a ser dona das minhas horas noturnas e dos meus finais de semana (eba!).

***

MM, ACDC, Tati et al: muitíssimo obrigada pelas dicas de MP3-player. Embora esteja convencida de que o i-Pod é o melhor e mais fofo de todos e que o i-Tunes é a maior invenção do mundo depois do Stilnox, ainda não sei se terei um brinquedinho desses, porque quem não i-pode, se sacode. Ademais, comprar algo incompatível com meu contracheque representaria um tremendo retrocesso em meu processo avançado de cura da classe medíite. Eu até tinha um MP3player legalzinho (Mirage), que eu comprei do Lucas, mas minha caixinha de música foi devidamente surrupiada por algum mão-leve fiudumaégua, em algum momento entre 10 e 20h do dia 03 de outubro de 2006. Tive muito ódio do bandido, que deve estar em êxtase até agora com meus 512 MB de músicas selecionadas a dedo, mas raiva não faz bem a uma pessoa que quer emagrecer, como eu. A raiva intoxica, retém líquido e aumenta sensivelmente o visual capitonê da pele do bumbum, quadril e coxas. Em outras palavras, o desapego emagrece. Deus dá, Deus toma. What goes around, comes around. Da justiça Divina ninguém escapa. E todas essas merdas que a gente diz numa hora dessas enquanto deseja secretamente que as mãozinhas do larápio desenvolvam um tipo raro de doença degenerativa (e que os tendões atrofiem, os ossos se quebrem e os músculos sequem).


Não, eu não estou com raiva (são só coisinhas singelas que se passaram rapidex por minha cabeça).


****

Cortei o cabelo e pintei de roxo. Pintei, não: fiz um tal dum balaiage. Ainda estou gritando de susto toda vez que me olho no espelho desprevenida. Tenho usado óculos escuros pra ir ao banheiro até pra fazer xixi, pois só assim eu evito meu reflexo (ou ao menos o reflexo em technicolor). Toda essa experiência me fez descobrir duas coisas fundamentais a respeito de cabeleireiro:

1) Clientes e cabeleireiros nunca conseguem se comunicar efetivamente, nem por intermédio de fotografias: o cliente explica, faz mímica, mostra foto e o cabeleireiro não entende; o cabeleireiro explica, faz mímica, mostra foto e o cliente não entende;

2) Quando gostamos de um cabeleireiro, é porque ele tem o mesmo gosto que a gente; ou seja: ele tem bom gosto. Pelo menos em nossa humilde opinião. Logo, o que quer que ele faça, mesmo que seja totalmente diferente do que foi pedido -- e será (vide n.01) --, cairá em nosso agrado.


PS: Bonés jamais sairão de moda enquanto o item 01 for verdade.

LAURA PRUDENTE DA COSTA

Cena célebre de minha vilã preferida

Nunca houve uma vilã como Laura Prudente da Costa. OK, eu sei que alguns dirão que Maria de Fátima era o demônio e Odete Roitman era o cão chupanomanga azeda, mas Laura foi a antagonista mais incrivelmente pérfida e perfeita que já existiu na teledramaturgia! Ela armava, misturava trabalho com sexo, mentia, se fazia de santa, roubava, trocava, matava e ainda desprezava as personagens do núcleo além-túnel (Andaraí). Quer coisa mais cruel?

Laura vive na pele da minha ex-chefe, minha gente! Gilberto Braga precisa conhecer a jararaca antes de escrever sua próxima novela. Que novela das oito sem uma vilã como essas não dá!

sábado, outubro 07, 2006

Chove no Rio


Chove no Rio
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Fala Dexter: "Não gosto de chuva nem gosto de roupa, mas esta capa impermeável aqui é o bicho!"

quinta-feira, outubro 05, 2006

Pavor: teu nome é mulher!

O assunto do jantar hoje foi barata e heróis circunstanciais (porteiros, entregadores de pizza, pais, namorados e irmãos). Lembramos de algumas outras cenas de pavor doméstico:


Minha mãe passava roupa na área para irmos a uma festa. Subitamente, o ferro que ela usava explodiu, fazendo minha mamma pular pra trás, chocada. Bem, não sei se a expressão seria essa [chocada], porque, no duro, ela tomou um puta choque. E o ferro pegou fogo em seguida. Eu e minha irmã, que estávamos na cozinha, gritamos por meu pai. Ele entrou na cozinha apressado, foi até o ferro de passar roupa, examinou a situação enquanto nós observávamos tudo a 3 metros de distância. Não mais que de repente, meu pai sai correndo da área gritando: "Saiam da frente, saiam da frente!" Em menos de um terço de segundo, nós três mulheres, em trajes sumários, vencemos a distância entre o décimo segundo e o nono andar. Minutos depois, meu pai veio nos encontrar na escada de incêndio: "O que deu em vocês?" Explicamos que quando o vimos correndo e gritando -- ele, que resolve todas as merdas --, só nos restou correr, gritar e torcer pra que ele não morresse carbonizado. E tudo o que ele queria era que nós saíssemos da frente da caixa do disjuntor.


****

Minha mãe tinha uma confecção e meu pai dava uma força pra ela, cortando pilhas de tecido com uma faca elétrica potentíssima, que um belo dia decepou-lhe a ponta do dedo. Chegam os dois em casa: minha mãe, azul-pânico-royal, e meu pai, pálido-hemorragia, com uma toalha de banho encharcada de sangue enrolada na ponta do dedo. "O que houve?", perguntei. "Procure já o telefone de um cirurgião de mão no guia do convênio: seu pai vai precisar reimplantar a ponta do dedo." OK, eu disse. Abri o catálogo e pumba: desmaiei.

****

Brasília, 1978. Minha irmã tinha 3 anos quando engasgou com uma bala Soft. Em pouco tempo, viu-se que ela não respirava. Mamãe gritava e papai urrava, enquanto sacudia a Sam, já azul, pelos pezinhos. Alguém gritou pra que outrém chamasse os vizinhos. Minha mãe dava murros na parede e no meu pai, que não conseguia desengasgar minha irmã. Entediada com tudo aquilo, eu fui pegar um copo d'água na cozinha pra mim e, quando voltei, achei que minha irmãzinha, roxa, com aquela cara estranha e de cabeça pra baixo, podia era estar com sede. Estendi-lhe o copo, numa cortesia atípica entre crianças que acabaram de perder o caçulado, ela estendeu a mãozinha pra pegar -- as veias lhe saltanda à testa, os olhos lhe saltando das órbitas --, deu um gole... e a bala desceu.

quarta-feira, outubro 04, 2006

Um conto baratal (para o leitor anônimo)


Porque hoje é dia de São Francisco de Assis; porque muita gente associa a data aos veterinários, que cuidam dos bichos; porque eu sou veterinária; porque meu leitor anônimo favorito insinuou que barata é bicho, eis aqui um esclarecimento: baratas não são seres dignos de nossa simpatia e não se enquadram na categoria "bichos". Na minha taxonomia, haveria reino vegetal, animal e bestial. Baratas seriam, então, classificadas como monstros primitivos cuja função primária na Terra é espalhar o asco e o pavor e tornar homens matadores de baratas em heróis domésticos.

Tudo isto posto, relato um episódio recente de pânico doméstico envolvendo duas escovas de dente, uma barata e eu.

Tudo começou no último sábado à noite, quando estava sozinha em casa. Estava me preparando para dormir, acendi a luz do banheiro e, para meu choque-horror-pânico, localizei um inseto baratiforme, tão grande quanto um camundongo pequeno, a exatos 6 azulejos de distância da minha testa, na lateral do espelho. Eu tive tempo de contar os azulejos porque fiquei paralisada de pavor, com medo de me mexer e de provocar o deslocamento do monstro, cujas asas e patas peludas pareciam ansiar por tocar minha pele limpa e sana. Prendendo a respiração, dei uma ré e fechei lentamente a porta do banheiro para oferecer ao monstro a privacidade necessária à fuga por algum ralo. Entrei em meu quarto, coloquei uma toalha bloqueando a fresta sob a porta trancada e deitei na cama, inconformada por ter sido obrigada a dormir sem escovar os dentes por aquele réptil insetiforme nefasto. Tomei meu tarja preto para medo e dormi humilhada, pensando em interfonar pro porteiro, mas achando que não havia razão para tanto, pois a barata seria razoável o bastante para ir embora sozinha. Eventualmente.

No dia seguinte pela manhã, nada da barata. Pensei: isso é coisa de praga noturna!, esse verme gosmento deve estar escondido por aí nalgum canto. E passei o dia na expectativa ruim de que a noite chegasse e, com ela, a barata. Durante todo o dia, tive medo de entrar no banheiro e senti uma raiva incontrolável de estar sendo oprimida, em minha própria casa, por um inseto cascudo nojento do tamanho de um filhote de gato.

Na noite de domindo, quando fui escovar os dentes, quem eu encontro? A coleguinha do Kafka, ainda mais audaz que na noite anterior: dessa vez, estava sobre o espelho, a 10 cm da pia. Congelei, prendi a respiração, saí de ré e já ia repetir meu ritual de fuga, quando senti uma revolta profunda contra aquela cucaracha cascorenta, tão grande quanto um Chiuaua, me impondo toque de recolher e me privando do direito de escovar os dentes antes de dormir. Aí, não teve jeito: enchi os pulmões de ar, peguei meu chinelo, mirei na besta, atirei e saí correndo. Corri tanto, que teria quebrado o record mundial de velocidade em apartamentos pequenos, se a modalidade existisse. Meu coração pulava na boca e eu só pensava uma coisa: quem vai remover o cadáver do monstro? Porque eu não sou dessas pessoas que freqüentam o mesmo banheiro que uma barata, estando ela morta ou viva.

Levei três minutos pra me acalmar e voltar ao banheiro a fim de localizar o corpo, que tinha, para o meu horror, desaparecido. Podia sentir o suspense hitchcockiano invadir o ambiente e a iminência do inseto pular em meu cabelo, num gesto de vingança. Revistei o banheiro a partir do corredor e acabei concluindo que a barata só podia ter caído dentro do meu porta-escova-de-dente. E lá estava o monstro!, tocando com suas patas, tão peludas quanto um Shi Tzu, e sua casca, tão gosmenta quanto teto de cozinha de boteco, minhas duas escovas de dente. Alguma coisa nela, não sei se pata ou antena, ainda se mexia então, por precaução, levei o porta-escovas com todo o cuidado para dentro da pia e abri a torneira para matar o inseto por afogamento. Dormi sem escovar os dentes, torcendo pra barata não saber nadar.

No dia seguinte, meu valente pai se livrou do cadáver afogado do monstrengo, que parecia ter encolhido consideravelmente com o óbito. Comprei uma escova de dentes nova e desinfetei com cloro o porta-escovas.

Se na China tem gente que come barata, só tenho uma coisa a dizer: cada um tem a culinária que merece. Eu afogo baratas.

Celulite


Que isto sirva de consolo a todas as mulheres que nunca foram magras: eu tenho celulite desde os 14 anos, quando eu tinha essa mesma altura (1,60cm) e pesava 41kg. Ou seja, descobri que tinha celulite quando era tão magra, que não tinha nem um vestígio de bife no braço que servisse pra aplicar uma droga duma vacina antitetânica! Tudo bem que minha celulite infantil não era assim, nenhuma casca de laranja! Era algo tão unusual, que um dia, farta de elocubrar sobre, perguntei pra minha mãe o que poderia ser aquele furinho na banda direita de minha bunda, ao que ela me respondeu, muito naturalmente (para o meu choque): "Celulite, ué. O que mais seria?"


Desse dia em diante, eu posso dizer que me tornei uma mulher. Não foi depois da primeira menstruação, nem da primeira transa, nem do primeiro contracheque. Precisei ter celulite pra me sentir uma mulher de fato, pra ter vontade de folhear revista feminina, pra fazer minha primeira limpeza de pele e comprar meu primeiro creme anti-rugas, tomar 2 litros de água por dia e escolher biquinis e roupas que não evidenciassem nem piorassem muito aquilo que me acompanharia pro resto da vida: a féladaputa da celulite.

Hoje em dia, não tenho -- juro! -- a menor neura de celulite. Não somos amigas, entendam bem. Eu sei que ela existe, mas tento pensar em coisas mais trágicas, como o Lulla-lá-de-novo ou o acidente aéreo e os pilotos americanos cretinos que o causaram. Por outro lado, também não somos (mais) inimigas: parei de usar contra a celulite todas essas massagens, bandagens, injeções, fricções e pomadas que fazem parte da luta diária de quase toda mulher que usa biquini e não casou ainda. Porque a luta contra a celulite, convenhamos, cai a zero depois do casamento.


Pra não dizer que me tornei um homem no que concerne o tema celulite, confesso que de vez em quando ainda compro e (semi)uso uns creminhos. Me divirto com as propagandas e as modelos esqueléticas que esses publicitários LOUCOS escolhem para os banners de farmácia chique. Outro dia, na Farmalife (a farmácia da leitora de Marie Claire), vi um creme da Nivea com o singelo nome de "Bye-bye, celulite". Tive um espasmo tão forte que precisei me sentar no chão, no meio das gôndolas, pra não me mijar de rir. Quando a vendedora veio me oferecer ajuda, eu perguntei:

- Meu bem (é assim que eu falo quando estou muito puta), eu quero saber quem eu processo se minha celulite não for embora com este creme.

Por um momento, achei que ela fosse arrancar da cara aquela maquiagem cafona, de sombra verde, e sentar no chão comigo. Mas a moça foi profissional, e disse:

- Entendo, senhora... (é assim que elas falam quando estão muito putas) Eu tenho aqui um outro creme que é muito mais eficiente no combate à celulite. E custa apenas 120 reais a mais em nossa promoção do mês.

terça-feira, outubro 03, 2006

Tiros na Lua

Morei em Brasília dos 3 aos 9 anos. Na época, ainda não havia ninguém de Brasília em Brasília, de forma que todos os costumes eram importados das outras capitais. O jornal, por exemplo: tinha um caderno de cultura, mas Brasília mal tinha dois cinemas e um teatro que dessem conta de meia página, que dirá de um caderno! O editor devia cortar um dobrado pra encher linguiça com cultura naquele jornal. Pode ser fantasia minha, mas tinha muita foto gigantesca, de página inteira, com duas palavras de legenda. Isso acontecia muito também com a página de crimes. No Rio, mesmo na década de 70, crime era coisa que não faltava, mas imaginem vocês como devia ser tediosa a vida de um jornalista de porta de delegacia na recém nascida capitár federár. Pra encher linguiça, mais fotos enormes. E qualquer bate-boca entre vizinhos ganhava destaque de capa.

Uma bela manhã, nossa empregada chegou em casa chorando. Tinha ido à padaria da esquina comprar pão e tomou um tiro de chumbinho na coxa. Não sei se vocês pegaram essa fase desgraçada de espingarda de chumbinho, uma arma perigosíssima que virou a coqueluche das crianças naqueles anos estranhos. Meu irmão mesmo, um meninote que mal tinha tirado as rodinhas laterais da bicicleta, tinha uma dessas espingardas. Pois eu me lembro da minha mãe e do meu pai agasalhando a Maria e levando-a, aos prantos e com aquele filete grosso de sangue, tão bonito sobre a pele negra macia, ao hospital e, depois, à delegacia.


No dia seguinte, na página do crime, só dava a Maria no Jornal de Brasília, sob a desastrada manchete "CHUMBO NA DOMÉSTICA". Viramos celebridade, e a diversão das crianças na quadra passou a ser acompanhar as investigações policiais pra descobrir que meliante de 10 pra 12 anos tinha atirado em minha empregada.

Bem, eu venho pensando muito nesse episódio do chumbo na doméstica desde a semana retrasada, quando a Lua, cachorrinha do nosso caseiro, apareceu mancando do anterior esquerdo. O murundum de edema nessa pata era tão grande que, de longe, parecia que ela tinha feito uma luxação muito maluca de ombro; porém, qual não foi nossa surpresa ao ver, no raio X, um projétil de 22 no meio do úmero, que estava completamente esmigalhado onde a bala o acertou. Minha primeira reação foi chorar. A segunda foi fingir que eu era veterinária também e olhar novamente pro filme, a fim de decidir com meu colega se aquele desarranjo ósseo tinha solução, ou se era caso pra amputação.


Abro um parêntese aqui pra dizer que chorei, não só pela Lua, um cachorrinho tão gente boa que não rosna nem pra formiga, mas pelas Marias, Gabrielas e por toda essa gente que toma um tiro indo encontrar com a mãe, ou comendo um matinho mais tenro, ou comprando pão. Não me parece justo tomar um tiro em hipótese alguma, sobretudo quando menos se espera. Um estampido, um soco, e o relógio da vida de todo mundo continua a ticar, mas o da vítima pára de susto, congela de pavor e, por vezes silencia, na mais completa ignorância do motivo.


Eleonora, uma amiga italiana que conheci na Inglaterra, certo dia apareceu com a cara mais triste do mundo na escola, e eu lhe perguntei, preocupada: "What's happened, dear?" E ela falou, com aquele inglês-sotaque macarrônico, a coisa que eu mais sinto neste momento: "My day is not very beautiful today."

A milhas dali, seu cachorrinho tinha acabado de ser sacrificado com um tiro depois de um atropelamento muito feio.

segunda-feira, outubro 02, 2006

Coffee break

155 mortos. E Collor senador! Maluf, o mais votado. (será que a água consumida no Brasil é neurotóxica?, what's wrong with these people?!?) Morte horrível a todas as baratas! Haja o que houver, eu vou viajar no dia 12. Merlin é marca que preste pra MP3 player? O que vem a ser MP4? Ai, que essa tradução não anda! Minha irmã nunca atende o telefone... (Que tragédia, 155!) Acho que emagreci. Quero pintar o cabelo no sábado. Preciso combater minha fobia de peixe. (Azul ou violeta, cansei de magenta.) Tomara que não chova na quarta. Tenho que ver meu extrato amanhã. Não como chocolate há uns dez dias. Definitivamente, leite não me faz bem. Tem meses que eu não faço uma limpezinha de pele..., mas será que pobre pode? Não comprei presente de dia das crianças pro meu afilhado ainda. Tô esquecendo de alguma outra coisa... ah, de trabalhar!

Palestras no CCBB

Deu no blog do Prosa e Verso (O Globo), de 29/10/06:


Interpretações do Brasil

Semana que vem começa no CCBB o ciclo de conferências "Interpretações do Brasil". Acadêmicos vão discutir as diferentes visões do Brasil elaboradas por clássicos do nosso pensamento social como Celso Furtado, Gilberto Freyre e Oliveira Vianna. Como o período eleitoral é um momento em que todo mundo tenta entender o país ("o que querem dizer as intenções voto?", "que mensagem os eleitores mandarão para os políticos?", "que Brasil emerge das urnas?"), pedimos aos participantes do evento que respondessem: que aspecto do Brasil de hoje pode ser pensando à luz da obra desses autores? O que, nessas visões do Brasil, continua atual? As respostas estão no Prosa & Verso de amanhã.

Programação:

As palestras são realizadas sempre às 18h, com entrada franca. Abrindo o ciclo, Ricardo Benzaquen Araújo apresenta o trabalho do autor de Casa Grande e Senzala, Gilberto Freyre, no dia 06/10. Depois, é a vez de Helena Bomeny relacionar, dia 11/10, a valorização da educação por Darcy Ribeiro e a situação atual das escolas no Brasil. Dia 18/05, Elide Rugai Bastos traz um panorama dos conceitos elaborados por Sergio Buarque de Holanda. A cientificidade da raça proposta por Oliveira Vianna está na pauta de André Botelho, em 19/10, enquanto no dia 20/10, Ronaldo Conde Aguiar fala sobre a ‘redescoberta’ tardia da obra de Manoel Bomfim. No dia 25/10 é a vez de Mirian Limoeiro debater sobre o grande filósofo brasileiro Florestan Fernades. No dia seguinte, Aluízio Alves Filho mostra o lado adulto da obra de Monteiro Lobato. Fechando o evento, o ex-presidente do BNDES e ex-reitor da UFRJ Carlos Lessa defende as propostas desenvolvimentistas de um de seus mestres, o economista Celso Furtado, no dia 27/10.

CENTRO CULTURAL BANCO DO BRASIL - Rua Primeiro de Março, 66
Mais informações: 3808-2020



Quem chegar por último é mulher do padre!

domingo, outubro 01, 2006

VanOr responde


Querida VanOr,


Fiquei muito feliz por saber que você está enfrentando seus medos -- afinal, medo de cu é, mais do que definitivamente, rola --, mas eis que um curto e grosso surto de auto-análise me fez perceber que quem não vem enfrentando medo algum sou eu mesma. Pois veja você que me chamaram pra ir ao Fla X Flu desta semana no Maraca e eu declinei, alegando justamente... medo!

VanOr, há coisas a meu respeito que você jamais poderia imaginar: eu sou pouca coisa mais alta que o botão do sexto andar do elevador, mas pedalei muito a minha Caloi aro 26 pelas ruas cheias de carro desta cidade; mandei muito motorista apressadinho tomar no rabo; fumei meu primeiro cigarro e disse meu primeiro palavrão cabeludo na pré-escola, quando os amigos da minha mãe ainda insistiam em me dar adesivos e canetas perfumadas da Hello Kitty, que eu sempre trocava por maconha e livros de filósofos que te dariam medo só de pronunciar. Só estou dizendo isso porque era essa a referência que eu tinha de mim mesma antes de recusar o Fla X Flu por medo das torcidas mafiosas (a gente lê no jornal tanta coisa, menina!...). Foi isso e ler seu texto, que eu olhei em volta e vi no que me transformei: a feliz proprietária de um Shi Tzu, um cachorro-pompom cenográfico que drenou muito da minha tradicional valentia. Se bobear, meu próximo passo será fazer balé, entrar num curso de bordado, pintar unha à francesinha e comprar um pacote com dez sessões de drenagem linfática.


Começo a me desesperar. Não sou nem metade do cabra-arretado que fui um dia. E agora, José? Descaso e compro uma bicicleta?

beijos,

Biga Taddei-Taddado


VanOr responde:


Cara Taddei-Taddado (quem deu foi relaxado),

O Shi Tzu, por si só, não é sintoma de nada. Seria se você ficasse trocando provações da vida real por sessões de Barbie Hair com o pobre peludo. Como este ainda não é o caso, nem tudo está perdido. Proponho o seguinte programa terapêutico para que você possa ter o mínimo de dignidade ao passear com seu pimpão na rua:


1) Não use lacinhos em seu Shi Tzu. Lacinhos drenam a virilidade do dono. O cachorro, mesmo, não tá nem aí. Caso você insista nos lacinhos, e eu não te culpo por isso (afinal, eu também não tive uma Barbie Hair), examine a genitália externa do animal (fica sob o pêlo, acredite) e verifique se ele é macho ou fêmea: use rosa, se for menina, ou azul, se for menino;
2) Diga pra todo mundo que ele é um animal feroz, dissimulado e que já matou três. Ensine-o a rosnar e latir (com voz grossa) quando você disser isso. Se necessário, ajude-o a fazer a voz grossa. Use técnicas avançadas de impostação vocal;

3) Leve seu Shi Tzu ao Maraca e diga pra todo mundo que você não teria coragem de ir sem ele, seu guarda-costas assassino. Use uma focinheira cenográfica, estilo Hannibal, the Canibal, pra impressionar. Procure não usar nele nenhuma coleira de strass nessas ocasiões, porque os marginais, na pressa, podem roubar o cachorro pelas pedras falsas;
4) Ensine seu cão a ficar louco e correr atrás do próprio rabo sempre que um jogador de seu time perder penálti. Entre dois cachorros absolutamente iguais, aquele que entende de futebol é um ser humano melhor.


Você vai ficar bem, tenho certeza. Quanto à perda da valentia, bem... algumas coisas se perdem com a idade e o casamento. Mas, cá entre nós: você já andou bastante de bicicleta. Pode brincar de casinha, agora.

bjs,

VanOr

Palavras pequenas

Meu pequeno exercício de felicidade (associar amigos a uma palavra que sintetizasse meu amor por eles) durou mais do que eu esperava. Brincar de associação é uma delícia, e eu adorava fazer isso com meus alunos de inglês.

A idéia de brincar com associação de coisa-palavra em sala de aula, contudo, não foi minha. Eu tive um professor de educação artística na escola que fez uma brincadeira dessas com a turma na primeira aula da primeira série do (antigo) segundo grau. Meu colégio era uma espécie de máfia, de forma que era raro ter aluno novo. Porém, naquele ano, havia alguns novatos na sala, entre os quais um cara barbado. Foi um choque pra mim, com cabeça ainda de oitava série e corpitcho de quarta, ver uma homem barbado na minha turma. Perguntei a idade dele, e ele levou séculos me desprezando antes de responder: "Dezoito". O dezoitão arrumou logo uma carteira pra quicar na parede ao fundo da sala e lá ficou, mascando seu chiclete anti-náusea, isolado de nós, pirralhos. [Eu tenho vontade de reencontrar esse cara, mas nem o nome dele eu sei. Acho que ele não durou nem dois meses no Anglo Americano.]

A turma era pequena, tinha uns 15 alunos: doze que se conheciam desde os nove anos de idade, e os outros: uma moça da roça, um baiano e o dezoitão. O objetivo da brincadeira de associação era, obviamente, integrar os 12 (donos do pedaço) aos outros, antes que eles cancelassem a matrícula (que era, obviamente, algo que não nos incomodaria, enquanto donos do pedaço e crianças, que criança é bicho ruim com os da própria espécie). Então o professor sorteou nomes e pediu-nos que escolhêssemos uma palavra ou fizéssemos um desenho para definir nosso colega. A Wal me tirou e tentou desenhar um passarinho, mas eu entendi que aquilo era claramente um galináceo, e rolou um certo estresse na ocasião. O dezoitão tirou a roceira, que era toda casta e menina-moça, do tipo que só sai de casa pra escola ou missa, e escolheu pra ela a palavra "luxúria".

Sério: nunca uma palavra foi tão bem escolhida para um ser humano em toda a história da humanidade. O cara entendeu, instantaneamente, que aquela santa do pau oco era lasciva da cabeça aos pés. E eu pude confirmar isso anos mais tarde, quando ela escravizou um amigo meu através de um extraordinário sexo selvagem (não há outra explicação!), e depois comeu seu pobre coraçãozinho de galinha no xinxim.

Agora, veja você: um cara barbado te diz, aos 14 anos, que você é pura luxúria. E você acredita. Não vai ter sexo que dê conta do apetite dessa pessoa! Às vezes fico tentando imaginar que palavra o dezoitão teria escolhido pra mim. Eu estava muito impressionada com ele naquele dia e nos dias que se seguiram (talvez fosse um indício não detectado de tesão), e teria certamente ficado sugestionada com qualquer rótulo que ele me desse. Talvez ele dissesse: "fedelha", e isso geraria em mim o mais profundo desprezo por aquele troglodita. Talvez ele dissesse: "febre", "borboleta" ou qualquer coisa nonsense. E aí, eu certamente me apaixonaria por ele. Possivelmente, eu teria abandonado a escola por causa de uma gravidez não planejada, feito teatro e filosofia e estaria, até hoje, vendendo coco e sanduíche natural na praia, como a Narjara Turetta.

Jamais desprezem o poder de uma palavrinha. Palavras mudam o curso de vida das pessoas a todo instante.